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Sínodo dos Bispos para o Médio Oriente

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Bento XVI entregou este Domingo aos bispos e patriarcas do Médio Oriente, no fim da missa a que presidiu em Nicósia, o texto de trabalho que vai servir de preparação ao Sínodo dos Bispos para aquela região.
A assembleia, que decorre no Vaticano entre 10 e 24 de Outubro, vai ser dedicada ao tema “A multidão dos que haviam abraçado a fé tinha um só coração e uma só alma”, frase extraída do livro bíblico dos Actos dos Apóstolos.

O “Instrumentum Laboris”, nome dado a este género de documentos, tem 40 páginas resultantes das respostas a um questionário previamente enviado aos diversos organismos que compõem a Igreja católica no Médio Oriente.

Na introdução, o secretario geral do Sínodo dos Bispos, arcebispo Nikola Eterovic, sublinha que a situação actual na região é em muitos aspectos pouco diferente daquela vivida pela primitiva comunidade cristã na Terra Santa, “ no meio de dificuldades e perseguições”.

O preâmbulo recorda que Bento XVI anunciou a realização do encontro a 19 de Setembro de 2009, acolhendo o pedido de numerosos prelados, que perante a delicada situação eclesial e social haviam proposto a convocação de uma assembleia sinodal.

O Sínodo tem dois objectivos principais: confirmar e reforçar os cristãos na sua identidade mediante a palavra de Deus e os sacramentos e reavivar a comunhão entre as Igrejas, para que possam dar um testemunho de vida cristã autentica, alegre e atraente.

O encontro pretende também acentuar o empenho ecuménico e o diálogo com judeus e muçulmanos para o bem da sociedade e para que a religião, sobretudo dos crentes que professam um único Deus, se torne cada vez mais motivo de paz.

O primeiro capitulo do “Instrumentum Laboris” reflecte sobre o catolicismo no Médio Oriente, recordando que todas as comunidades eclesiais do mundo remontam à Igreja de Jerusalém.

O texto refere que as divisões entre os cristãos (Concílios de Éfeso e de Calcedónia no século V, e separação de Roma e Constantinopla no século XI) foram devidas sobretudo a motivos políticos e culturais, manifestando no entanto a convicção de que o Espírito Santo contribui para aproximar as Igrejas e fazer cair os obstáculos à unidade visível desejada por Cristo.

As comunidades católicas no Médio Oriente têm várias tradições: além da latina, há seis Igrejas patriarcais, cada uma com o seu rico património espiritual, teológico e litúrgico.

A primeira parte do texto de trabalho assinala igualmente que as Igrejas do Médio Oriente advêm dos apóstolos ou daqueles que, do ponto de vista temporal e teológico, estiveram perto das suas convicções, pelo que a Igreja tem a grave responsabilidade de manter a fé cristã na região onde nasceu.

Os católicos são chamados a promover o conceito de laicidade positiva do Estado para aliviar o carácter teocrático dos governos e permitir maior igualdade entre os cidadãos de religiões diferentes, favorecendo a promoção de uma democracia sã, positivamente laica, que reconheça plenamente o papel da religião na vida privada e pública, no pleno respeito da distinção entre a ordem religiosa e temporal.

Conflitos regionais

O documento sublinha que os conflitos regionais tornam ainda mais frágil a situação dos cristãos, que se encontram entre as vítimas principais da guerra no Iraque. Ainda hoje a politica mundial não os tem na devida conta. No Líbano, os cristãos estão divididos no plano politico e confessional. No Egipto, o crescimento do Islão político e o desempenho, em parte forçado, dos cristãos em relação à sociedade civil expõem as suas vidas a sérias dificuldades.Na Turquia, o conceito de laicidade cria ainda problemas à plena liberdade religiosa do país. Os cristãos são exortados a não descurar os seus compromissos na sociedade, não obstante as tentações ao desalento.

Noutros países, as ditaduras levam a população, inclusivamente os cristãos, a tudo suportar em silêncio para salvar o essencial.

No Oriente, salienta o documento de trabalho, liberdade de religião significa geralmente liberdade de culto, ficando excluída daquele conceito a liberdade de consciência, isto é, a possibilidade de acreditar ou não acreditar em Deus, de praticar uma religião isoladamente ou em público ou de mudar de convicções religiosas.

A religião é frequentementel uma opção social e até mesmo nacional, não individual, pelo que alterar as convicções neste domínio é considerado uma traição em relação à sociedade, à cultura e à nação. Para os muçulmanos, a conversão é muitas vezes proibida pelas leis do Estado.

