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D. José Ornelas: “Foi convosco que aprendi a ser Bispo”

Na tarde de domingo, 6 de março, a Diocese de Setúbal deu graças pelo ministério episcopal de D. José Ornelas que no próximo domingo toma posse como Bispo de Leiria-Fátima.

Foi a última presidência na Diocese. D. José Ornelas despediu-se da Igreja de Setúbal na Sé Catedral, local onde há seis anos foi ordenado bispo (a 25 de novembro de 2015).

“Há 6 anos que aqui entrei e é natural que sinta muito afeto. É uma comoção cheia de alegria, por aquilo que vivemos juntos, por aquilo que o Senhor nos permitiu fazer, e também de alegria pelo que não fizemos, mas pelas sementes que lançámos à terra”, começou por declarar o prelado.

Presentes na celebração, estiveram muitos diocesanos, em particular padres, diáconos, religiosos, responsáveis de serviços pastorais, movimentos e instituições eclesiais. Também marcaram presença neste momento autoridades civis da região da Península de Setúbal.

O paradigma de Jesus no confronto com a tentação

Sendo Primeiro Domingo da Quaresma, D. José Ornelas explicou que a liturgia do dia aponta para uma tomada de consciência da nossa identidade. É à luz da memória pessoal e coletiva que podemos projetar o futuro e percebemos os fundamentos sobre os quais assenta a nossa vida:

“O crente de que nos fala a primeira leitura traz os frutos da terra que Deus lhe deu e que ele trabalhou, para afirmar que o que tem é dom do Criador de todas as coisas e isso ensina-o a olhar o mundo e as suas vicissitudes de uma maneira mais justa, verdadeira e solidária.”

 

É esse mesmo confronto com a identidade que leva Jesus ao deserto. Segundo o Administrador Diocesano de Setúbal, “Jesus é confrontado, como todos nós, com modos de entender a sua qualidade de Filho de Deus em seu próprio benefício”:

Tens fome? “Diz que estas pedras se transformem em pão”. Queres ser líder e dominar o mundo? Eu tenho a receita e os meios em armas, dinheiro, corrupção, terror: “tudo isto te darei se me adorares.” Queres ser um líder admirado, sedutor, com toda a gente a apoiar-te? Faz prodígios, manipula a opinião pública, controla as redes sociais. “Atira-te daqui abaixo”, vence pelo milagre fácil, da imagem manipulada, do dinheiro sem esforço, do sucesso sem custos…”

Para D. José Ornelas, “não é difícil encontrar à nossa volta a tentação constante”, em tentativas “de afirmação pessoal”, de quem “não se põe ao serviço dos outros, mas se serve deles”.

“Os tiranetes de hoje” – diz o prelado – provocam “morte, destruição, humilhação, refugiados”, em nome “de um poder que usam para si próprios. É exatamente o contrário do projeto apresentado por Jesus. Mas também Jesus foi confrontado com essa imagem de líder que queriam que ele fosse.”

“Jesus recusa todos estes modelos de sucesso e faz-se silêncio à sua volta”, afirma, acrescentando que “é muito importante ter em conta este paradigma de Jesus no deserto”.

“Dou graças a Deus por me ter chamado para junto de vós”

Na sua saída da diocese, D. José considera este um momento “importante na vida da nossa Igreja e não simplesmente um processo administrativo” e partilha um pouco do seu sentimento nesta ocasião:

Não tinha pedido e confesso que resisti a vir para cá, pois tinha outros projetos e estava já a preparar nesse sentido a vida. Hoje, dou graças a Deus por me ter chamado para junto de vós, por ter sido Igreja convosco aqui em Setúbal. Foi convosco que aprendi a ser Bispo.”

“Também agora me custa sair e me custou aceitar este novo chamamento da Igreja. Não pensava sair de cá antes de terminar a minha missão de Bispo. Mas, como já afirmei, se parto triste, não vou triste, pois, na Igreja, habituei-me a ser itinerante e peregrino, onde quer que Deus me chame e para a missão que Ele escolhe”, acrescentou.

 

Lembrou que com a sua chegada, chegou também a imagem peregrina da Virgem de Fátima e foi com ela que fez a primeira visita à Diocese: “Maria é essa mulher que recebe a Palavra de Deus e não fica fechada em si: diz o Evangelho que “se levantou e foi apressadamente” levar o Senhor ao povo (a Isabel). E Maria continua a guiar-me nesse sentido, agora indo para Leiria-Fátima, onde se manifestou num período conturbado de doença e guerra”.

