A presença franciscana em Setúbal é marcante e estende-se um pouco por toda a Diocese. Esta semana falámos com as Irmãs Franciscanas Missionárias de Nossa Senhora que, com uma comunidade na cidade sadina, servem nos mais diversos trabalhos de apostolado. A Irmã Fátima Soares, superiora desta comunidade, explica-nos como vivem o seu dia-a-dia.
Consta das memórias da Santa Casa da Misericórdia de Setúbal que as Irmãs Franciscanas Missionárias de Nossa Senhora têm presença na cidade do Sado desde 1887, na altura, chamadas de Irmãs Franciscanas de Calais. Em 1910, com a expulsão das ordens religiosas, a congregação foi banida do país mas, a pedido da Misericórdia e com autorização do Cardeal Cerejeira, no dia 31 de maio de 1941, estas consagradas pousaram novamente em Setúbal.
Dedicadas sobretudo à enfermagem, foram residir para aquele que é hoje o Hospital de Setúbal. «As Irmãs permaneceram lá – conta-nos a Irmã Fátima – em comunidade dentro do hospital e só depois da Revolução do 25 de Abril saíram e foram viver para uma quinta perto do hospital». Mais tarde, quando passaram a ser menos, foram viver para um apartamento e é onde a comunidade reside atualmente.
A presença das Franciscanas Missionárias de Nossa Senhora em Setúbal esteve, quase desde sempre, ligada aos serviços de enfermagem no hospital e, até há três anos atrás ainda assim era. Com a reforma da Irmã Fátima Soares, resta apenas o apoio ao serviço de capelania que é assegurado por ela, visitando também alguns doentes.
A diversidade do apostolado
Atualmente, nesta comunidade de consagradas residem quatro Irmãs. Para além da superiora, existem três outras Irmãs com os mais diversos serviços e compromissos pastorais. Entre o hospital, o despertar da fé, o ensino, o apoio social e o apoio nos lares de idosos, muitas são as solicitações feitas às Irmãs.
Uma das Irmãs está mais dedicada aos infantários da Caritas, com o despertar religioso, colaborando também com um grupo de crianças de etnia cigana, perto da Igreja de Nossa Senhora da Conceição. Apoia ainda um Movimento de Adolescentes e Crianças (MAC) presente na diocese.
A uma outras das Irmãs, o Bispo de Setúbal, D. Gilberto Canavarro dos Reis, pediu que desse apoio ao colégio diocesano Sebastião da Gama. No entanto, o apostolado não se esgota aí e, no ATL da Caritas, apoia também crianças que têm dificuldade na aprendizagem.
Já a superiora, responsável da comunidade, para além da capelania do hospital, dá catequese em São Sebastião e nas Praias do Sado, e ajuda um Centro de Apoio à Vida da Caritas chamado «Pequena, Grande Mãe», em que as jovens que engravidam e querem prosseguir com a gravidez, têm disponível uma psicóloga e uma assistente social que as orienta.
A outra Irmã, a que está há menos tempo na comunidade, e também a pedido do Bispo de Setúbal, colabora com o Padre Manuel Soares, atual capelão da Misericórdia, no apoio aos quatro lares da Santa Casa.
Receber para dar
«O nosso dia-a-dia é muito preenchido – sublinha a Irmã Fátima Soares – mas temos que nos encher e, por isso, todos os dias de manhã temos um tempo de oração pessoal, oração de laudes e Eucaristia. À tarde temos vésperas e, antes de nos deitarmos, temos oração de completas».
Mesmo no meio das tarefas, primeiro as Irmãs colocam a sua vida comunitária e só depois é que ajustam os horários fora da comunidade. «Nós, para dar temos que receber», afirma a Irmã Fátima. Têm ainda, à quinta-feira, o Santíssimo Sacramento exposto, na sua capela pessoal, durante uma hora e meia. «Escolhemos a quinta-feira porque que é o dia dedicado ao sacerdócio e temos que rezar pelos nossos sacerdotes», diz.