O segundo capitulo é dedicado à comunhão eclesial. O documento salienta que os fiéis do Médio Oriente estão conscientes de que a comunhão cristã tem como fundamento o modelo da vida divina da Santíssima Trindade, em que relações entre as pessoas divinas – Pai e Filho e Espírito Santo – são de amor.

Para promover a unidade na diversidade é necessário superar o confessionalismo naquilo que pode ter de limitado ou exagerado, encorajar o espírito de cooperação entre as várias comunidades, coordenar a actividade pastoral e estimular a elevação espiritual, e não a rivalidade.

Os cristãos são convidados a sentirem-se membros da Igreja Católica no Médio Oriente, e não apenas membros de uma Igreja particular, enquanto que o clero e os consagrados são chamados a serem exemplares.

O Sínodo deve encorajar os fiéis a assumirem mais o seu papel de baptizados, promovendo iniciativas pastorais, especialmente no que diz respeito ao empenho social, em comunhão com os pastores da Igreja.

Ecumenismo e diálogo interreligioso

O terceiro capitulo aborda o tema do testemunho cristão, reafirmando a importância da catequese para conhecer e transmitir a fé, de modo a eliminar a distância entre as convicções e a prática. No que diz respeito à liturgia, o documento manifesta o desejo de renovação, que embora não elimine a tradição, deve ter em devida conta a sensibilidade moderna e as necessidades espirituais e pastorais actuais.

Reafirma-se a urgência do ecumenismo, superando preconceitos e desconfianças através do diálogo e da colaboração.

O diálogo com os hebreus é qualificado de essencial, embora não seja fácil, ressentindo o conflito entre Israel e palestinianos. O Vaticano deseja que os dois povos vivam em paz numa pátria que seja deles, no interior de fronteiras seguras e internacionalmente reconhecidas.

O texto reafirma a condenação do anti-semitismo, sublinhando que as atitudes negativas entre árabes e judeus parecem ser sobretudo de carácter político, e portanto estranhas a qualquer discurso eclesial. Os cristãos são chamados a levar um espírito de reconciliação para a realidade religiosa e politica.

Também as relações da Igreja Católica com os muçulmanos são uma necessidade vital. Salienta-se que é importante manter diálogos bilaterais – com os judeus e com o Islão – e também trilateral.

As relações entre cristãos e muçulmanos são por vezes difíceis, sobretudo pelo facto de os muçulmanos não fazerem distinção entre religião e politica, facto que coloca os cristãos na situação delicada de não-cidadãos, quando eles são cidadãos destes países já muito antes da chegada do Islão.

A chave do sucesso da coexistência entre cristãos e muçulmanos depende do reconhecimento da liberdade religiosa e dos direitos do homem.

Os cristãos são chamados a não se isolarem em guetos e em atitudes defensivas, sendo também exortados a promover a pedagogia da paz.

Muitos fiéis insistem no facto de que cristãos e muçulmanos devem trabalhar juntos para promover a justiça social, a paz e a liberdade, defendendo também os direitos humanos e os valores da vida e da família.

Convivência difícil

O texto analisa também o forte impacto da modernidade que ao muçulmano crente se apresenta com um rosto ateu e imoral.

As novas tendências são consideradas uma invasão cultural que o ameaça, perturbando o seu sistema de valores. Mas a contemporaneidade significa igualmente luta pela justiça, igualdade e direitos.

O “Instrumentum Laboris” reflecte seguidamente sobre a evangelização na sociedade muçulmana, que pode acontecer apenas através do testemunho, embora se peça que ela seja garantida também por intervenções externas.

A actividade caritativa das comunidades católicas em relação aos mais pobres e excluídos tem representado a forma mais evidente de difundir o ensinamento cristão. Muitas vezes esses serviços são assegurados apenas pelas instituições eclesiais.

Na conclusão, o documento de trabalho realça a preocupação pelas dificuldades do momento presente, mas ao mesmo tempo sublinha a esperança fundada na fé cristã.
A historia – lê-se – fez com que nos tornássemos um pequeno rebanho. Mas nós, com a nossa conduta, podemos voltar a ser uma presença que conta.

Desde há decénios que a não resolução dos conflitos, o desrespeito pelo direito internacional e pelos direitos humanos, assim como o egoísmo das grandes potências têm vindo a desestabilizar o equilíbrio da região e impuseram às populações uma violência que corre o risco de as lançar no desespero, conduzindo-as muitas vezes à emigração, especialmente dos cristãos.

Os católicos do Médio Oriente, sustentados pelas comunidades eclesiais de todo o mundo, são chamados a aceitar a própria vocação, ao serviço da sociedade. O convite aos crentes é que sejam testemunhas conscientes da mensagem evangélica, mesmo sabendo que essa atitude os pode levar a serem perseguidos.

Com Rádio Vaticano

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07 de Junho de 2010