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A Palavra do Papa: “a fidelidade dinâmica”, o cuidado como missão, a crise dos relacionamentos humanos e a oração quotidiana

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“Somos seres frágeis, mas sabemos rezar: esta é a nossa maior dignidade, é a nossa fortaleza.” disse o Papa na Audiência-Geral de quarta-feira. Esta semana, falou ao Movimento dos Focolares, exortou ao cuidado como missão da Igreja, denunciou os dramas da conjuntura sociopolítica atual e participou numa maratona de oração online pelo fim do Tráfico de Pessoas.

Focolares: testemunhar Evangelho com diálogo e abertura a todos

O Papa Francisco recebeu em audiência, na Sala Paulo VI, os participantes da Assembleia Geral da Obra de Maria, também conhecida como Movimento dos Focolares. O Sumo Pontífice recomendou o diálogo, a abertura aos outros, a fuga de toda a autorreferencialidade e a continuação no caminho de “fidelidade dinâmica” ao carisma do movimento fundado por Chiara Lubich, que teve nesta assembleia a eleição da nova presidente, Margaret Karram.

Para encorajá-los na sua tarefa, ofereceu algumas reflexões que resume em três pontos: “o pós-fundador; a importância das crises; viver a espiritualidade com coerência e realismo”.

Doze anos se passaram desde a morte de Chiara Lubich e, afirmou Francisco, “vocês são chamados a superar o desencorajamento e também a queda numérica, a fim de continuar a ser uma expressão viva do carisma fundador”. Para isso, continuou, “é necessária uma fidelidade dinâmica”, ou seja, um compromisso de “permanecer fiel à fonte original, esforçando-se para repensá-la e expressá-la em diálogo com as novas situações sociais e culturais”.

A abertura aos outros, sejam eles quem forem, é sempre para ser cultivada: o Evangelho é destinado a todos, mas não como proselitismo: é um fermento de nova humanidade em todos os lugares e tempos. Esta atitude de abertura e diálogo ajudar-vos-á a evitar qualquer autorreferencialidade, que nunca vem do bom espírito.”

O segundo ponto é a importância das crises e o Papa enfatizou: não se pode viver sem crises, as crises são bênçãos, para a vida das pessoas e também para a vida das instituições, uma vez que é um “chamamento a uma nova maturidade”.

O terceiro ponto para o qual o Papa chamou a atenção é: viver a espiritualidade do Movimento – centrada na oração de Jesus para que “todos sejam uma só coisa” – com coerência e realismo. E precisou que isto requer um duplo compromisso: fora do Movimento e dentro dele.

Por outro lado, o convite do Papa é promover a sinodalidade, a corresponsabilidade e a participação de todos os membros, no que diz respeito ao compromisso dentro do Movimento. A lógica que deve ser perseguida é a “lógica da comunhão segundo a qual todos podem colocar a serviço dos outros os seus próprios dons, as suas próprias opiniões na verdade e com liberdade”.

Angelus: cuidar dos que sofrem é parte da missão da Igreja

Evidenciando a nossa condição humana, tão elevada em dignidade e, ao mesmo tempo, tão frágil, o Papa frisou no Angelus que Jesus responde a essa condição não com uma explicação, mas com uma presença amorosa que se curva, toma pela mão e levanta.

Foi o que disse o Papa no Angelus deste V Domingo do Tempo Comum, em que o Santo Padre voltou a conduzir a oração mariana da janela do Palácio Apostólico, recitando-a com os fiéis reunidos na Praça São Pedro.

Comentando o Evangelho do dia (cf. Mc 1,29-39) que apresenta a cura, da parte de Jesus, da sogra de Pedro e depois de muitos outros doentes e sofredores que vão até Ele, Francisco observou que a cura da sogra de Pedro é a primeira de natureza física narrada por Marcos.

A mulher estava na cama com febre; a atitude e o gesto de Jesus para com ela são emblemáticos: “Aproximando-se, Ele a tomou pela mão e a fez levantar-se”, observa o Evangelista. Há tanta doçura neste ato simples, que parece quase natural: “A febre deixou-a e ela pôs-se a servi-los”, continuou o Papa. O poder de cura de Jesus não encontra nenhuma resistência; e a pessoa curada retoma a sua vida normal, pensando imediatamente nos outros e não em si mesma – e isso é significativo, é um sinal de verdadeira “saúde”!

Desde o início, observou o Santo Padre, Jesus mostra sua predileção pelas pessoas que sofrem no corpo e no espírito: é a predileção do Pai, que Ele encarna e manifesta com obras e palavras. Os seus discípulos foram testemunhas oculares disso.

