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Para férias, com amor

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Vinho, férias, amor? Aparentemente, as ligações parecem óbvias, na medida em que este período é considerado como um produto de consumo, de descanso, de liberdade, onde os excessos são, regra geral, indulgenciados e esquecidos.

Este tempo de verão também é encarado por muitos como uns dias de descanso, passeio e atividade turística, pelo que o primeiro passo deve ser dado numa programação que promova o enriquecimento individual e familiar e o encontro com Deus.

Como, nas palavras de D. Manuel Clemente, o tempo só é livre quando realmente liberta, devemo-nos voltar para o universo interior de cada um de nós, que nos faz reflectir, de forma profunda, sobre o grande mistério da vida, sobre as nossas escolhas e os nossos comportamentos.

Ao reflectirmos sobre a vida devemos perceber o que nos afasta uns dos outros, casais e sacerdotes, o que nos afasta de Deus e que nos retira o vinho bom e o substitui pela água destinada às lavagens religiosas, de modo que, pegando na palavra bíblica, possamos “ver que tudo é bom e belo”. Neste sentido, a alegria é o grande segredo do Cristianismo.

Devemos compreender que a alegria da vida é um elemento típico do banquete messiânico, que só tem sentido quando a colocamos ao serviço do amor em casal e em comunidade e ao serviço de Deus. Por isso, as férias são um tempo de reencontro, um tempo de paragem, uma oportunidade para meditar sobre o passado e planear o futuro. É nestes momentos de reflexão que nos reerguemos, dando mais fulgor ao caminho que construímos, sabendo que o Senhor nos providenciará o vinho bom da vida.

O vinho é fonte de alegria e de vida

Foi a partir da reflexão sobre a alegria de viver as férias em casal e em família que a região sul do movimento Encontro Matrimonial se encontrou, no passado dia 8 de Julho, na Igreja de S. Lourenço, em Azeitão, para mais um encontro do encerramento do ano pastoral, tendo como fonte de meditação as bodas de Canaã, onde S. João (2; 1-11) deu ênfase ao papel de Maria e do vinho na celebração da união de dois corpos e que culminou, apropriadamente, com uma visita à Casa-Museu e antigas adegas da José Maria da Fonseca, com muita alegria!!!

A palavra-chave de uma vida de autêntica união com Deus é a alegria. A realização pessoal na alegria e na glorificação – não uma alegria pelas coisas secundárias, pois a alegria pelas coisas imediatas leva à tristeza pelas coisas eternas – é a verdadeira mensagem do Pai e, como todos sabemos, a alegria, na Bíblia, é representada pelo vinho!

É, por isso, natural que, no meio do júbilo da festa, em Caná, só Maria tenha notado a falta de vinho… Até nos mais pequenos pormenores de serviço chega a Sua alma quando vive apaixonadamente atenta ao próximo.

Enchei as vasilhas! –, e dá-se o milagre. Assim mesmo, com toda a simplicidade. Tudo normal: eles cumpriam o seu ofício, e a água estava ao seu alcance… E foi esta a primeira manifestação da divindade do Senhor! O que há de mais vulgar converte-se em extraordinário, em sobrenatural, quando temos a boa vontade de fazer o que Deus nos pede.

Jesus não só participou naquele matrimónio, mas «salvou a festa» com o milagre do vinho! Portanto, Ele realizou o primeiro dos seus sinais prodigiosos, com o qual revela a sua glória, no contexto de um casamento, e foi um gesto de grande simpatia por aquela família nascente, solicitado pelos cuidados maternos de Maria. Isto faz-nos recordar o livro do Génesis, quando Deus conclui a obra de criação e faz a sua obra-prima; a sua obra-prima é o homem e a mulher.

E aqui Jesus começa os seus milagres, precisamente com esta obra-prima, num casamento, numa festa de núpcias: um homem e uma mulher. Assim, ensina que a obra-prima da sociedade é a família: o homem e a mulher que se amam. Esta é a obra-prima!

O matrimónio é fonte de amor

O Papa Francisco, antes de começar a catequese sobre as bodas de Canaã, saudou um grupo de casais que celebravam 50 anos de casamento, anunciando, com alegria: “Isso sim é “o vinho bom” da família! O vosso testemunho é algo que os recém-casados e os jovens devem aprender. É um belo testemunho. Obrigado pelo vosso testemunho.”

O matrimónio é um sacramento que faz de dois corpos uma só carne: como diz com expressão forte a teologia, são os próprios corpos dos contraentes que constituem a sua matéria. O Senhor santifica e abençoa o amor do marido à mulher e o da mulher ao marido e ordenou não só a fusão das suas almas, mas também a dos seus corpos.
É preciso convidar Jesus para a nossa vida, como aquela família o convidou para o casamento. Mas não basta dizer-lhe: “Entra, Senhor. A partir de agora tu estás em minha casa”. No livro de Apocalipse, Jesus diz: Eis que estou à porta e bato: se alguém ouve a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei e ele comigo. (Apocalipse 3:20). Ele entra se lhe abrirmos a porta, mas há mais a fazer, e é Maria quem dá o conselho fundamental. Sua mãe disse aos serventes: Fazei tudo o que ele vos disser (João 2:5). É preciso aceitar aquilo que ele diz, que ele manda fazer, que ele promete.

