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II Domingo do Advento: Comentário à Liturgia – “Encontro”

Igreja em Rede - formato diocese

Encontro

Neste segundo Domingo é introduzida uma figura fundamental do Advento: João Baptista, aquele que vem preparar os caminhos do Messias, conforme narra o início do Evangelho de São Marcos, baseado na profecia de Isaías, que neste dia se escuta como primeira leitura. Aceitando o Baptista como guia seguro e sentinela atenta nos caminhos do Advento, proponho mais uma vez um olhar para o salmo responsorial, como auxílio para este “abrir uma estrada para o Senhor” nas vidas dos seus fiéis.

O refrão do Salmo 84 repete uma súplica: “mostrai-nos o vosso amor; dai-nos a vossa salvação”. Há, portanto, uma certa continuidade com os textos da semana anterior, porquanto o salmista suplica a Deus que venha para resgatar o seu povo, numa atitude de esperança e confiança (deixo como sugestão a escuta orante de parte deste salmo cantado, numa versão musicada pelo padre Manuel Luís). Destacaria, no entanto, um elemento particularmente belo: na segunda estrofe hoje repetida, apresentam-se quatro atributos como uma espécie de personificação de Deus, na medida em que Ele se comunica ao homem. São eles misericórdia (hesed, em hebraico), fidelidade (emet), paz (shalom) e justiça (tsedeq), palavras estas com grande peso na tradição bíblica e que, por isso, dizem muito mais do que aquilo que uma tradução em português possa sugerir.  

Assim, o salmo revela-nos o encontro entre a Misericórdia e a Fidelidade, ou, se preferirmos, a Bondade (ou o Amor) e a Verdade, elementos constituintes da identidade do Deus de Jesus Cristo e fundamentais para a vivência cristã do Advento. E de forma ainda mais expressiva, o salmo mostra, não apenas um relativamente púdico abraço, mas, de acordo com o original hebraico, que a Paz e a Justiça se beijam, talvez para nos sugerir a profunda intimidade entre a paz messiânica, muito mais que a mera ausência de conflito, e a justiça divina, que nunca é apenas uma fria aplicação de leis. Por isso já São João Crisóstomo exaltava o cruzamento entre a bondade e a justiça como a única via para a salvação do pecador. Neste encontro, continua o salmo, Deus dá aquilo que é bom; e na terra que está para produzir frutos, reconhecia Santo Efrém a própria identidade de Maria, verdadeira terra da qual procede o fruto por excelência, o Messias aguardado.

O orante deste salmo prepara, portanto, um encontro adequado de misericórdia, fidelidade, paz e justiça. Sem este encontro na vida de cada um, não há estrada possível para que o Senhor chegue no Natal. Neste sentido, talvez seja ainda de adicionar a espiritual e espirituosa súplica de Santa Teresa de Ávila: “Liberta-nos, Senhor, das tolas devoções dos santos de cara triste”.

Padre Daniel Nascimento

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05 de Dezembro de 2020