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A Palavra do Papa: o percurso da conversão, as transgressões por amor e a viagem de regresso

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O Papa deu inicio à Quaresma com um forte apelo à renovação espiritual que este tempo pede, convidando ao “amor social”. Felicitou a Rádio Vaticano pelos seus 90 anos, lembrou os cristãos coptas martirizados há 6 anos e rezou pelas crianças vítimas de Cancro.

Quaresma: cuidar de quem sofre por causa da Covid-19

Foi divulgada, na passada sexta-feira, 12 de fevereiro, a mensagem do Papa Francisco para a Quaresma deste ano sobre o tema “Vamos subir a Jerusalém. Quaresma: tempo para renovar fé, esperança e caridade”.

O Pontífice convida a renovar a fé, “neste tempo de conversão”, a obter “a «água viva» da esperança” e receber “com o coração aberto o amor de Deus que nos transforma em irmãos e irmãs em Cristo”. Francisco recorda que “na noite de Páscoa, renovaremos as promessas do nosso Batismo, para renascer como mulheres e homens novos por obra e graça do Espírito Santo. Entretanto o itinerário da Quaresma, como aliás todo o caminho cristão, já está inteiramente sob a luz da Ressurreição que anima os sentimentos, atitudes e opções de quem deseja seguir a Cristo”.

“O jejum, a oração e a esmola, tal como são apresentados por Jesus na sua pregação, são as condições para a nossa conversão e sua expressão”, ressalta o Papa na mensagem.

No contexto de preocupação em que vivemos atualmente onde tudo parece frágil e incerto, falar de esperança poderia parecer uma provocação. O tempo da Quaresma é feito para ter esperança, para voltar a dirigir o nosso olhar para a paciência de Deus, que continua a cuidar da sua Criação, não obstante nós a maltratarmos com frequência.”

O Pontífice convida no tempo da Quaresma, a estarmos “mais atentos em «dizer palavras de incentivo, que reconfortam, consolam, fortalecem, estimulam, em vez de palavras que humilham, angustiam, irritam, desprezam». Às vezes, para dar esperança, basta ser «uma pessoa amável, que deixa de lado as suas preocupações e urgências para prestar atenção, oferecer um sorriso, dizer uma palavra de estímulo, possibilitar um espaço de escuta no meio de tanta indiferença».”

“A caridade alegra-se ao ver o outro crescer; e de igual modo sofre quando o encontra na angústia: sozinho, doente, sem abrigo, desprezado, necessitado. A caridade é o impulso do coração que nos faz sair de nós mesmos gerando o vínculo da partilha e da comunhão. «A partir do “amor social”, é possível avançar para uma civilização do amor a que todos nos podemos sentir chamados. Com o seu dinamismo universal, a caridade pode construir um mundo novo, porque não é um sentimento estéril, mas o modo melhor de alcançar vias eficazes de desenvolvimento para todos».”

“Queridos irmãos e irmãs, cada etapa da vida é um tempo para crer, esperar e amar. Que este apelo a viver a Quaresma como percurso de conversão, oração e partilha dos nossos bens, nos ajude a repassar, na nossa memória comunitária e pessoal, a fé que vem de Cristo vivo, a esperança animada pelo sopro do Espírito e o amor cuja fonte inexaurível é o coração misericordioso do Pai”, conclui o Papa.

Rádio: mostrem a verdade das coisas

O Santo Padre congratulou esta semana a Rádio Vaticano pelos 90 anos de funcionamento. A emissora pontifícia foi fundada a 12 de fevereiro de 1931 pelo Papa Pio XI. Para além das felicitações, o Papa apelou aos profissionais da Rádio para que produzam narrativas baseadas na “verdade” da vida.

“Queridos irmãos, feliz aniversário – assim começa a mensagem do Papa – é importante preservar a memória da nossa história e ser nostálgicos não tanto pelo passado como pelo futuro que somos chamados a construir. Obrigado pelo vosso trabalho. Obrigado pelo amor com que trabalham. O rádio tem esta beleza: leva a palavra para os lugares mais longínquos. E hoje combina isso com imagens e com a escrita. Avante com coragem e criatividade ao falar ao mundo e assim construir uma comunicação capaz de nos fazer ver a verdade das coisas”.