Dar-se sem medida
A espiritualidade das Irmãs Franciscanas Missionárias de Nossa Senhora é a espiritualidade da Família Franciscana, ou seja, vivem o Evangelho de Jesus Cristo à maneira de Francisco de Assis.
Explica-nos a responsável da comunidade de Setúbal que todo o carisma da congregação se resume na seguinte frase: «Nós estamos onde a nossa presença pode ser uma ajuda». Assim, seja na enfermagem, nos idosos, nas crianças carenciadas, onde quer que possam ajudar, as Irmãs estão presentes.
Apesar da crise de vocações que, um pouco por toda a Europa se vive atualmente, existe uma rapariga, originária da Baixa da Banheira, que está em formação. Espalhadas por dez dioceses de Portugal, com cerca de trezentas consagradas, as Franciscanas Missionárias de Nossa Senhora têm também presença no resto da Europa, na Ásia, em África e na América. São mais de cem fraternidades e cerca de setecentas Irmãs.
Neste ano dedicado à vida consagrada a Irmã Fátima Soares diz que a comunidade procura viver, mais intensamente, através da oração, o darem-se sem medida. «É isso que temos tentado viver durante este ano. Por outro lado, todos as consagradas têm o desafio de se darem e serem o rosto alegre da Igreja para que as pessoas vejam e digam ‘vale a pena’, e então apostarem num modo de vida assim», afirma.
Servir também nas dificuldades
No que diz respeito a dificuldades que vivem no seu apostolado, a Irmã Fátima diz que é sobretudo na catequese que se denota a falta de conhecimento de tudo o que diz respeito à vida da Igreja, por parte das famílias.
«Com o nosso apostolado não há problema – afirma – onde estamos ao serviço até nos pedem coisas que nós às vezes não conseguimos fazer. Se pudéssemos, até nos pediam mais. Nós é que dizemos que não, porque não temos disponibilidade». Muito solicitadas para os diversos serviços pastorais, que são muitas vezes territorialmente dispersos, as Irmãs teriam dificuldades de deslocação se uma das consagradas atualmente ali residente não conduzisse. «Foi uma graça a Irmã que veio residir agora connosco e que pode conduzir o carro que temos», indica.
Com uma inspiração trinitária muito forte e uma espiritualidade de comunhão, que tem a sua fonte na contemplação de Jesus Cristo incarnado, pobre e crucificado, e na Eucaristia, mistério de unidade e de comunhão, as Irmãs Franciscanas Missionárias de Nossa Senhora alicerçam-se na vida fraterna que é a força que sustenta a sua missão. É também na fraternidade que, por sua vez, a missão tem a sua fonte e o seu dinamismo.
Os primórdios da presença em Portugal
Quando as Irmãs Franciscanas de Calais, designadas, a partir de 1965, por Franciscanas Missionárias de Nossa Senhora estabeleceram, em 1868, os primeiros contactos com Portugal, já o seu Instituto se afirmava como uma Congregação de Franciscanas Terceiras mais austeras, mas simultaneamente, mais pujantes, de toda a França, pronta a alargar a sua ação a outros países da Europa e sonhando já com as missões, que um pouco mais tarde vão estabelecer em África e na Ásia.
A primeira casa que as Franciscanas de Calais fundaram em Portugal foi em Ílhavo. Em 1876, quatro Irmãs, duas portuguesas e duas francesas, abriram o Asilo-Colégio de Nossa Senhora do Pranto, em homenagem à Senhora Padroeira dos Pescadores, onda era ministrada educação gratuita a meninas, especialmente, a filhas de pescadores, e um infantário para crianças de ambos os sexos, com menos de três anos de idade.
As religiosas dedicavam-se ainda aos cuidados dos pobres, à assistência a pacientes no domicílio e ao serviço de culto. Aqui se mantiveram até 1910, data da expulsão das religiosas, consequência da implantação da República.
Anabela Sousa