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Dar testemunho de Igreja

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São Paulo é das Paróquias mais recentes da cidade de Setúbal. Criada há quase dezasseis anos, pertencia antes à Paróquia de São Julião. É, pois, entre os prédios de uma zona mais nova da cidade que se ergue, hoje, a Igreja Paroquial. Fomos até lá falar com o pároco, Padre José Lopes Gusmão, que acompanha aquela comunidade há mais de trinta anos.

«Quando vim para cá – conta-nos o Padre José Gusmão – ainda antes da criação da Paróquia, foi já na intenção de começar aqui a celebrar missa, dar alguma dinâmica para tornar esta parte independente e construir uma Igreja. Esta zona cresceu muito a nível demográfico e era difícil ir a São Julião. Então, o Padre Rodrigo, que estava aqui na altura, mandou construir um pavilhão pré-fabricado para dar catequese e os grupos poderem começar a reunir por aqui».
O Padre José Gusmão está em São Paulo já há quase trinta e cinco anos. Estive dezanove anos provisoriamente, a tentar construir a Igreja, e agora enquanto pároco, há quinze anos e meio», indica. De facto, todo o esforço feito para constituir a comunidade e construir a Igreja foi imenso. «Fizemos muitas angariações de fundos, tivemos muitas iniciativas – fados, variedades, concertos, almoços, passeios para o estrangeiro… Tudo com o objetivo de construir a Igreja. Conseguimos este lote. É pequenino mas tentámos fazer o possível com o espaço que tínhamos. O que ajuda muito é a cave que temos e que tem toda a área da Igreja. Temos aí as capelas mortuárias, um espaço para convívio e salas», diz o prior.
No início, a comunidade era relativamente pequena. Com o tempo, e com a edificação da Igreja, foi crescendo e hoje, para além da Eucaristia diária, tem três Eucaristias dominicais: uma vespertina ao Sábado e duas ao Domingo. «Qualquer das Eucaristias está sempre cheia – salienta o pároco – O último recenseamento que fizemos, no que respeita à frequência, deu aqui uma percentagem de 10,5% de praticantes. Aqui na cidade foi a Paróquia que teve a percentagem maior. São mais de mil fiéis e não noto que tenha diminuído».
Sintomático do crescimento da comunidade é, diz o Padre José Gusmão, alguma falta de familiaridade. «Quando estávamos no pré-fabricado era diferente. Havia um sentido de comunidade diferente. Todos entravam e saiam pela mesma porta e isso fazia com que as pessoas falassem umas com as outras. Aqui, a Igreja tem mais do que uma porta e isso acaba por quebrar a familiaridade. É preciso que as pessoas se encontrem, falem, convivam um pouco. Isso é importante para que se conheçam uns aos outros, para que se crie uma fraternidade e se dê testemunho de Igreja», assinala o sacerdote.

Dinamismo pastoral para a família

Apesar desta dificuldade apontada pelo pároco, São Paulo é uma paróquia dinâmica, com a presença expressiva de alguns grupos. Na catequese, por exemplo, existem cerca de trezentas e oitenta crianças para trinta catequistas. Diz o pároco: «Só estes catequistas, é pouco. Há alguns grupos muito grandes e isso prejudica a dinâmica de um encontro de catequese». Para além dos grupos de ação litúrgica, catequese, pastoral juvenil e pastoral familiar, existe ainda o Agrupamento de Escuteiros 1118 São Paulo, um grupo do Renovamento Carismático, outro da Mensagem de Fátima e ainda um mais recente, a Vida Ascendente, movimento cristão de reformados.

Na Paróquia, o Padre José Gusmão tem ainda a preocupação de assinalar alguns momentos importantes relacionados com a família, dando-lhes expressão e visibilidade: «Temos incentivado a celebração dos vinte e cinco e cinquenta anos de matrimónio, sempre na Eucaristia com a bênção das alianças e o renovar dos votos. Numa sociedade onde a família está crise, são estímulos e exemplos que apresentamos à comunidade, mostrando que há gente capaz de ser fiel, dizendo aos jovens que vale a pena. No dia da Sagrada Família tentamos também valorizar o encontro da família nesse dia, de modo a que haja uma presença diferente na missa e exista algo novo», explica o pároco.
Outra das iniciativas da Paróquia é a celebração do dia paroquial do doente, com a celebração comunitária da Santa Unção. «No último que celebrámos, fizemos uma celebração mariana onde integrámos a Unção dos cerca de vinte doentes. Foi um convívio onde os Escuteiros colaboraram imenso. Para além do convívio que é saudável, tiramos com isto, a nota negativa da Santa Unção, que é vista como a extrema-unção, como passaporte para a eternidade. Mas não! É o sacramento dos doentes, a Unção dos Doentes, pedindo ao Senhor as melhoras e as Suas graças e o Seu Espírito para que proteja e fortaleça o doente física e espiritualmente. É uma forma pedagógica de dar a entender este sacramento», refere o Padre José Gusmão.