“O rádio tem esta beleza: leva a palavra para os lugares mais longínquos”, o Papa repetiu esta frase no dia seguinte, 13 de fevereiro para invocar na sua conta no Twitter, o Dia Mundial da Rádio, proclamado pela UNESCO em 2011. O tema escolhido pela organização para celebrar a efeméride este ano foi “Evolução, inovação e conexão”.

Angelus: como Jesus, ter a coragem de “transgredir” por amor

Com os fiéis na Praça São Pedro pelo segundo domingo consecutivo, o Papa Francisco rezou o Angelus num domingo de sol e muito frio em Roma.

Antes da oração mariana do Angelus, o Pontífice comentou o Evangelho deste VI Domingo do Tempo Comum, que narra a cura de Jesus a um leproso. Neste episódio contido em Marcos, Francisco identificou duas “transgressões”: o leproso que se aproxima de Jesus e Jesus que, movido por compaixão, o toca para curá-lo.

A primeira transgressão é a do leproso: naquele tempo, eram considerados impuros e eram excluídos da vida social, não podiam por exemplo entrar na sinagoga. A doença era considerada um castigo divino, mas, em Jesus, ele pode ver outra face de Deus: não o Deus que castiga, mas o Pai da compaixão e do amor, que nos liberta do pecado e jamais nos exclui da sua misericórdia.

Permitam-me aqui um pensamento a muitos bons sacerdotes confessores que têm esta atitude: atrair as pessoas que se sentem aniquiladas pelos seus pecados com ternura a compaixão… Confessores que não estão com o chicote nas mãos, mas recebem, ouvem e dizem que Deus é bom, que Deus perdoa sempre, que jamais se cansa de perdoar.”

Ao dizer estas palavras, o Pontífice pediu um aplauso – também ele aplaudindo – a todos os confessores misericordiosos.

A segunda transgressão é a de Jesus: enquanto a Lei proibia de tocar os leprosos, Ele comove-se, estende a mão e toca-o para curá-lo. Não se limita às palavras, mas toca-o. Tocar com amor significa estabelecer uma relação, entrar em comunhão, envolver-se na vida do outro a ponto de compartilhar inclusive as suas feridas. Com este gesto, Jesus mostra que Deus não é indiferente, não mantém a “distância de segurança”; pelo contrário, aproxima-se com compaixão e toca a nossa vida para curá-la.

É o estilo de Deus: proximidade, compaixão e ternura. A transgressão de Deus: é um grande transgressor neste sentido.”

Hoje, lamentou o Papa, muitas pessoas ainda sofrem com esta doença e outras que vêm acompanhadas de preconceitos sociais e até mesmo religiosos. Mas ninguém está imune de experimentar feridas, falências, sofrimentos, egoísmos que nos fecham a Deus e aos outros.

O Sumo Pontífice pede “que tenhamos a coragem de sair do nosso isolamento e, ao invés de permanecer ali com pena de nós mesmos ou chorando as nossas falências, ir até Jesus assim como somos. E depois a transgressão de Jesus: um amor que leva a ir além das convenções, que faz superar os preconceitos e o medo de nos envolver na vida do outro. Aprendamos a ser transgressores como estes dois: como o leproso e como Jesus.” 

Cancro Infantil: estejamos próximos de quem sofre, sobretudo das crianças

O Papa Francisco lançou uma publicação no Twitter na segunda-feira, dia 15 de fevereiro, por ocasião do Dia Internacional de Luta contra o Cancro Infantil, instituído pela organização Childhood Cancer International (CCI). O Pontífice pede “que o Senhor inspire cada um de nós a estar próximo de quem sofre, sobretudo das crianças, e a colocar os frágeis em primeiro lugar. Confio a Nossa Senhora os médicos e todas as crianças doentes para que cuide de todos eles com o seu afeto de mãe”.

A campanha global é celebrada há 20 anos para consciencializar sobre o cancro infantil e expressar apoio às famílias com pacientes oncológicos pediátricos.

Mártires coptas: Santos de todos os cristãos, confessaram Jesus até à morte

Numa mensagem em vídeo, o Papa Francisco uniu-se ao evento online realizado na segunda-feira para assinalar os seis anos do martírio de 21 cristãos copta-ortodoxos egípcios numa praia líbia, assassinados por terroristas do autoproclamado Estado Islâmico.

O Pontífice saudou todos aqueles que participaram do encontro online referindo aos mártires como “os nossos Santos, Santos de todos os cristãos, Santos de todas as confissões e tradições cristãs. Eles são aqueles que lavaram suas vidas no sangue do Cordeiro, são aqueles … do povo de Deus, do povo fiel de Deus.”

