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As greves e as suas contradições

Padre Manuel Soares

Acaba o país de viver uma greve geral. As medidas de austeridade que os cidadãos terão de suportar nos próximos anos foram a razão forte para uma manifestação pública do seu descontentamento. A vida fica mais difícil e esse é um motivo grave para desagrado. Convém mostrar o que senti-mos interiormente nas questões sociais quando há prejuízo para a generalidade dos cidadãos que devem lutar por um maior equilíbrio e justiça. A greve pode ser a visibilidade desse desagrado geral se outros meios não se apresentam com utilidade. As greves podem assim ter o seu lugar enquanto meio para chamar a atenção e fazer pensar quem é responsável.

 

 

Acaba o país de viver uma greve geral. As medidas de austeridade que os cidadãos terão de suportar nos próximos anos foram a razão forte para uma manifestação pública do seu descontentamento. A vida fica mais difícil e esse é um motivo grave para desagrado. Convém mostrar o que senti-mos interiormente nas questões sociais quando há prejuízo para a generalidade dos cidadãos que devem lutar por um maior equilíbrio e justiça. A greve pode ser a visibilidade desse desagrado geral se outros meios não se apresentam com utilidade. As greves podem assim ter o seu lugar enquanto meio para chamar a atenção e fazer pensar quem é responsável.

O uso deste procedimento não pode fazer-se sem alguma reflexão, sem consideração pelos seus efeitos e consequências. Mais ou menos todos prestamos serviços uns aos outros com o nosso trabalho. A suspensão do nosso trabalho pode atingir directamente o Estado e seus governantes, ou as empresas particulares e seus dirigentes ou ainda os colegas de trabalho que estão dependentes da nossa actividade. Se não somos cegos temos de distinguir os nossos alvos quando se adere a uma paragem grevista: se queremos castigar os governantes e os que fazem as leis talvez os cozinheiros dos Ministérios, da Assembleia da República ou de S. Bento sejam os melhores para alvejar os responsáveis políticos. Também poderiam ser as criadas de quarto ou de limpeza a fazer-lhes sentir o mal-estar obrigando-os a desembaraçarem-se sozinhos. Se os transportes públicos param os carros oficiais dos governantes podem ainda rolar, até com mais desenvoltura. Só os seus motoristas causariam algum incómodo se recusassem trabalhar. Claro que tudo isto é facilmente ultrapassável para os supostos atingidos.

Entretanto uma greve geral que abranja a maioria dos transportes, das cantinas de trabalhadores ou alunos, de repartições de atendimento ou dos professores e médicos castiga muita gente perfeitamente inocente que tem de caminhar a pé, que não terá a sua refeição, que não poderá resolver o seu problema ou não receberá os conhecimentos a que tem direito, tornando-se assim os mais prejudicados. É como um doente que, zangado com o regi-me imposto pelo médico, recusa tomar qualquer medicamento ou o aluno que aborrecido com a incompetência ou a rispidez do professor se nega a escutar as suas lições. O prejudicado é ele próprio.

Pretende-se com a greve dar mais saúde ao país, exigindo mudança de orientação, maior partilha na justiça, mais desafogo para quem sofre. São justas estas aspirações e exigências. A tragédia é que a paralisação afunda mais ainda a economia, impede o desenvolvimento, transfere para quem se revolta o “mal da fita”. De resto, é o trabalhador grevista que mais imediatamente sofre com a acção: nesse dia ninguém lhe pagará o salário com que ele compra a sua refeição, paga a sua casa, procura o bem dos seus filhos.

A pergunta impõe-se e a resposta é urgente: que está nas nossas mãos fazer, entendamos nas mãos da maioria, para que tudo isto mude para maior partilha e justiça? Pode não ser apenas a greve.

 

P. Manuel Soares

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30 de Novembro de 2010