comprehensive-camels

Quando a fé e o mar se cruzam: Armando Oliveira, Diretor Nacional do Apostolado do Mar

OLYMPUS DIGITAL CAMERA

Armando Oliveira, 63 anos. Foi reconduzido em novembro passado pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) como diretor nacional do Apostolado do Mar, por um período de três anos. Esta aventura começou há outros três, quando sentiu que o movimento “se estava a perder”. Agora, com esta missão, sonha em torná-lo mais visível e espera uma maior adesão das novas gerações.

Nunca foi pescador, mas a ligação ao mar tem raízes profundas: “O meu pai, alguns irmãos, os meus sogros, toda a minha família é feita de pescadores. Eu vivia numa zona piscatória (Fontainhas, Setúbal). Desde pequeno que estou ligado aos barcos e ao mar. Desde miúdo. Lembro-me de, quando ia brincar e jogar a bola, também ia ver os barcos a partir e regressar”.

Natural da freguesia de São Sebastião, foi nesta Paróquia que sempre viveu a sua fé e manteve o seu vínculo à Igreja. Mais tarde, integrou a Comissão de Festas de Nossa Senhora do Rosário de Troia, festa centenária profundamente ligada às tradições religiosas da comunidade piscatória setubalense.

 

É a convite do Padre Álvaro Teixeira (Missionário Claretiano, antigo Pároco de São Sebastião) que começa a participar nas reuniões do Apostolado do Mar, passando posteriormente a representar o núcleo do movimento na paróquia.

“Na altura, nos encontros nacionais participavam sobretudo padres. Eu era um dos dois ou três leigos que participava”, confidencia.

Mas essa realidade mudou. O Apostolado do Mar ganha força com a Exposição Internacional de Lisboa (EXPO’98). “Vieram pessoas de toda a parte, mesmo pelo mar. Vinham imagens religiosas de toda a parte para participar nas atividades”.

“Eu já estava integrado no Apostolado mas, a determinada altura, deixou de haver investimento no movimento e o Apostolado do Mar começou a perder-se. Não havia ninguém para tomar conta. Foi quando contactei o senhor D. Vitalino [D. António Vitalino Dantas, bispo emérito de Beja], por e-mail, a perguntar o que íamos fazer do movimento, que tanto a Igreja como os homens do mar precisam.”

“O senhor Bispo disse-me que havia dificuldade com a disponibilidade dos sacerdotes e eu disse que achava mal, na minha ótica, que se ia perder um grande movimento da Igreja. O Senhor D. Vitalino disse que se calhar ia bater-me à porta. E bateu. O Espírito Santo fez ricochete.”

Em 2017 foi nomeado. “Sempre disse que enquanto a Igreja e a CEP quisessem, eu estava ao dispor. Sinto que é um serviço que devo prestar à Igreja e uma missão porque eu sou cristão e quando a Igreja precisa devemos abrir o coração e a nossa boa-vontade de servir.”

“Stella Maris”

O Apostolado do Mar, conhecido internacionalmente como “Stella Maris” (“estrela do mar”, em português, nome ligado à devoção à Virgem Maria), existe em Portugal desde 1935. Está presente nas praias portuguesas de Viana do Castelo à Fuzeta (Ria Formosa, Faro), com 12 núcleos locais, três dos quais na Diocese de Setúbal: São Sebastião, Anunciada e Sesimbra.

A celebrar o seu centenário, este é um ministério marítimo da Igreja Católica fundado em Glasgow, na Escócia, em 1920, e que conta hoje com mais de 1.000 capelães e voluntários a nível mundial. A sua ação centra-se na atenção espiritual e apoio material aos agentes da navegação marítima, pescadores e familiares.

“Queremos levar Cristo aos pescadores e famílias que precisam de fé” sintetiza Armando Oliveira. “Queremos chamar pessoas, de Norte a Sul. Durante o ano pastoral, temos catequeses, dias de oração, reflexão e Eucaristia, o retiro anual, o encontro das praias (encontro nacional) e temos reuniões bimensais em Fátima”.

Contudo, o responsável admite que o movimento “está a envelhecer”. “Não temos muita gente nova que queira entrar. Apesar do envelhecimento das pessoas com profissões ligadas ao mar, “os novos já não têm aquela fé, aquele chamamento para ir à Igreja.”

“Nestes primeiros três anos procurei visitar os vários polos do Apostolado do Mar e todos se deparam com este problema. Estamos a pensar em ter algumas iniciativas para incentivar as gerações mais novas e ter mais praias a aderir”, referiu o diretor nacional.

 

Quando a fé e o mar se cruzam

As muitas tradições religiosas existentes em Portugal associadas ao mar refletem a dureza e o risco da profissão.

“Um pescador quando vai para o mar não sabe se regressa. É uma profissão muito arriscada. Ao contrário de muitos de nós, andam com o coração nas mãos porque pode haver uma fatalidade e não regressarem a casa.”

“Procuramos, na comunidade piscatória, sempre lembrar aqueles que ficaram no mar. Por isso, temos no Cemitério de Setúbal um monumento ao pescador desaparecido, onde existe uma espécie de “boia de salvação” onde se encontram as fotografias.

“O pescador quando sai para o mar pede ao Senhor e a Nossa Senhora que os guarde e que faça regressar novamente a casa. Nas festas tradicionais, vemos muitas pessoas que habitualmente não frequentam a Igreja a entrar na capela e a rezar, de joelhos, em lágrimas. Não sei o que vai no seu íntimo, mas possivelmente estão a agradecer a Nossa Senhora, e a pedir-lhe proteção e amor.”

JM

Partilhe nas redes sociais!
23 de Dezembro de 2020