Mas Jesus não queria que eles fossem meros espetadores da sua missão: envolveu-os, enviou-os, deu-lhes também o poder de curar os doentes e expulsar os demónios. E isto tem continuado sem interrupção na vida da Igreja até hoje, ressaltou.

O Pontífice acrescentou que para a Igreja, cuidar dos doentes de todo tipo não é uma “atividade opcional”, algo acessório; não, é parte integrante de sua missão, como era da missão de Jesus: levar a ternura de Deus à humanidade sofredora.

No término da oração mariana o Santo Padre manifestou a sua grande preocupação com os desdobramentos da situação que se veio a criar em Mianmar, após o golpe militar de 1º de fevereiro, que levou à prisão da líder e Nobel da Paz Aung San Suu Kyi.

“Neste momento tão delicado quero assegurar mais uma vez a minha proximidade espiritual, a minha oração e a minha solidariedade com o povo de Mianmar. E rezo para que todos aqueles que têm responsabilidades no país se coloquem com sincera disponibilidade ao serviço do bem comum, promovendo a justiça social e a estabilidade nacional, para uma harmoniosa convivência democrática. Rezemos por Mianmar.” Seguiu-se um breve momento de silêncio para a oração.

Papa: o mundo precisa de fraternidade e esperança tanto quanto de vacina

A audiência ao Corpo Diplomático constitui um dos eventos mais tradicionais do ano no Vaticano. Ao receber os embaixadores, o Papa formula os seus votos de felicitações a todos os mais de 180 países com os quais a Santa Sé mantém relações diplomáticas. Mas, sobretudo, é a ocasião em que o Pontífice faz uma análise da atual conjuntura sociopolítica mundial.

O Papa Francisco identificou na crise dos relacionamentos humanos o maior desafio para a sociedade contemporânea. A pandemia e as suas consequências guiaram a reflexão de Francisco, identificando no seu longo discurso as crises que a Covid-19 provocou em escala global. O mundo está doente, afirmou o Papa, e não só por causa do vírus.

A doença e a morte ficaram muito mais palpáveis com a pandemia, o que leva a recordar o valor da vida, “de cada vida humana e da sua dignidade, em todos os momentos, desde a conceção no ventre materno até ao seu fim natural”.

Mais uma vez o Pontífice renovou o seu apelo para que os cuidados na área na saúde, como as vacinas, por exemplo, estejam à disposição de todos, sobretudo dos mais vulneráveis. Recordando, porém, que é responsabilidade de todos manter um comportamento responsável para si e para os demais.

Contudo, constatou o Papa, “não é apenas o ser humano que está doente, a nossa Terra também”. Francisco citou a exploração indiscriminada dos recursos naturais e as mudanças climáticas, que provocam, por sua vez, insegurança alimentar e desastres ambientais.

Esta crise evidenciou que é necessária uma “nova revolução copernicana”, que coloque de novo a economia ao serviço do homem e não vice-versa. E recordou que a Santa Sé considera ineficaz a lógica das sanções de um país contra o outro.

O Papa constatou um “aumento das contraposições políticas e a dificuldade, senão mesmo a incapacidade, de procurar soluções comuns e partilhadas para os problemas que afligem o nosso planeta”. E encorajou os países a empreenderem reformas.

Mas para Francisco, há uma crise que talvez seja a mais grave de todas: a crise dos relacionamentos humanos, expressão de uma crise antropológica geral.

O ano de 2021 é um tempo a não perder; e não se perderá na medida em que soubermos colaborar com generosidade e empenho. Neste sentido, considero que a fraternidade seja o verdadeiro remédio para a pandemia e os inúmeros males que nos atingiram. Fraternidade e esperança são remédios de que o mundo precisa, hoje, tanto como as vacinas.”

Dia Mundial de Oração e Reflexão contra o Tráfico de Pessoas

Nesta segunda-feira, dia 8 de fevereiro, que também é memória litúrgica de Santa Bakhita – símbolo do compromisso da Igreja contra a escravidão – o Papa participou numa maratona online de oração internacional durante 7 horas, em 5 idiomas.

Na mensagem em vídeo, Francisco deu o seu contributo em relação ao tema escolhido pela Rede Internacional de Vida Consagrada Thalita Kum para a data, ou seja, “Economia sem Tráfico de Pessoas”. O Papa afirmou que uma economia sem tráfico de pessoas é uma economia que cuida das pessoas, por exemplo, que oferece emprego para uma construção social segura; é uma economia com regras de mercado que promovam a justiça e, assim, é uma economia corajosa para “conjugar o legítimo lucro com a promoção do emprego e de condições dignas de trabalho”.

