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Em memória de D. Maurílio de Gouveia

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Deixou-nos hoje, para as mãos do Pai do Céu, D. Maurílio de Gouveia, arcebispo emérito de Évora. Tive com D. Maurílio um relacionamento muito amigo e paternal-filial, não só pelo dom do sacerdócio que recebi pela imposição das suas mãos, mas também por uma amizade surgida, desde quando era eu ainda menino e ele jovem padre, professor no seminário do Funchal.

Tive a alegria de celebrar com ele a Eucaristia no verão passado, no aniversário da minha ordenação, quando já se encontrava muito fragilizado pela doença. Acolheu-me com um sorriso alegre, que manifestava um ar cansado, mas retomava fôlego para indicar alguns livros e pastas dizendo. “Olha, Zé, estou a preparar-me para a grande viagem! Estou tranquilo e nas mãos de Deus”. No último encontro com ele, há um mês, numa voz muito mais sumida, repetiu a mesma mensagem e, no fim, despediu-se com um: “Até ao céu!”.

D. Maurílio foi um dos bispos nomeados pelo papa Paulo VI, após o 25 de Abril, entre os quais se incluem, D. Manuel Martins, D. Manuel Falcão, D. José Policarpo e outros, que deram um novo rosto ao catolicismo no nosso país, relançaram pontes e diálogo com o Portugal democrático, apostaram numa Igreja promotora da ação dos leigos e aberta particularmente aos que mais precisam. Muito lhes devemos, não só a Igreja católica, mas todo o país. Bem hajam!

No meu último encontro com D. Maurílio, deu-me um pequeno livrinho, uma espécie de memórias finais, dizia ele, mas que se abrem a novos mundos, digo eu. É daí que transcrevo, com o sentir de uma dor que se abre a uma grande paz, as palavras iniciais, que revelam o fundamento desta vida fecunda de inteligência, bondade, paixão e fé:

Quando se atinge uma idade avançada, os olhos estão mais postos no Além do que neste mundo passageiro. É a ordem natural das coisas. Como acontece com a água do rio, que incessantemente corre para o mar, assim a nossa vida se vai aproximando cada vez mais do Oceano… É o tempo da aproximação. O Céu está próximo.”

Caro D. Maurílio, bom Pai e amigo, bem haja pelo seu percurso de homem de bem, de cristão convicto, de padre dedicado, de pastor acolhedor e providente, de amigo e companheiro de tantos nesta terra. E que o nosso próximo encontro seja: “Até ao céu!”

+ José Ornelas Carvalho
Bispo de Setúbal


Igreja/Portugal: Faleceu D. Maurílio de Gouveia, arcebispo emérito de Évora

Funchal, Madeira, 19 mar 2019 (Ecclesia) – D. Maurílio de Gouveia, arcebispo emérito de Évora, faleceu hoje aos 86 anos de idade, na Madeira, anunciou a diocese local.

“A Diocese do Funchal manifesta o seu pesar pelo falecimento do arcebispo emérito de Évora, D. Maurílio de Gouveia, neste dia da festa de São José”, refere a nota divulgada pelos serviços diocesanos de comunicação, na Madeira.

O antigo arcebispo encontrava-se no Eremitério de Maria Serena, em Gaula (Concelho de Santa Cruz), onde morreu na sequência de doença prolongada.

As celebrações fúnebres decorrem na quinta-feira de manhã, a partir das 07h30, na Sé do Funchal, onde será recitado o Ofício de Defuntos e celebrada Missa de Corpo Presente, às 08h30; pelas 11h00, a urna parte desde o aeroporto da Madeira rumo à Basílica Metropolitana de Évora.

Já na arquidiocese alentejana, decorre, pelas 19h00, o acolhimento na Catedral de Évora, seguindo-se a recitação de Vésperas e a Eucaristia.

Esta sexta-feira, depois da oração das Laudes, pelas 10h00, decorre a Missa exequial, presidida às 15h00, pelo arcebispo de Évora, D. Francisco Senra Coelho; o cortejo fúnebre segue para a Igreja do Espírito Santo em Évora, onde decorrerá a encomendação e a sepultura dos restos mortais de D. Maurílio de Gouveia, no Panteão dos Arcebispos.

