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Procissão do Corpo de Deus: “A Eucaristia abre-se para o mundo e dá-lhe sentido”

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No passado dia 31 de maio, a Igreja celebrou a Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue do Senhor. Depois da celebração Eucarística na Sé de Setúbal, onde o Bispo diocesano, D. José Ornelas, instituiu novos Ministros Extraordinários da Comunhão, a tarde foi de procissão pelas ruas da cidade sadina, da Sé até à Igreja de São Julião, depois de ter sido rezada a oração de vésperas.

Leia, em seguida, a alocução de D. José Ornelas no final da Procissão e veja todas as fotografias.


Alocução de D. José Ornelas no final da Procissão do Corpo de Deus 2018

Festa da Unidade, compromisso de solidariedade

Caminhar com Cristo-Eucaristia, no meio da cidade

Tendo terminado o tempo da Páscoa, celebramos hoje, com especial relevo, o mistério central da vida da comunidade cristã: a Eucaristia. As leituras que escutámos esta manhã falam da Eucaristia como Aliança, apresentando-a como festa de unidade e de compromisso solidário.

Reunimo-nos na Igreja, esta manhã, em sinal de união à volta da Palavra de Deus e da sua presença viva e atuante no Pão e no vinho, Corpo e Sangue de Jesus.

Agora saímos para a cidade, para as nossas ruas e praças, pois a fé e a Eucaristia, não são um refúgio cómodo e medroso de um grupo de crentes separado da realidade. A Eucaristia abre-se para o mundo concreto e dá-lhe sentido. Dessa celebração nasce uma Igreja em saída, a Igreja peregrina; a Igreja missionária.

Unidade aberta ao mundo

A procissão de hoje é pelas ruas de Setúbal, mas estende-se a todas as nossas cidades, vilas, bairros, instituições e famílias. É expressão da nossa Igreja diocesana, na variedade das suas paróquias, na diversidade das raças e culturas que a compõem, no acolhimento de cada pessoa na situação em que se encontra e na gradualidade de sua adesão pessoal e familiar; na oferta de recuperação dos que caíram e precisam de mãos estendidas para levantar e abraçar.

É de Jesus que recebemos esta unidade dinâmica e aberta da Eucaristia: A Igreja não é uma elite de perfeitos, mas uma comunidade que convida sempre à perfeição, à santidade de Deus, que vem à procura de todos, a começar pelos pecadores. A Eucaristia não é para os perfeitos, mas para os pecadores. Jesus celebrou a primeira Eucaristia com os discípulos que tinham dificuldade de entender o seu projeto, que falharam na hora de afirmar a fé e o compromisso, que o negaram e abandonaram. Ele oferece a mão que levanta os que caem e estão à beira da estrada; que anuncia boas novas aos pobres e aos que têm fome e sede de justiça, que reabilita os que o mundo condena, que acolhe no seu Reino o ladrão arrependido à última hora.

Também não somos uma Igreja que tolera tudo, como se tudo fosse indiferente, mas queremos ser hospital para os enfermos, alento para os que sofrem. Mesmo quando a vida parece não ter sentido, continuamos a recusar a desistência e a morte – nas diferentes formas de eutanásia – e a afirmar o apoio, a proximidade que conforta, acolhe e ajuda. É assim que procuramos, pessoalmente e nas instituições que se foram criando, proporcionar alento e manifestar a solicitude do bom samaritano para todos os que sofrem e são discriminados.

Hoje, trazemos para a cidade (e as cidades de que fazemos parte) esse Jesus que nos propõe uma atitude de fé aberta, que não se fecha nas suas certezas e na sua verdade, mas que a expõe com coragem e franqueza; que a afirma com compreensão e convicção; que dialoga com a diferença e mesmo a oposição; que não cessa de propor aquilo que é fundamental para a vida do mundo.

A nossa procissão quer afirmar a presença eucarística de Jesus que nos dá esse sentido de unidade aberta, de fé capaz de crescer e de se afirmar, para construir com todos os outros uma cidade justa, acolhedora, cuidadora da diferença e da debilidade, sem excluir ninguém.

Afirmação de compromisso solidário

O segundo aspeto importante que a Eucaristia nos apresenta hoje é o do compromisso na criação de uma sociedade justa e solidária: um sonho de pessoas que se abrem à totalidade da vida, nesta terra e para além dela.

A Eucaristia é o memorial do dom de Jesus até à oferta da própria vida, mesmo através do sofrimento e da morte. Comer o seu Corpo e beber o seu Sangue é acolher este dom precioso de Deus que abre portas novas à existência, para o mundo da vida que não acaba, onde se encontra o Senhor ressuscitado. Mas é também o assumir o mesmo compromisso de Jesus, de lutar, desde agora, para criar condições de vida para todos, de repartir o pão que Ele nos dá, pelos famintos de toda a espécie, de afirmar a dignidade e o direito de todos de se sentarem à mesa da humanidade.

Isto não se faz com o recurso à violência, à força e à guerra. A Eucaristia, como memorial da morte de Jesus significa precisamente a recusa da violência, da imposição fanática do próprio pensar ou acreditar ou como meio de obter justiça e direito. Por outro lado, como diz Paulo, a Eucaristia é denúncia da injustiça, do açambarcamento corrupto dos bens que cria miséria; da indiferença dos que estão saciados em relação aos que buscam condições de vida; do comodismo egoísta que não olha à sua volta para não sofrer.

O dinamismo da Eucaristia é de compromisso pessoal e comunitário. Jesus oferece o seu Corpo para a vida do mundo. Comer o seu Corpo e beber o seu Sangue significa assumir uma atitude ativa de dom, de solidariedade, de cuidar das debilidades, de ser agente desse mundo novo, na família, na Igreja, na escola, no trabalho, na política e a economia. A lógica da Eucaristia como dom e participação, não pode ser de abstenção em tudo o que diz respeito à vida dos que nos rodeiam. Esse compromisso começa em cada um/a de nós, mas não resulta se não convergirmos, em família, nas nossas comunidades, na Igreja, também com todos os outros de boa vontade. A criação do mundo justo e fraterno precisa dessa atitude ativa, participativa e solidária.

Mas nunca esquecemos que Jesus nos ensina na Eucaristia que a vida não se limita simplesmente a esta terra. Nós colaboramos na construção de uma cidade que começa aqui, mas que se abre a horizontes mais vastos. Sonhamos uma comunidade de pessoas que não se alienam da terra para pensar no céu, mas que também não se alienam na terra sem perspetivas de vida em novos horizontes. O Senhor da Eucaristia é o Senhor ressuscitado, que nos ensina o compromisso nesta terra e nos convida para a plenitude da existência onde Ele se encontra.

É esse Senhor que nos seguimos, nesta procissão e na vida, construindo a cidade da terra a caminho da cidade definitiva.

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01 de Junho de 2018