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D. Manuel Martins: D. José Ornelas evoca exemplo de fidelidade e de compromisso com os mais excluídos em homenagem na Sé de Setúbal

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Diocese de Setúbal e Município sadino homenagearam o primeiro bispo diocesano, com inauguração de estátua, no seu 45.º aniversário de ordenação episcopal.

O Bispo de Setúbal evocou esta segunda-feira a figura de D. Manuel Martins como exemplo para a Igreja Católica e a sociedade, destacando a sua “atenção e compromisso com os que mais precisavam” e a sensibilidade de “intervenção social”.

“D. Manuel permanecerá sempre como um bispo à imagem de Cristo, dedicado à Igreja, a esta Igreja, e aberto à cidade, às cidades e à sociedade desta Península de Setúbal”, disse D. José Ornelas, na homilia da Missa que assinalou os 45 anos de ordenação episcopal do primeiro bispo da diocese sadina.O Bispo de Setúbal evocou esta segunda-feira a figura de D. Manuel Martins como exemplo para a Igreja Católica e a sociedade, destacando a sua “atenção e compromisso com os que mais precisavam” e a sensibilidade de “intervenção social”.

 

A celebração, na Catedral de Setúbal, antecedeu a inauguração de uma estátua de D. Manuel Martins, no Largo da Catedral, iniciativa que uniu a Igreja Católica e o Município local.

O também presidente da Conferência Episcopal Portuguesa recordou um bispo “fiel a Deus e, por isso mesmo, fiel ao seu povo”, atento aos “oprimidos, feridos de miséria, de exclusão, discriminação, de falta de dignidade e esperança”.

D. José Ornelas assinalou que o primeiro bispo de Setúbal, ordenado em 1975, soube estar próximo dos “pobres de pão, de educação, de carinho, de vida”, os que não puderam colaborar “na construção de um mundo mais fraterno”.

A escultura de D. Manuel Martins

A escultura, da autoria da escultora Maria José Brito, observou o responsável católico, é um sinal de gratidão para com “alguém que encarnou e contribuiu para forjar a rica identidade” de Setúbal e do seu povo, em particular na segunda metade da década de 70 do século passado.

A peça escultórica, com perto de dois metros de altura e assente no chão, mostra D. Manuel Martins, de braços abertos e defronte para as ruas.

“A figura devia estar próxima o seu povo. Razão pela qual a estátua vem abertamente para a rua” explica a escultora mencionando que a imagem localiza-se como se “saísse da Igreja (catedral) e “avança, firme nas convicções, de braços abertos para receber, sobre uma estrada que se alarga para a cidade”.

 

Maria José Brito refere ainda que a opção foi caracterizar o prelado “sem vestes de cerimónia” mas “paramentado em consonância com a sua posição na hierarquia da Igreja”.

D. José Ornelas agradeceu à autora da peça que visa pelo trabalho realizado que tem como objetivo “perpetuar a memória” do primeiro bispo da diocese sadina.

A estátua foi colocada diante da Catedral e na Praça da cidade, evocando simbolicamente um “bispo no meio do povo”, explicou o bispo diocesano, e representando simbolicamente uma atitude de “acolhimento e de saída”.

Na inauguração da estátua, Maria das Dores Meira, presidente da Câmara Municipal de Setúbal, disse aos presentes que esta era uma “homenagem devida” a D. Manuel Martins, por parte de uma cidade que ele “soube ver e ouvir”.

A autarca evocou o falecido bispo como um “homem generoso e sempre disponível para ajudar os que mais precisavam” e estavam “mais esquecidos”.

 

“Foi naquelas ruas que podem parecer periféricas, de bairros que alguns pensam não ser importantes, que o nosso bispo se movimentou. Foi naquelas zonas distantes do centro e dos poderes, distantes da vista, que ele mais se fez e que foi o homem que hoje recordamos” refere a presidente do executivo.

Maria das Dores Meira recordou aqueles que o criticavam como “bispo vermelho”, sublinhando que o primeiro bispo de Setúbal esteve “do lado certo da história”, na luta “contra a desigualdade, contra as misérias”.