Nesta jornada especial, disse o Pontífice, é importante para “encorajar a não parar de rezar e lutar juntos” e a promover gestos concretos, que “abram caminhos para a emancipação social” de toda a pessoa escravizada para “voltar a ser protagonista livre da própria vida”.

A própria memória litúrgica de Santa Bakhita, comentou o Papa, ajuda a invocar a “dimensão da fé e da oração” pelas “pessoas traficadas, as suas famílias e comunidades”.

Audiência Geral: a oração ajuda-nos a amar os outros, não obstante os seus erros e pecados

“Na catequese anterior, vimos que a oração cristã está “ancorada” na Liturgia. Hoje evidenciaremos como da Liturgia ela regressa sempre à vida quotidiana: nas ruas, nos escritórios, nos meios de transporte. Nela o diálogo com Deus continua: quem reza é como o apaixonado, que traz sempre no coração a pessoa amada, onde quer que esteja.” Foi o que disse o Papa Francisco no início da sua catequese na Audiência Geral desta quarta-feira, realizada na Biblioteca do Palácio Apostólico, sobre o tema “Rezar na vida quotidiana”.  

Segundo o Pontífice, “tudo é assumido neste diálogo com Deus: cada alegria torna-se um motivo de louvor, cada provação é ocasião para um pedido de ajuda. A oração é sempre viva, como o fogo das brasas, até quando os lábios não falam. Cada pensamento, embora aparentemente “profano”, pode ser permeado de oração.”

“Até na inteligência humana há um aspeto orante; com efeito, ela é uma janela aberta para o mistério: ilumina os poucos passos que se nos apresentam e depois se abre para toda a realidade, que a precede e a supera”, acrescentou.

O conhecimento de Cristo faz-nos confiar que onde o nosso olhar e os olhos da nossa mente não podem ver, não há o nada, mas uma graça infinita. A oração cristã infunde no coração humano uma esperança invencível: qualquer que seja a experiência que toque o nosso caminho, o amor de Deus pode transformá-la em bem.”

Segundo o Catecismo da Igreja Católica, «aprendemos a rezar em certos momentos, escutando a Palavra do Senhor e participando no seu mistério pascal. Mas a cada momento, nos acontecimentos de cada dia, o seu Espírito é nos oferecido para fazer brotar a oração. O tempo está nas mãos do Pai; é no presente que nós o encontramos; não ontem nem amanhã, mas hoje». “Eu encontro Deus hoje. Sempre existe o hoje do encontro”, disse ainda o Papa.

“Rezemos sempre por tudo e por todos. Rezemos pelos nossos entes queridos, mas também por aqueles que não conhecemos; rezemos até pelos nossos inimigos, como a Escritura muitas vezes nos convida a fazer”, sublinhou o Papa.

A oração dispõe a um amor superabundante. Rezemos especialmente pelos infelizes, por quantos choram na solidão e perdem a esperança de que ainda haja um amor que pulse por eles. A oração realiza milagres” continua, dizendo que “a oração ajuda-nos a amar os outros, não obstante os seus erros e pecados. A pessoa é sempre mais importante do que as suas ações, e Jesus não julgou o mundo, mas salvou-o”.

Francisco concluiu a sua catequese, dizendo que “somos seres frágeis, mas sabemos rezar: esta é a nossa maior dignidade, é a nossa fortaleza. Coragem! Rezar em cada momento, em cada situação, porque o Senhor está próximo de nós. Quando uma oração está em sintonia com o coração de Jesus, obtém milagres”.

Por fim, o desastre ambiental do último domingo, no estado de Uttarakhand, no norte da Índia, esteve no centro da oração do Papa Francisco no final da sua catequese.

Expresso a minha proximidade às vítimas da calamidade ocorrida há três dias no norte da Índia, onde parte de um glaciar se rompeu, causando uma enchente violenta que atingiu os canteiros de obras de duas fábricas hidroelétricas. Rezo pelos trabalhadores falecidos e seus familiares, e por todas as pessoas feridas e danificadas.”

Com o seu olhar sempre voltado para o Oriente, o Papa saudou e dirigiu suas felicitações de paz e bem aos milhões de pessoas que, no dia 12 de fevereiro, celebram o Ano Novo de acordo com o calendário lunar.

JM (com recursos do Vatican News)

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11 de Fevereiro de 2021