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Ser de Deus e viver unida a Ele

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Continuando a dar a conhecer as realidades de vida consagrada presentes na Diocese de Setúbal, chegamos esta semana à Ordem das Virgens. Fala-nos a Irmã Maria João Alves, a única consagrada da diocese, nesta Ordem, que nos explica qual o carisma desta congregação e como vive, esta vocação, no seu dia-a-dia.

Vivem no seio familiar, com a sua atividade apostólica na comunidade cristã, têm a sua vida profissional mas, em ligação com o Bispo diocesano, dedicam a sua vida, na vivência do seu celibato, a Deus e à missão da Igreja no mundo. É uma vocação de especial consagração, com características diferentes da maioria das congregações que, habitualmente, vivem em comunidade.

«As Virgens consagradas são mulheres que percebem na sua virgindade um dom de Deus sobre o qual repousa um desígnio – explica a Irmã Maria João – Percebem a eleição amorosa que Jesus faz delas e, em resposta, entregam-se a Ele num amor total e esponsal. É este o carisma, à imagem da Igreja-Esposa que ‘unida a Deus, espera e apressa a Sua vinda’ e que é fonte de maternidade espiritual sobre as almas».

O que fazem, enquanto trabalho profissional ou pastoral, refere ainda a Irmã Maria João, vem pelas circunstâncias da vida, não sendo aquilo que fazem, o que as define mas o que são: ser de Deus e viver unidas a Ele.

Por enquanto, na diocese, a Irmã Maria João é a única consagrada na Ordem das Virgens. Em Portugal são vinte e uma e, no mundo, mais de duas mil. Indica ainda a Irmã que as vocações a esta Ordem são de mulheres de idades mais maduras e com estabilidade profissional.

«Acredito que há pessoas chamadas por Jesus, que O meditam no segredo do seu coração – afirma – Uma coisa é certa, como para receber esta consagração, que é pública e definitiva, a mulher deve ter atingido uma certa maturidade humana e espiritual, e ter a possibilidade de assumir materialmente a sua vida, as vocações são sempre de pessoas de idades já “compostas”, digamos».

 

O apelo à vida consagrada e a preparação para a consagração

 

No caso da Irmã Maria João, conta que se recorda de ter um primeiro apelo para a vida consagrada aos cinco anos de idade. «Eu frequentava o jardim-de-infância da paróquia de Almada, entregue a umas religiosas italianas. Uma Irmã, Arminda, brincava muito connosco no recreio, era muito alegre e viva, e pensei ‘quando for grande quero ser como ela’».

Aos vinte anos de idade, diz ainda, as questões do sentido da vida e de entrar no projeto de Deus a seu respeito levaram-na a falar de vocação com padres e pessoas consagradas. Nesse sentido, e já depois de concluída a licenciatura em Psicologia, fez um ano de formação para a vida espiritual, litúrgica e de oração, como meio de aprofundar uma procura.

«Fui fazer esse ano sabático numa comunidade francesa – indica – e depois entrei uma vida missionária ao serviço da evangelização, andando pelo estrangeiro. Regressei a Portugal em 2001 e, dois anos, depois recebi pelas mãos do nosso Bispo, D. Gilberto Canavarro dos Reis, a consagração na Ordem das Virgens».

Este tempo de estudo e missão de evangelização, acabou por ser a preparação da Irmã Maria João para a sua consagração: «Fui vivendo desta grande ‘reserva de graças’, e fui aprofundando a vocação através de encontros internacionais e retiros com outras Virgens Consagradas». Habitualmente a preparação é pensada caso a caso, conversando o Bispo com a candidata e decidindo conjuntamente. É sempre aconselhado à candidata ter um diretor espiritual.

 

A vocação no quotidiano

 

No seu dia-a-dia, esta consagrada na Ordem das Virgens reside com um dos seus irmãos que é padre diocesano. «Partilhamos a nossa vida quotidiana de pertença ao Senhor e ao Seu serviço. Ele é pároco e eu ajudo-o naquilo que esteja ao meu alcance, desde as tarefas domésticas, à catequese de crianças e adultos, assistência a peregrinações, entre outras atividades», explica.

Trabalha ainda no ‘Despertar da Fé’ e noutros serviços pastorais para os quais é solicitada, desde pregações temáticas a formações de catequistas. Colabora, ainda, com Centros Sociais Paroquiais, dando formações em Cultura Cristã a educadoras e auxiliares de educação, bem como aos funcionários de outros serviços.

«Este é um serviço muito interessante, em estreita relação com os párocos, na visão que têm acerca dos serviços de excelência que desejam para os Centros ligados à sua Paróquia. Para além disto, exerço também a minha profissão de psicóloga, em clínica privada, sobretudo com crianças e famílias», sublinha.

 

Da pureza das crianças ao comodismo religioso

 

Quando questionada sobre as maiores alegrias que vive no seu quotidiano, a Irmã Maria João afirma perentoriamente que são as crianças: «A sua abertura e confiança na relação que têm comigo, a sua pureza e adesão à realidade são ensinamentos para mim, para me tornar mais como elas. As crianças não vivem no futuro e por isso se alegram tanto com o presente. Mesmo quando sofrem, não pensam que logo ou amanhã poderão sofrer igual ou pior. Por isso, também quando sofrem aderem ao real e se alguém as faz rir sabem ultrapassar bem melhor do que nós a sua dor».

Já no que se refere às dificuldades, a Irmã Maria João aponta duas. Por um lado, a consciência do comodismo religioso que diz toca a todos não querem ser incomodados pelos apelos de Jesus: «Como rãs colocadas numa panela com água que vai aquecendo lentamente, não damos conta do aumento da temperatura e perdemos a reação do salto que nos salvaria. Por vezes, são os grandes e súbitos sofrimentos que nos fazem saltar, ou melhor, aderir ao sentido profundo da nossa existência. E Jesus está sempre ali, misericordioso, para nos acolher no seu colo e nos salvar».

Por outro lado, e a unificação da sua vida que passa pelo trabalho, pela pastoral e pela oração: «Esta é de longe a dificuldade maior. É na profundidade de presença, a cada instante, em todas as realidades, que isso se alcança».

De salientar, sobre a congregação, que na Ordem das Virgens, são consagradas a Deus pelo bispo diocesano, as mulheres que celebram «desposórios místicos com Jesus Cristo, Filho de Deus, e se entregam ao serviço da Igreja» em diferentes encargos pastorais. A Ordem, ainda que exista desde os primórdios do cristianismo, foi restaurada pelo Concílio Vaticano II, e está contemplada pelo Código de Direito Canónico de 1983.

 

Anabela Sousa

 

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20 de Abril de 2015