Deixa um agradecimento “a Deus pelos padres que deu a este Igreja, os seminaristas, os religiosos e religiosas, todos aqueles que nas nossas paróquias, nos nossos movimentos, estão tão ativos e tão generosos.”

Salienta que este é um “tempo especial que precisa da luz do contacto com Deus e da comunhão dos membros da Igreja na oração e na escuta da Palavra de Deus, como fez Jesus no deserto”.

O bispo não faz a Igreja, mas a Igreja não se faz sem o bispo. Quem faz a Igreja é o Bom Pastor que se serve de nós. E a Igreja local é feita de pessoas concretas que habitam um local concreto. Mas é também uma Igreja universal, que abre os olhos para fora de si própria, sai de si, para ir ao encontro com os outros. É com esse propósito que vim para cá e é com esse propósito que parto.”

Três recomendações

“Antes de mais, peço-vos que oreis para que o Senhor envie, o mais cedo possível, um novo Bispo para Setúbal e que até lá viveis em comunhão”, pediu explicando que no dia 14 de março o Colégio de Consultores vai eleger o administrador diocesano que lhe há-de suceder enquanto não chega o novo bispo.

Ele, com os consultores, será sinal de união, de governo e de coordenação da vida da Diocese. É com eles [Administrador Diocesano e Colégio de Consultores] que deveis trabalhar, antes de mais rezando para que o Senhor nos conceda um bispo segundo o Seu coração.”

De seguida, pediu que continue o caminho de Igreja sinodal iniciado, “em comunhão com toda a Igreja” para que seja sempre uma “Igreja unida, participativa, caminhante e missionária.”

Por fim, deixou uma mensagem aos jovens pelo caminho feito em conjunto, limitado pela pandemia, mas que foi reinventado com criatividade e ardor missionário: “Escutando a voz do Espírito do Senhor, não deixem de sonhar uma Igreja para o nosso tempo, fiel ao Senhor e à sua história, mas aberta a seguir os caminhos de Deus e disponível para seguir os seus caminhos. Celebrai com alegria a JMJ, em cuja organização a Diocese se encontra empenhada. Fostes para mim um sinal vibrante de alegria e generosidade. Que o Senhor faça florescer a vossa alegria e o vosso espírito de missão.”

Padre José Lobato: “Sem bispo, não deixaremos de ser Igreja”

No final da celebração, o Padre José Lobato, Vigário-Geral da Diocese de Setúbal, deixou uma palavra de saudação e agradecimento, em primeiro lugar ao Papa Francisco “pelo bispo que designou e enviou há seis anos” e em segundo lugar “pela presença, partilha, ensino e testemunho” de D. José Ornelas.

“Não estamos zangados mas ficamos um pouco tristes”, admitiu o sacerdote.

“Não esqueça que agora é de Leiria-Fátima. Que ame, que evangelize, que reparta com os irmãos de Leiria-Fátima os mesmos sentimentos, a mesma palavra, o mesmo humor, o mesmo testemunho que nos ofereceu a nós. E vai ser deles sem se esquecer de nós” dirigiu ao bispo eleito de Leiria-Fátima.

 

Lembrando que ao longo da história formos acarinhados com grandes bispos, D. Manuel Martins, D. Gilberto dos Reis e D. José Ornelas, o Vigário-Geral explica que “vamos ficar um tempo, cuja duração desconhecemos, embora esperamos que seja curta, sem bispo”.

“Será um tempo de oração pelo novo bispo, para que a Igreja o faça segundo o pensamento e as Palavras de Cristo, o Bom Pastor, que nos enviará um bom pastor para a nossa amada Igreja”, acrescentou.

Mesmo sem bispo, não deixaremos de ser Igreja e para isso é necessário que todos, a começar pelo clero, como todos os membros do povo de Deus, estejam unidos, tendo como recurso de grande valor o testemunho que D. José nos deixa”.

Do ministério episcopal de D. José Ornelas, o Padre José Lobato destacou a alegria do prelado: um homem sempre alegre, sempre com um sorriso constante, uma gargalhada cheia de vida e de ânimo: “Nós não tivemos um bispo triste, tivemos um bispo feliz, alegre e comunicativo. Essa foi a dimensão que nos marcou mais e que agora nos motiva a continuar, em jeito sinodal. Estaremos à espera, unidos e fortalecidos”.

“Pedimos a Deus que lhe dê confiança, força e que leve consigo a memória destes anos. Também nós sentiremos como nossos os frutos do seu ministério”, terminou.

O prelado foi ainda ofertado com uma pintura em azulejo da Sé de Setúbal, local em que nasceu como bispo.

JM

 

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07 de Março de 2022