Reflexão do Padre António Sílvio Couto, Pároco da Moita
Com data de 29 de junho passado, foi tornada pública, em Roma, uma Instrução da Congregação para o Clero, intitulada: «A conversão pastoral da comunidade paroquial a serviço da missão evangelizadora da Igreja».
Em cento e vinte e quatro números, divididos em dez temas (ainda subdivididos) fazem-se algumas observações sobre a temática da paróquia. Dada a extensão do assunto e a complexidade das questões, iremos debruçar-nos sobre estes temas nos próximos tempos.
Agora restringimos a atenção aos assuntos dois e três, respetivamente, “a paróquia no contexto contemporâneo” (n. os 6 a 10) e “o valor da paróquia hoje” (n.os 11 a 15).
– “Casa no meio das casas” é a origem etimológica de “paróquia” e isso definiu, desde a origem esta forma de tornar os cristãos presentes no mundo, onde o “edifício de culto é presença permanente do Senhor Ressuscitado no meio do seu povo” (n.º 7). Esta proximidade fazia da paróquia local e espaço de anúncio da fé e da celebração dos sacramentos.
– A mudança da configuração territorial da paróquia confronta-se, hoje, com “a crescente mobilidade e a cultura do digital”, nisso que é chamado de “território global e plural”. Efetivamente, esta cultura em mudança manifesta-se na “rapidez das alterações, a mudança dos modelos culturais, a facilidade para os deslocamentos e a velocidade da comunicação estão transformando a percepção do espaço e do tempo” (n.º 8).
– Da conotação territorial estamos, hoje, numa outra de “paróquia como comunidade de fiéis”, acentuando a dinâmica da pertença em múltiplas facetas: sociais, profissionais, culturais e até emocionais, “num mundo virtual sem compromisso nem responsabilidade com o próprio contexto relacional” (n.º 9). Se isto traz transtornos a algumas mentes também abre novas perspetivas, sendo ‘urgente envolver todo o Povo de Deus’ neste rejuvenescimento do rosto da Igreja (n.º 10).
– “A paróquia é chamada a acolher as instâncias do tempo para adequar o próprio serviço às exigências dos fiéis e das alterações históricas” (n.º 11), deixando a etapa de cristandade massifccada à vivência da vocação de cada batizado, que seja discípulo de Jesus e missionário onde quer que se encontre.
– Os três últimos Papas (n.º 12) foram dando a sua interpretação de mudança do conceito e da necessidade do ser e do estar em paróquia: organismo indispensável e base de toda a pastoral (João Paulo II), farol que irradia e luz e vai ao encontro (Bento XVI), incentiva e forma agentes da evangelização (Francisco).
– Dando “centralidade à presença missionária da comunidade cristã no mundo” (n.º 13), a paróquia deve mostrar o rosto de uma comunidade evangelizadora.
– Lendo os sinais dos tempos, a paróquia é “chamada a encontrar outras modalidades de vizinhança e de proximidade” (n.º 14).
– “A comunidade cristã não deve ter medo de iniciar e acompanhar processos dentro de um território onde vivem diferentes culturas” (n.º 15), na diversidade e na abertura a todos e com todos.
Observações
a) A alteração/mudança da configuração da igreja-templo, destacando-se entre o casario da aldeia para a normalidade com outros edifícios exige uma aferição ao tempo onde a Igreja caminha com os outros homens, despojada, sincera e serva;
b) A perceção da mobilidade, fazendo cada um de nós uma itinerância de aprendizagem, tentando saber estar com os outros e não aferrando a que os outros é que têm de aprender a lidar com a diferença;
c) Um tempo de paróquia mais como instância de diálogo e menos como telónio de certezas inamovíveis, de portas abertas e braços estendidos a quem procura…para ser aconchego e lar seguro;
d) Lugar de sensibilidade às tecnologias novas (digitais e afins), mas que não se deixa virtualizar com clichés estereotipados e ocasionais…sem maturidade de caminho de conversão;
f) Instância que vai à procura – “em saída” – entendendo os que saíram, sem os acusar por se quedarem na religião de sofá/pantufas, confinados aos receios e medrosos nos anseios…
Ainda seremos paróquia com Jesus? Ainda temos espaço para Ele? Gostamos da nossa paróquia-família?
Padre António Sílvio Couto, Pároco da Moita
Este artigo é o primeiro de uma reflexão sobre a nova Instrução da Congregação para o Clero “A conversão pastoral da comunidade paroquial a serviço da missa evangelizadora da Igreja.”
Reflexão: “Para uma paróquia inclusiva, evangelizada e evangelizadora”