A celebração contou com a presença de D. Américo Aguiar, bispo-auxiliar de Lisboa, em representação do Patriarcado do qual nasceu a diocese sadina, o Secretário de Estado da Educação João Costa, o presidente da Cáritas Portuguesa Eugénio Fonseca, sacerdotes e diáconos da Diocese, autarcas, representantes das estruturas diocesanas e movimentos, bem como elementos de algumas comunidades paroquiais.

A Eucaristia foi animada pelo Coro Luísa Todi e a cerimónia de inauguração da estátua contou com um apontamento musical do jovem Miguel Rangel, aluno do Conservatório Regional de Setúbal.

JM e Agência Ecclesia

 

Homilia de D. José Ornelas: Memória grata e inspiradora

Reúne-nos hoje, aqui, a memória do D. Manuel da Silva Martins, ordenado nesta Igreja, há 45 anos como primeiro bispo da Diocese de Setúbal.

Esta celebração, com a inauguração da estátua que o município de Setúbal lhe dedica e que ficará colocada à entrada da Sé, representa a gratidão e a vontade da cidade e da comunidade cristã que dela faz parte, em conservar a memória do Dom Manuel, não apenas como seu primeiro Bispo, mas igualmente como alguém que encarnou e contribuiu para forjar a rica identidade desta cidade e do povo, num tempo de profunda  mudança e enormes desafios para esta terra e para todo o país, em 1975.

A primeira leitura da Palavra de Deus que proclamámos hoje nesta assembleia (Hb 13,7-18), fala-nos precisamente dessa memória atualizadora que a comunidade cristã faz das pessoas e dos eventos que marcam a sua peregrinação e função na vida e na história: “Recordai-vos daqueles que vos guiaram e vos pregaram a palavra de Deus”. A memória daqueles que se distinguem deste modo, na vivência, no testemunho e no anúncio da Palavra de Deus, ajuda a formar a identidade de cada comunidade, e do ambiente onde se empenham.

É evidente que determinante para a Igreja é a pessoa de Jesus, homem connosco e Filho de Deus, que marca toda a Igreja e para todos os tempos. É Ele que constitui a fonte de identificação e modelo de atitudes e afirma: “Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração” (Mt 11,29).

Mas, em cada célula da Igreja, em cada Igreja local como a nossa e em cada tempo, outras pessoas vão marcando o tempo com o seu modo de exprimir a presença de Deus, a quem dedicaram a vida. Dom Manuel permanecerá sempre como um Bispo à imagem de Cristo, dedicado à Igreja e aberto à cidade – às cidades e à sociedade desta península de Setúbal – com especial atenção e compromisso com os que mais precisavam.

É nesse sentido que o autor da carta os Hebreus recomenda: “observai o êxito da sua conduta e imitai a sua fé”. Fazer memória daqueles que nos precederam não é simplesmente uma recordação mais ou menos agradável. É um ato de formação identitária e de compromisso, como pessoas e como sociedade. Contribui para modelar a nossa própria identidade como comunidade cristã e como povo, e a exprimi-la em atitudes e gestos concretos. É nesse sentido que celebramos hoje a memória de Dom Manuel e colocamos a sua imagem diante da catedral e na praça da cidade.

 

A memória do primeiro bispo

E esta memória tem para nós um significado especial, na medida em que Dom Manuel foi – e será sempre – para nós, o primeiro Bispo. E não apenas para os cristãos, mas para todo o povo desta península. Foi por essa razão (para exercer a função de Bispo, para a qual fora nomeado), que ele, oriundo da Diocese do Porto, veio para cá e, como ele mesmo diz: “Nasci Bispo em Setúbal, agora, sou de Setúbal. Aqui anunciarei o Evangelho da libertação, na justiça e no amor. Aqui proclamarei Cristo vivo – que veio e está no meio de nós – o único que pode alicerçar na fraternidade a sociedade justa que é a aspiração angustiante de todos nós”. Estas foram palavras pronunciadas nesta catedral, no dia da sua ordenação, há 45 anos, mais ou menos por esta hora. Com elas, Dom Manuel mostra como a fidelidade a Cristo e a missão de Bispo, que o trouxe até aqui, a esta Diocese, modelou a sua identidade e as suas atitudes.

