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Cultivar a pastoral da proximidade

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É na Paróquia de Santa Margarida, no Lavradio, que terminamos o retrato das Paróquias da vigararia Barreiro/Moita. Para nos falar dos desafios e características daquela comunidade, recebeu-nos o pároco, Padre José Manuel Andrade, que pertence à congregação religiosa Filhos da Caridade.

Pároco no Lavradio desde Setembro de 2008, o Padre José Manuel Andrade explica-nos de que forma é que aquela comunidade é marcada pela presença dos Filhos da Caridade: «Nós temos uma espiritualidade muito própria de fazer chegar às pessoas a sede de Cristo e o desejo de descobrir a dimensão de ser cristãos. Não estamos só virados para o culto ad intra, mas preocupamo-nos em nos aproximarmos das pessoas, compreender os seus sofrimentos, as suas alegrias, anseios e interrogações e, nesse sentido, há aqui uma pastoral da proximidade».
Como exemplo desta realidade, o prior aponta, por exemplo, a formação dos leigos nas suas próprias casas em vez de na Igreja. «Quando os pais vêm à Igreja dizer que gostavam de batizar os seus filhos, eu desafio-os e digo-lhes ‘Então eu gostava de fazer essa preparação na vossa casa, se não se importam’. As pessoas ficam admiradas mas aceitam muito bem e preparam toda a casa e está sempre a família toda para receber o sacerdote», refere o Padre José Manuel.
Conta-nos o pároco que este tem sido um desafio interessante que permite tocar toda a dimensão humana dessas pessoas, e perceber aas dificuldades que têm na «sociedade de crise» em que vivemos atualmente. Por outro lado, sendo uma pastoral que vai ao encontro das pessoas existe também um compromisso. «As pessoas vão-se comprometendo e perguntando-me ‘Onde nos podemos integrar na comunidade cristã?’. Às vezes não é fácil, à primeira vista, dizer para onde devem ir estas pessoas mas há um processo que o pároco faz em conjunto com o conselho pastoral, e procuramos ver onde é que a pessoa deve estar inserida e a caminhada de formação que a pessoa tem», sublinha o Padre José Manuel.

Apoio sócio caritativo marca vida comunitária

Para além de sair da Igreja e de ir ter com as pessoas nos locais onde elas estão, a Paróquia do Lavradio tem desenvolvido muito o aspeto sócio caritativo. Com cerca de setenta e cinco famílias apoiadas, sem qualquer ligação a Instituições Particulares de Solidariedade Social, toda a comunidade cristã está envolvida na atenção aos pobres.
«Quando entrei havia um pequeno grupo da Caritas, de cinco pessoas, já bastante envelhecidas e muito limitadas no tipo de ação. E, de facto, nós temos que olhar ao mais fundo das pessoas que vêm até nós. Não só dar mas perceber o que está por detrás destas situações, que por vezes é muito complexo», refere o prior.
Neste sentido, a primeira iniciativa do pároco foi levar a que toda a comunidade se preocupasse com os mais carenciados: «Na segunda semana de cada mês as pessoas levam uma espécie de rifa com um bem alimentar. Na terceira semana quando vêm à missa e trazem esse pequeno compromisso porque a liturgia é também para nos comprometermos. Se fazemos parte do corpo de Jesus, quando saímos da celebração temos ainda mais de levar aos outros a experiência de viver em Jesus. Depois, fazemos cabazes com estes alimentos e temos ajudado muitas famílias».

A viver há vinte anos no Lavradio, o Padre José Manuel Andrade confessa que nunca viu aquela terra como está hoje. «Atualmente, há muitas pessoas que passam fome aqui no concelho do Barreiro e sobretudo no Lavradio. Estou aqui há vinte anos e nunca vi o Lavradio tão pobre como está hoje. Primeiro o grande problema vem das famílias desestruturadas e depois há a fome. E o problema é ainda maior», salienta.
Uma outra iniciativa ao nível do apoio sócio caritativo foi a criação de um grupo de Apoio Alimentar que funciona na base do voluntariado e que tem duas tarefas. Existe um grupo responsável para a recolha de alimentos em supermercados, pastelarias e cafés e depois um outro grupo responsável pelo acolhimento às famílias, na Igreja, que funciona seis dias por semana, de Segunda a Sábado.
«As famílias procuram-nos, nós fazemos um levantamento das necessidades e depois sou eu, o pároco, que vou visitar aquela família. Temos que dar respostas sem demora e sem as burocracias da Segurança Social e do Centro de Emprego porque há gente a passar fome», afirma o Padre José Manuel.

