Chegamos esta semana à Paróquia de Almada. Situada numa das partes mais antigas da cidade é uma paróquia claramente urbana e com grande rotatividade de fiéis nas Eucaristias. Falámos com o pároco, Padre Fernando Belo, que nos explicou como ali a preocupação continua a ser a necessidade da evangelização pela missão, «não apenas missão clerical, mas missão de todos os batizados».
«Hoje somos absorvidos pela pastoral de manutenção e falta-nos disponibilidade para irmos ao encontro de tantos, a maioria, que nem sequer ouviram falar do reino de Deus. Esta preocupação leva-nos a aprender a caridade como arte do encontro e da relação com os outros», diz o Padre Fernando Belo.
Pároco em Almada há catorze anos o sacerdote salienta que quando ali chegou, sonhou com uma «grande zona pastoral», com culto em cada uma das Igrejas mas servida por um grupo de sacerdotes que, em conjunto, assumiam toda a ação pastoral da cidade de Almada. «Sonho bonito, mas com barreira a ultrapassar. Paróquias ainda muito voltadas para dentro, para as suas atividades e nós padres ainda muito agarrados à ‘paroquialite’, enfim, velhos erros e atuais defeitos», sublinha.
Neste sentido, o Padre Fernando Belo afirma que a vivência do Jubileu no ano 200, a participação de Almada no ICNE (Congresso Internacional para a Nova Evangelização) em 2004/2005 e o Ano da Eucaristia, fizeram criar em Almada, entre as cinco paróquias, um dinamismo comum e partilha de ideias e ações que ainda hoje recorda com muito agrado.
Vivência igualmente importante, foi a iniciativa OPSIS que encerrou as semanas paroquiais da fé em Almada. «Houve uma grande unidade entre as paróquias e tivemos um resultado muito bonito com os centros paroquiais em união uns com os outros que andavam muito de costas voltadas. Nós, Padres, ao refletirmos nisso, vimos que nesta cidade foi um sinal com bastante participação das pessoas e que os cristãos desejam mais destas iniciativas», refere o pároco.
Leigos generosos e disponíveis
No entanto, de acordo com o Padre Fernando Belo, há obstáculos a esta unidade: «O obstáculo maior de se fazerem coisas a nível da cidade não é as pessoas virem, é as pessoas sentirem que nós Padres estamos unidos e a cativar as pessoas. Isto é tudo muito bonito, mas se o pastor não for, o rebanho olha para a pastagem mas não avança. Se o pastor não entusiasmar as pessoas, as pessoas desligam-se. Povo de Deus está muito atento e muito disponível mas quer também que os sacerdotes deem o exemplo».
Uma das características da comunidade em Almada, saliente o prior, é o facto de os leigos estarem sempre «muito disponíveis para tudo, com muita generosidade e sacrifício». Mas para conseguir o envolvimento dos leigos, o Padre Fernando Belo diz que é importante que os padres saibam acolher: «Temos que ser delicados e educados para que as pessoas se sintam bem na sua missão. O pastor tem que dar sempre o exemplo missionário. E eu vejo isso. Se eu me interesso, as pessoas participam. Se eu não me interesso, as pessoas participam menos», diz.
No que à evangelização diz respeito, o Padre Fernando Belo destaca ainda a importância do papel dos leigos no meio do mundo. «É preciso ter respeito por aqueles que andam à procura da fé e por isso há que ensinar a evangelizar. Temos que ter muito cuidado com aquilo que dizemos e fazemos. Às vezes os cristãos saem da missa, vão tomar o pequeno-almoço ao café e falam de coisas. Esquecem-se que estão outros ao lado ao ouvir e podem interpretar mal. Aquilo que se diz tem que ser muito sensato, apostólico e não coscuvilhice», destaca.
Gratidão pela fidelidade à Igreja
Almada foi uma zona que se desenvolveu muito nos anos sessenta e setenta, aponta o prior: «A ponte, a Lisnave, as indústrias ligadas à pesca e a proximidade a Lisboa contribuíram para que aqui se fixassem muitas famílias vindas, sobretudo do Algarve, do Alentejo e do Centro. A comunidade paroquial acolheu toda esta gente e compreendeu o seu dinamismo religioso, pastoral e social. A Igreja Matriz de São Tiago, na zona velha da cidade, tornou-se muito pequena para tanta vida paroquial».
É neste âmbito que nasce com o dinamismo apostólico do então pároco, Padre Francisco Ferreira, a ideia da construção de uma nova Igreja, a atual Igreja Paroquial de Nossa Senhora da Assunção, mais no centro da cidade. «Quero também deixar um testemunho de gratidão aos últimos párocos, infelizmente já falecidos, Padres Manuel Marques, Francisco Ferreira e Jaime Silva – diz o atual prior – Deixaram um testemunho muito bonito de amor e fidelidade à Igreja concretizado no serviço à comunidade».
Levar o Evangelho a quem não o conhece
Hoje, diz o Padre Fernando Belo, a paróquia é olhada nas suas três dimensões: profética, litúrgica e social e que é nestes pilares que assenta a sua ação. No que se refere à dimensão profética, o pároco salienta a catequese de crianças, jovens e adultos, o grupo de evangelização ‘Porta aberta ao diálogo’ e os encontros de formação.