D. Maurílio Jorge Quintal de Gouveia, filho de Aires Romão Freitas Gouveia e de Matilde Maria Quintal de Gouveia, nasceu a 5 de agosto de 1932 em Santa Luzia, no Funchal; cumpriu a sua etapa vocacional no Seminário Diocesano do Funchal e foi ordenado sacerdote a 4 de junho de 1955.

Aos 22 anos seguiu para Roma, para prosseguir os seus estudos, e formou-se em Teologia Dogmática na Pontifícia Universidade Gregoriana, tendo tirado também uma pós-graduação em Teologia Pastoral, na Pontifícia Universidade Lateranense.

Após este período, regressou à Madeira para exercer várias missões pastorais, como a de vice-reitor do Seminário do Funchal e professor de Teologia na mesma instituição.

A 26 de novembro de 1973, aos 41 anos, D. Maurílio de Gouveia recebeu a sua nomeação episcopal, como bispo titular de Sabiona e bispo auxiliar de Lisboa, através do Papa Paulo VI.

A ordenação episcopal de D. Maurílio de Gouveia foi celebrada pelo então cardeal-patriarca de Lisboa, D. António Ribeiro, a 13 de janeiro de 1974.

Quatro anos mais tarde, a 21 de maio de 1978, o bispo madeirense foi nomeado arcebispo titular de Mitilene, e a 17 de outubro de 1981, aos 49 anos de idade, chegou para D. Maurílio de Gouveia a nomeação como arcebispo de Évora, por intermédio do Papa João Paulo II, sucedendo a D. Frei David de Sousa.

A tomada de posse de D. Maurílio de Gouveia como arcebispo de Évora aconteceria três meses mais tarde, a 8 de dezembro de 1981, no dia da festa da Imaculada Conceição da Virgem Santa Maria, padroeira principal de Portugal e da Arquidiocese de Évora.

Ao longo dos 26 anos em que tomou conta dos destinos da arquidiocese alentejana, D. Maurílio de Gouveia destacou-se pelo empenho pastoral, assumindo como pioneiro num trabalho de proximidade com as comunidades católicas locais.

“Como estive no terreno, conheci as pessoas, entrei nas suas casas, visitei escolas e fábricas e pude experimentar bem a alma alentejana”, destacava D. Maurílio de Gouveia.

Em 2007, por ter atingidos os 75 anos, idade limite para o desempenho da missão episcopal, segundo a lei canónica, D. Maurílio de Gouveia apresentou ao então Papa Bento XVI a sua resignação ao cargo de arcebispo de Évora.

A 8 de janeiro foi anunciado o nome do novo arcebispo de Évora, D. José Alves, com D. Maurílio de Gouveia a assumir o cargo de Administrador Apostólico até à tomada de posse do seu sucessor, que viria a acontecer a 17 de fevereiro de 2008.

“Sinto-me muito feliz por tudo aquilo que pude viver aqui nestes 26 anos. Foi uma experiência muito gratificante. Estou muito grato a Deus por tudo aquilo que pude viver nestes anos, sobretudo pela amizade que se estabeleceu com todas as populações, famílias e pessoas individualmente”, destaca também na hora de deixar o cargo.

Os seus últimos anos, já com uma saúde muito debilitada, foram passados na terra natal, no Funchal; do seu percurso constam também cargos como os de presidente das Comissões Episcopais para o Apostolado dos Leigos e para as Comunicações Sociais.

A sua veia para a comunicação, que demonstrou de forma mais evidente ao longo do seu trabalho na Arquidiocese de Évora, ficou também expressa na sua ligação a projetos como o Jornal da Madeira, do qual foi diretor; e à criação literária.

Entre a sua obra bibliográfica estão livros como ‘Cristãos Exemplares’, ‘Eu sou o Pão da Vida’, ‘O Eremitério Maria Serena’, ‘Uma Comunidade de Cristãos – A Paróquia na Missão da Igreja’, ‘Magnificat’ e ‘Rumo ao Céu’, esta última já uma coletânea de pensamentos do arcebispo emérito reunida pelo cónego Cardoso de Melo.

Ainda no campo literário, e do legado deixado por D. Maurílio de Gouveia, inclui-se a obra ‘Concílio, Diocese e Evangelização’, apresentada no âmbito dos 50 anos de sacerdócio do arcebispo emérito, em 2005, com uma entrevista conduzida pelo então sacerdote e professor de História da Igreja no Instituto Superior de Teologia de Évora, D. Francisco José Senra Coelho, atual arcebispo de Évora.

Agência Ecclesia

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19 de Março de 2019