Acolher as pessoas em festa

Na Paróquia do Lavradio, o Padre José Manuel Andrade não é o único sacerdote. A acompanhá-lo está também o Padre Rodrigo Mendes, vice-reitor do Seminário de Almada. «O Padre Rodrigo está mais na área da liturgia. É um padre com muitos anos e experiência de vida – diz o Padre José Manuel – e eu sou um pároco jovem mas complementamo-nos um ao outro. Partilhamos muito e discernimos como devemos ajudar as pessoas e os grupos a crescer, e a ser mais comunhão na Igreja no mundo de hoje. Temos maneiras de pensar diferentes, mas uma grande complementaridade».
Diz-nos ainda o Padre José Manuel: «Nesta área da liturgia, ainda há muito caminho a fazer, sobretudo porque temos que encontrar pessoas disponíveis para servir o Senhor e dispostas a assumir o compromisso. Por outro lado, também é preciso que as pessoas se sintam acolhidas. Temos todos os cuidados com a liturgia mas também temos que saber acolher as pessoas».
Neste acolhimento às pessoas, o prior considera que a festa e o convívio são importantes. «Acho que devemos devolver às pessoas a religiosidade popular. Os arraiais, as procissões, por exemplo. Nós estamos a ter, aqui na Paróquia, ao longo de todo o mês de Junho, nos fins-de-semana, as Festas dos Santos Populares. Há aqui pessoas que têm estas raízes, que vêm do Norte e estão habituadas a isto. E isto é bom porque há celebração, convívio, encontro com as pessoas. Se terminarmos a Santa Missa e cada um for para a sua casa, eu acho que é matar a liturgia do próprio povo», refere o sacerdote.
Por outro lado, a Igreja no Lavradio está sempre aberta, durante todo o dia e isso é também uma forma de receber e acolher as pessoas: «a igreja abre às 8h e fecha às 20h. Está sempre aberta e vem muita gente rezar ou confessar-se – afirma o Padre José Manuel – Às vezes até encontro pessoas a chorar na Igreja e chego-me ao lado delas e pergunto ‘Porque choras?’ – E encontramos uma forma própria de receber estas pessoas».

Crescimento pastoral conjunto

Em Santa Margarida, o pároco tem também alguma preocupação para que exista um crescimento pastoral conjunto. Para tal, uma das coisas que foi criada foi um Secretariado de Catequese com dois coordenadores, um membro da comissão de pais e um chefe de Escuteiros. «Encontramo-nos mensalmente para um tempo de formação com o pároco e depois um tempo mais prático para organizar a pastoral. Com duzentas e cinquenta crianças na catequese, e com o Agrupamento de Escuteiros 1011 Lavradio cheio e com lista de espera, temos que ter este trabalho conjunto», assegura o prior.
Para além disto, existem ainda dois grupos de jovens Shalom cujo encontro nacional vai ser no Lavradio em Outubro, e a comunidade africana Nova Esperança que anima a Eucaristia uma vez por mês. «Estamos nas vésperas do Ano da Fé – diz o pároco – e queremos aqui começar a envolver cada vez mais as diferentes expressões de fé na comunidade. Olhamos para as comunidades cristãs e vemos as pessoas muito envelhecidas. Mas será que somos capazes de acolher outras expressões de fé?».
O pároco disse-nos ainda que, este ano, para os Crismas e Primeiras Comunhões que vão existir na Paróquia, foram criadas dinâmicas específicas. «Muitas vezes o Senhor Bispo vêm crismar as pessoas e eu não os vejo mais. Este ano, a muitos deles já estou a dar-lhes formação para se prepararem para leitores, para o sócio caritativo, de forma a integrá-los nos grupos e movimentos para depois assumirem esse compromisso. É preciso dar tempo e sentido à caminhada das pessoas. Relativamente às primeiras comunhões, pela primeira vez fiz uma proposta aos pais. Se não gostariam de comungar juntamente com os seus filhos e propus-lhes o sacramento da reconciliação também. Hoje os pais são coxos na sua formação cristã. E então, propus também a estes pais, no próximo ano, entrarem num pequeno grupo de adultos para aprofundarem a sua fé. Até para ajudar ao crescimento das crianças na catequese. A casa tem que ser um lugar para exprimir aquilo que se vive na catequese», explica o Padre José Manuel.

Fidalguinhos a crescer

Integrada na Paróquia do Lavradio está a comunidade dos Fidalguinhos, que vai ganhando vida própria. «São entre cinco a seis mil pessoas que lá vivem, gente nova, filhos desta terra», salienta o prior. Com catequese e um grupo bíblico organizado, a Eucaristia dominical naquela comunidade tem a presença de cerca de oitenta pessoas.
Em termos de espaço, a comunidade sente já necessidade de edificar um novo templo, uma nova Igreja. Neste momento, existe apenas um salão multiusos onde há espaços distintos para a celebração da Eucaristia, para a catequese e um espaço mais amplo para convívio. «Começou a ser construído o ano passado e já está de pé, apesar das dificuldades financeiras», refere o prior.
Para que se possa continuar a desenvolver a ação pastoral nos Fidalguinhos, o pároco lançou às famílias o desafio de contribuir com uma quotização mensal. «Vamos ter com as pessoas a casa e damos-lhes a conhecer o salão multiusos como projeto pastoral. Todos estão a colaborar como podem. É uma forma, também, de as pessoas se comprometerem. Não é, muitas vezes fácil, ouvimos de tudo, mas vale a pena o risco», garante o sacerdote.
Para angariar fundos para a Paróquia do Lavradio, o Padre José Manuel Andrade diz ainda que em finais de Setembro vai ser feito um espetáculo com a artista portuguesa, mas de renome internacional, Teresa Salgueiro, e que irá reverter sobretudo para a comunidade dos Fidalguinhos.

Anabela Sousa

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12 de Junho de 2012