Não será a vida de muitos homens e mulheres do nosso tempo um casamento onde falta o vinho? Ou seja, onde falta a alegria? Essa agonia em que vivemos que nos leva a desesperar e a perguntar o que deveríamos fazer para encontrar a paz espiritual, não é o drama de muitas vidas? Ou então não há tantas vidas que vivem de um modo insípido, de que a água das talhas é bom símbolo? Não há vidas humanas que estão a ser vividas como se fossem um casamento sem vinho?

Fazei o que Ele vos disser. «Amem-se», dizia o sábio a um casal que o abordou pedindo apoio para a ausência de amor entre ambos. «Amem-se, porque amar é uma decisão, não um sentimento; amar é dedicação e entrega. Amar é um verbo e o fruto dessa acção é o amor. O amor é um exercício de jardinagem: arranquem o que faz mal, preparem o terreno, semeiem, sejam pacientes, reguem e cuidem. Estejam atentos porque haverá pragas, secas ou excesso de chuvas, mas nem por isso abandonem o vosso jardim. Amem-se, ou seja, aceitem-se, valorizem-se, respeitem-se, troquem gestos de afecto e de ternura, admirem-se e compreendam-se. Isso é tudo. Amem-se!!».

Deus concluiu a Sua obra-prima ao criar homem e mulher que se amam. Enchei as vasilhas! –, e dá-se o milagre. O reencontro em casal e em comunidade, em tempo de férias, é um tempo de diálogo, de escuta, de partilha e de oração, ingredientes para atestar o reservatório de amor e para regar o romance com muito vinho.

Em férias, com muito vinho

A dinâmica do Encontro Matrimonial passa pela reflexão, em casal, em equipa (que inclui um sacerdote ou religioso/a) e em comunidade, sobre questões que afectam as relações consagradas, de modo a manter vivo o sonho do casal e do sacerdote/religioso/a, no momento em que se comprometeram a construir a sua família/comunidade.
Dada a proximidade, a selecção do tema incidiu naturalmente sobre a alegria do reencontro em casal e com Deus no período de férias. É nesta altura que surgem discórdias sobre a escolha do local e onde o tempo de partilha com a família mais alargada pode ser motivo de desacordo. É também neste período que o casal partilha o quarto com os filhos em hotéis, o que pode interferir na sua relação. Em contrapartida, para outros casais, as férias são motivo de uma alegria imensa, uma oportunidade de viverem tempos de qualidade, pois significa o reencontro, por estarem afastados ao longo do tempo.

Os testemunhos partilhados revelam a intensidade dos sentimentos que envolvem o casal, a equipa ou a comunidade:

A. – “É nas férias que estamos mais próximos um do outro, onde temos mais tempos de qualidade. Sinto que esta proximidade à S. é a resposta ao convite de Maria, pois aprendi no fim-de-semana que ao reconhecer e dar nome aos meus sentimentos, partilhando-os, estou a contribuir para o reforço do nosso amor. Nesses períodos, estou mais atento à necessidade que tem de ser escutada e amada, bem como aceitar o que mais gosta de fazer: passear e ver coisas novas ou visitar os Hard Rock Café das cidades por onde viajamos. Nestes lugares, vivemos com muita alegria a Eucaristia e eu sinto-me em paz, em pertença e com muita confiança no nosso amor e bem mais próximo de Deus”.

S. – “Como disse Maria, aceito um convite de Jesus sempre que abro as portas do meu coração ao A., mesmo que todas as minhas forças apontem para o contrário, tendo aprendido com o fim-de-semana que me ensinou que amar é uma decisão. Estar de férias é estar com quem mais amamos todas as horas do dia, podendo-se tornar um verdadeiro desafio porque temos que ceder e é nestas alturas que estou mais atenta ao A., unindo-me a ele para que se sinta mais amado e que me faz sentir mais válida, acompanhando-o, por exemplo, nas suas incursões filatélicas, na busca dos CDs que tanto gosta ou nas caminhadas pela praia.

A experiência do diálogo em forma de partilha de sentimentos permite conhecermo-nos melhor e mostra-nos que quando nos abrimos um ao outro confiadamente, sem reservas nem calculismos, quando nos acolhemos e nos escutamos mutuamente, a energia que brota do nosso amor único de casal (e sacerdote/religioso/a) é um sinal vivo, uma força contagiante e geradora de alianças, fazendo-nos estar disponíveis um para o outro e para os outros e, sermos sinal de amor para todos os que tocam as nossas vidas, os filhos, os familiares, os amigos.

É com esta dinâmica que partilhamos convosco uma pergunta para a vossa reflexão: Nestas férias, como vamos servir o vinho bom na renovação da nossa boda? E de que forma estamos dispostos a convidar Jesus para participar neste período de lazer, respondendo à prece de Maria?

Boas férias. Com um bom vintage.

Noémia+Jorge com Pe. Leonel Neves, casal responsável e assistente do Encontro Matrimonial em Setúbal

 

 

 

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14 de Julho de 2017