Partilha fraterna com os pobres ‘envergonhados’

No que diz respeito à ação social, esta é também marcante na Paróquia. No início, o sacerdote diz que não existia essa preocupação porque aquela era considerada uma zona de classe média alta. Com o agudizar da crise e das condições socioeconómicas dos agregados familiares, o panorama alterou-se. «Tem-nos vindo muita gente bater à porta. Tínhamos e continuamos a ter um grupo de distribuição de roupas organizado, mas agora não há muita necessidade de roupa. O que as pessoas agora procuram é comida. Temos muita gente a pedir para comer, para pagar a renda da casa, para pagar a água, a luz, a conta da farmácia. E aumenta a cada dia que passa e casos mais graves», diz o sacerdote.
Ainda assim, e para além do aumento da procura de ajuda, o Padre José Gusmão fala-nos de um drama maior, a pobreza envergonhada: «O problema pior que vejo aqui e que me preocupa mais é a pobreza envergonhada. Este é um bairro de classe média-alta e as pessoas não estão habituadas a pedir. Estão habituadas a ter dinheiro. Muitas vezes passam mal e não dizem. Nós ajudamos, muitas vezes porque alguém nos alerta. Por exemplo, há dias, vieram-me falar da situação de uma família e tivemos que andar com ‘pezinhos de lã’ a sondar as pessoas para que não se sentissem melindradas. Arranjámos-lhes um avio grande e quando entregámos essa comida, em casa dessas pessoas, todos choravam todos porque diziam que já há três meses não tinha tanta comida em casa e a despensa tão cheia. Mais tarde, mandei perguntar se precisavam de alguma coisa e a família disse que não, que ajudassem outro que precisasse. Esta honestidade também nos sensibiliza».
Uma das coisas que o Padre José Gusmão faz questão de salientar é que todo o apoio alimentar prestado pela Paróquia de São Paulo não provém de uma Instituição Particular de Solidariedade Social nem de apoios da Segurança Social. «Aquilo que repartimos é apenas a partilha da comunidade. Depois é distribuído até acabar. Quando acaba, fazemos novo apelo. Temos pessoas que todas as semanas trazem sempre alguma coisa. Nem é preciso estar a pedir. É uma forma de nos comprometermos com todos. Isto também responsabiliza um pouco a comunidade. É sentir que há outros irmãos que precisam e que partilham. As pessoas sentem que há pobres na paróquia, que há irmãos que estão a passar mal e que às vezes nem os conhecem ou que vivem mesmo ao seu lado e nem dão conta», explica o sacerdote.

Formar os cristãos e acolher quem chega

Para o próximo ano pastoral, e com o aproximar do Ano da Fé proclamado por Bento XVI, o Padre José Gusmão pretende recomeçar na Paróquia algo que se fazia no início, quando chegou à comunidade, mas que com o tempo se deixou: «A minha maior preocupação é que no próximo ano, que é o Ano da Fé, tentemos dar uma certa força à formação quer dos jovens, quer dos adultos, em grupos de reflexão semanal sobre a Bíblia ou sobre documentos do Concílio Vaticano II. O importante é dar formação, mas ao mesmo tempo responsabilizar as pessoas pelo crescimento da comunidade e da Paróquia», destaca.
Numa Paróquia onde o padroeiro é São Paulo, o prior conta que a comunidade assinala sempre esse tempo festivo promovendo o convívio ao mesmo tempo que se conhece um pouco mais da vida e da espiritualidade do apóstolo: «Este ano, por exemplo, fizemos um jogo de pistas, com a ajuda dos Escuteiros. Fazemos também sempre nessa altura uma colheita de sangue para assinalar a dádiva da vida. Vem sempre o Instituto Português do Sangue fazer uma recolha».
Para o Padre José Gusmão, São Paulo precisa de saber, cada vez mais, acolher quem chega: «Precisamos ser acolhedores. Tem sido uma preocupação minha. Acolher quem chega. Mesmo que tenha que dizer não, que seja um não justificado. Não só porque não mas por isto. Que a pessoa saia sentindo-se acolhida, mas que não saia revoltada porque lhe foi dado um não. O que eu quero é ajudar os cristãos a descobrirem o que é ser cristão e a descobrirem Cristo que nos reúne e nos convoca para criar um mundo novo. Quero que vejam em mim um servo, humilde, que vejam em mim o caminho para chegar a Cristo. Procuro não dar muito nas vistas, estou por aqui, disponível para atender, para deixar que as pessoas venham ter comigo, para ir ter com elas e conhecê-las o mais possível», conclui.

Anabela Sousa

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03 de Julho de 2012