É verdade que existe uma tragédia, que essas pessoas deixaram as suas vidas na praia; mas também é verdade que a praia foi abençoada pelo seu sangue. Mas é mais verdade ainda que da sua simplicidade, da sua fé simples, mas coerente, receberam o maior dom que um cristão pode receber: o testemunho de Jesus Cristo a ponto de dar a vida.”

Quarta-feira de Cinzas: a Quaresma é uma viagem de regresso a Deus

O Papa Francisco presidiu a missa com o Rito de imposição das Cinzas, na manhã de quarta-feira, na Basílica de São Pedro, no início do tempo da Quaresma.

“Convertei-vos a mim. A Quaresma é uma viagem de regresso a Deus” que “lança um apelo ao nosso coração. Na vida, sempre teremos coisas a fazer e desculpas a apresentar, mas agora é tempo de regressar a Deus”, disse o Pontífice na sua homilia.

“A Quaresma é uma viagem que envolve toda a nossa vida, tudo de nós mesmos. É o tempo para verificar as estradas que estamos a percorrer, para encontrar o caminho que nos leva de volta a casa, para redescobrir o vínculo fundamental com Deus, do qual tudo depende. A Quaresma não é compor um ramalhete espiritual; é discernir para onde está orientado o coração.”

Tentemos saber: Para onde me leva o «navegador» da minha vida, para Deus ou para mim mesmo? Vivo para agradar ao Senhor, ou para ser notado, louvado, preferido? Tenho um coração «dançarino» que dá um passo para a frente e outro para trás, amando ora o Senhor ora o mundo, ou um coração firme em Deus? Sinto-me bem com as minhas hipocrisias ou luto para libertar o coração da simulação e das falsidades que o têm prisioneiro?”

“A viagem da Quaresma é um êxodo da escravidão para a liberdade”, disse ainda o Papa. “São quarenta dias que recordam os quarenta anos em que o povo de Deus caminhou pelo deserto para voltar à terra de origem. Mas, como foi difícil deixar o Egito! Ao longo do caminho, nos seus lamentos, sempre se sentiam tentados pelas cebolas, tentados a voltar para trás, presos às memórias do passado, a qualquer ídolo. O mesmo se passa connosco: a viagem de regresso a Deus vê-se dificultada pelos nossos apegos doentios, impedida pelos laços sedutores dos vícios, pelas falsas seguranças do dinheiro e da ostentação, pela lamúria que paralisa. Para caminhar, é preciso desmascarar estas ilusões”.

Segundo o Papa, o que nos faz regressar a Deus “não são as nossas capacidades nem os méritos que ostentamos, mas a sua graça que temos de acolher. Disse-o claramente Jesus no Evangelho: o que nos torna justos não é a justiça que praticamos diante dos homens, mas a relação sincera com o Pai. O início do regresso a Deus é reconhecermo-nos necessitados d’Ele, necessitados de misericórdia. O caminho certo é este: o caminho da humildade”.

Hoje inclinamos a cabeça para receber as cinzas. Quando terminar a Quaresma, abaixaremo-nos ainda mais para lavar os pés dos irmãos. A Quaresma é uma descida humilde dentro de nós e rumo aos outros. É compreender que a salvação não é uma escalada para a glória, mas um abaixamento por amor. É fazer-nos humildes. Neste caminho, para não perder o rumo, coloquemo-nos diante da cruz de Jesus: é a cátedra silenciosa de Deus. Contemplemos cada dia as suas chagas.”

“Nas suas chagas”, disse o Papa, “reconheçamos o nosso vazio, as nossas faltas, as feridas do pecado, os golpes que nos fizeram sofrer. Vemos ali que Deus não aponta o dedo contra nós, mas abre-nos os braços. As suas chagas estão abertas para nós e, por aquelas chagas, fomos curados”. Nas chagas mais dolorosas da vida, “Deus espera-nos com a sua infinita misericórdia. Porque ali, onde somos mais vulneráveis, onde mais nos envergonhamos, Ele veio ao nosso encontro. E agora convida-nos a regressar a Ele, para voltarmos a encontrar a alegria de ser amados”, concluiu o Papa.

JM (com recursos do portal noticioso Vatican News)

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18 de Fevereiro de 2021