«Aqui a catequese tem alguns problemas. Muitas das crianças no fim-de-semana afastam-se porque moram fora da cidade. Outro problema que aqui sentimos muito é que há certos temas que são muito delicados e que as catequistas têm muita dificuldade em avançar. Há muitas famílias que têm dramas e as crianças bebem muito os dramas da família. Às vezes é difícil falar no amor do pai ou da mãe. É um trabalho muito bonito mas um trabalho muito difícil», refere o pároco.
Há também na Paróquia a grupos de catequese de adultos, grupos bíblicos, outros encontros de formação para as pessoas e grupos de oração. Reúne-se ali a LIAM, a Mensagem de Fátima, a Obra do Bom Pastor e, de acordo com o prior, há muito a preocupação de levar, através do grupo dos doentes e da Conferência de São Vicente de Paulo a mensagem cristã a quem está sozinho e doente. Por outro lado, a ‘Porta aberta ao diálogo’, explica o Padre Fernando Belo, «é um meio de levar o Evangelho a quem ainda não vem à missa e de fazer um primeiro acolhimento a quem vem procurar o batismo ou a primeira comunhão».
«Neste campo, nós padres temos muito que aprender a acolher quem vem pedir o Batismo para as suas crianças, mesmo que os pais não sejam casados pela Igreja. Quando há uma recusa dura, dada à pressa, o casal fica frio. Eu às vezes penso muito nisto: Mas porque é que nós, padres, colocamos as leis acima das pessoas? Os padrinhos são diferentes, tem que se ter mais alguma exigência mas a criança não tem culpa dos pais que tem. Quando batizamos as crianças, há alguma coisa que fica», afirma o pároco.
«O apostolado bem feito dá muito trabalho»
Sublinha ainda o Padre Fernando Belo que a Igreja, como mãe, às vezes não acompanha o crescimento dos seus filhos, como por exemplo, procurar os batizados quando chega a idade de irem para a catequese. «É um trabalho muito bonito que compete não só aos Padres mas também aos leigos. O apostolado bem feito dá muito trabalho e não dá nas vistas. Passa pela preocupação pastoral: ‘tu pertencias à minha família, és meu irmão, onde estás?’», indica.
E afirma ainda: «Nestas paróquias citadinas, urbanas é um trabalho difícil. Muitas vezes o que há aqui entre as pessoas é aquilo a que eu chamo uma religião ‘descafeinada’, sem sabor e sem gosto mas que tem a cor da religião. Qualquer comunidade tem que ser comunidade profética e ser profeta é também ser humilde para aceitar porque as nossas palavras podem não evangelizar, mas o exemplo evangeliza. Temos que ser simples e humildes. Nós, Padres, temos que aprender muito a estar com os outros e a respeitar o povo, tal como o Papa Francisco tão bem nos tem ensinado. Ser profeta nas comunidades ao jeito da humildade e do serviço».
«Que se saia da missa e vá feliz para casa»
Já na dimensão litúrgica, o Padre Fernando inclui as celebrações, os sacramentos e os sacramentais: «Incluo aqui os funerais, as bênçãos dos carros, cerimónias de anos de casados. Há também situações de casais que não podem casar pela Igreja, só pelo civil, e às vezes passar por cá a pedir que o Padre lhes dê uma bênção. É sinal que fala, que marca, e que nos diz que Deus ainda faz parte da vida daquelas pessoas».
«Temos uma preocupação em que as pessoas vivam a liturgia porque é ela o centro da vida da Igreja e o centro da nossa vida. Que cada Eucaristia seja um momento muito feliz, que em cada celebração haja uma preparação interior e que se saia da missa e se vá feliz para casa», refere.
Antes de cada celebração há sempre a recitação do terço e as celebrações são muito participadas em vida e em número. Todos os dias às nove horas da manhã e às seis e meia da tarde, excepto à terça que é só de manhã, com exposição do Santíssimo Sacramento de seguida. «Este ano – diz-nos ainda – estamos a fazer esta nova experiência de à quinta-feira fazer uma celebração ao meio dia e meio para as pessoas que estão a trabalhar. Isto dos horários, para se fixarem demora um ano ou dois. Há outra celebração também muito importante: aos Domingos às vinte e uma horas, que é assim uma celebração inter-paroquial porque vêm pessoas de muitos sítios».
A caridade é da comunidade
Relativamente à dimensão social da Paróquia de Almada, o Padre Fernando Belo diz-nos que parte não só do Centro Paroquial mas de outras ações da comunidade. «O Centro Paroquial era pequeno. Depois cresceu para a creche e para o lar de Santiago. É um mundo onde o testemunho cristão se pode exercer. Para além disso, a outro nível, damos refeições a noventa e seis famílias e a Conferência de São Vicente de Paulo e o grupo dos doentes ajudam também com alimentos e roupas».
Nesta quaresma, a comunidade tem estado a recuperar uma vivenda devoluta onde funcionava antigamente o Centro Paroquial de forma a criar ali uma Loja Solidária. «A ideia é que as pessoas vão comprar de graça a um local onde as roupas e os alimentos estão todas arrumados e limpos. A caridade não tem um dono, é da comunidade e o objectivo é colocar todos os grupos da paróquia ali a ajudar, jovens incluídos. Comunidade deve estar disponível para ajudar os outros», explica o prior.
A ajudar nesta iniciativa estará também uma assistente social de forma a controlar um pouco quem recebe o quê, mas sem invadir demais a privacidade da pessoa. A paróquia faz ainda acompanhamento aos doentes e, nesta altura, ajuda aqueles que têm dificuldade em fazer o seu IRS.
Anabela Sousa