A leitura do Evangelho que hoje proclamámos (Lc 4,14-21) faz-nos compreender melhor tudo isto. A inspiração de D. Manuel – é ele quem o afirma – é o Evangelho e a pessoa de Jesus. E esta passagem resume muito bem a missão, como “envio” da parte de Deus, como capacitação pela unção do Espírito, que ele recebeu na unção nesta catedral: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu para anunciar a Boa-Nova aos pobres; enviou-me a proclamar a libertação aos cativos e, aos cegos, a recuperação da vista; a mandar em liberdade os oprimidos, a proclamar um ano favorável da parte do Senhor”.

A memória de hoje mostra como Dom Manuel viveu e testemunhou este Evangelho da libertação, na força do Espírito de Deus nesta terra. Sempre de uma forma imperfeita, mas ligado a Jesus que foi expressão completa dessa ação unificadora e libertadora de Deus.

Não fazemos aqui um “culto de personalidades”, mas damos graças a Deus que assim modelou e assim esteve presente entre nós, na vida e missão do nosso primeiro bispo. Ele foi fiel a Deus e, por isso mesmo, fiel ao seu povo, especialmente aos pobres de pão, de educação de carinho, de vida; aos cativos sem liberdade de exprimir o que sentem e de colaborar na construção de um mundo mais fraterno, na sua diversidade; aos cegos para Deus e para os outros; aos oprimidos, feridos de miséria, de discriminação, de exclusão, de falta de dignidade e esperança. Para todos eles ele foi proximidade, voz e anúncio de uma oportunidade e um tempo sob o olhar misericordioso de Deus e de um relacionamento de justiça e humanização neste mundo.

 

Um Bispo no meio do povo

Quando se tratou de encontrar a melhor colocação para este memorial, prevaleceu, desde o início, esta localização na praça da cidade, que é também o “terreiro da Sé”, por assim dizer. Foi aqui, como ouvimos, que D. Manuel nasceu Bispo e se fez de Setúbal, na casa onde Deus habita, no meio desta e doutras cidades. É um espaço simbólico de encontro, inspiração e projeto.

Recebeu na Sé a unção do Espírito, mas não ficou fechado dentro da Igreja. Aqui encontrou inspiração e força para sair para a cidade, com olhos e ouvidos atentos para estabelecer laços novos, acolher o desconhecido, o imigrante e o diferente, e cuidar especialmente dos que mais precisam de uma mão estendida. É por isso que ele é representado, nesse terreiro de encontros, em atitude de acolhimento e de saída para a cidade, como sempre costumava fazer.

Dom Manuel deixa assim uma indicação preciosa para a Igreja de que foi primeiro Bispo: ser Igreja que celebra a presença viva do Senhor Jesus, atualizando-a na comunhão dos seus membros, mas saindo constantemente para a construção da cidade, na sua diversidade e nos seus desafios, particularmente atenta a “quem não tem vez nem voz”, como ele costumava dizer.

Neste tempo de pandemia, que esta celebração nos una num esforço identitário de lutar para ultrapassar as dificuldades, como esta península tem feito nas crises que ciclicamente tem conhecido e que nunca se conforme com a pobreza, a miséria e a exclusão de ninguém e de nenhum grupo. Temos lutado e melhorado, temos ainda muito que fazer. Que Deus nos ajude e que todos consigamos dar o nosso contributo.

Diante da Sé, neste terreiro de convivência e aceitação da dignidade na diferença, que a estátua acolhedora de Dom Manuel fique sempre a recordar, como diz o Papa Francisco na sua última encíclica, o apelo do amor universal do Pai do céu, para a construção de uma cidade e de um mundo novo: “amor que rompe as cadeias que nos isolam e separam, lançando pontes; amor que nos permite construir uma grande família onde todos nos podemos sentir em casa. Amor que sabe de compaixão e dignidade.” (Papa Francisco, Todos irmãos, 62).

+ D. José Ornelas, Bispo de Setúbal

 

Reportagem da Renascença para leitura aqui.

D. Manuel Martins: nova estátua será inaugurada no 45.º aniversário da Ordenação Episcopal do primeiro Bispo de Setúbal

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27 de Outubro de 2020