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Óbito: Faleceu o arquiteto João de Sousa Araújo – Artista tem várias obras na Diocese de Setúbal

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Faleceu ao final da noite desta quarta-feira, 22 de março, o arquiteto João de Sousa Araújo, cujas obras artísticas estão presentes em variadíssimos locais da Diocese de Setúbal.

Leia, em seguida, a partilha do diretor da Comissão de Arte Sacra da Diocese de Setúbal, Padre Casimiro Henriques, que ao longo dos últimos 23 anos conviveu de perto com o arquiteto.

Horários das exéquias:

  • 23 de março, 21h, cripta da Igreja de Santo António, Estoril – Eucaristia presidida pelo Padre Acílio Fernandes (que foi diretor da Casa do Gaiato de Setúbal)
  • 24 de março, 13h, Igreja da Boa Nova, São João do Estoril – Missa de corpo presente, seguindo o funeral para o cemitério do Estoril

“João de Sousa Araújo era todo de Deus”

Aos 93 anos, João de Sousa Araújo partiu para a casa do pai no dia 22 de março, depois de ter recebido o Sacramento da Santa Unção e sustentado pela oração da Igreja. Foi esta mesma Igreja que Sousa Araújo amou e serviu, a partir da sua arte.

A nossa Diocese de Setúbal conta com quase todas as disciplinas em que trabalhou este artista.

É de sua autoria o projeto de arquitetura da Igreja do Imaculado Coração de Maria de Vale de Figueira e a Capela de São José, da Charneca de Caparica.

A nível civil desenhou a recuperação da Estalagem do Sado, tendo-se ocupado do mobiliário e decoração.

A Casa do Gaiato de Setúbal foi um dos primeiros lugares que conheceu o seu amor a Jesus, e por isso transformou-a quase num santuário dessa doação ao Altíssimo. Na Casa de Algeruz e no Portinho da Arrábida, o arquiteto projetou algumas adequações de vários espaços, principalmente das capelas. Aqui, permanecem muitas obras da sua autoria, destacando-se o Ciclo dos Mistérios do Rosário, sendo estes óleo sobre tela.

Na pintura deixou um valioso espólio em diversos locais da diocese sadina: Santuário de Cristo Rei; Casa do Vale de Ácor; Igreja de Vale de Figueira; Igreja de Santiago e de Nossa Senhora da Assunção, em Almada; Seminário de São Paulo; Capela São José, na Charneca de Caparica; Centro Paroquial do Miratejo; Igreja de Nossa Senhora da Graça, em Corroios; Igreja de Nossa Senhora da Redenção, na Quinta do Anjo; Igreja de Santa Maria, no Barreiro; Igreja do Coração de Maria, em Setúbal. Nestes lugares temos pintura sobre tela e azulejo, constituindo assim um núcleo artístico e catequético onde o pintor fez aquilo que mais gostava: trabalhar para Deus e pintar temas do Céu.

A Sagrada Escritura era a base da sua vida e do seu trabalho e isso mesmo contemplamos nos milhares de trabalhos espalhadas pelo mundo. Jesus, a Virgem Santa Maria e os Santos sempre foram os seus temas de eleição. A mensagem de Fátima é incontornável na sua obra e, pela pintura, percebemos o quão era essencial na sua vida, tal como é na vida da Igreja em Portugal.

Pintura sobre estuque, podemos ver algumas obras desse suporte no Santuário de Cristo Rei e na Igreja de Vale de Figueira. Nestes mesmo lugares podemos admirar os sacrários da sua autoria. Ainda na pintura, temos trabalhos seus, em vitral, no Santuário de Cristo Rei e na Igreja de Corroios.

A escultura, mormente em bronze, também povoam quase todos estes lugares, destacando-se a escultura de D. Manuel Martins, na Igreja da Charneca de Caparica, edificada em espaço público.

Na Igreja de Tarlock, nos Estados Unidos da América, fez um projeto integral onde, além da arquitetura, do mobiliário e da pintura, elaborou também as alfaias litúrgicas. Brasil, Porto Rico, Japão, Moçambique, são alguns dos lugares que guardam, para memória e para a história, a obra deste mestre, que também foi gravador do Banco de Portugal e por isso elaborou notas que passaram pelas nossas mãos.

Chegou a ser definido como um “artista entre Deus e o dinheiro”, mas João de Sousa Araújo era todo de Deus. Veja-se, a esse título, a chapa de cobre que é guardada no Santuário de Cristo Rei, que representa Cristo na Cruz, e da qual saiu uma gravura patente na Igreja do Coração de Maria, em Setúbal.

São centenas os retratos que elaborou, a óleo ou a pena, onde sempre introduzia uma marca de fé. Por isso, a sua arte também inundou as casas de muitos daqueles que viam nele uma referência da pintura ou da fé. Sempre foi um homem livre, nunca se prendeu a nada, nem sequer quando a sua obra foi escondida, abandonada, perdida ou ameaçada de ser eliminada. “A obra segue o seu percurso que é independente do seu autor”, disse-me quando o confrontei com o destino do Savoy, no Funchal.

Um homem que amou o Pai, o Espírito, Jesus e sua Mãe, intensa e imensamente. Tal como amou a sua esposa e a sua família, a Igreja e os sacerdotes. Estes sempre foram os seus amigos, tendo talvez o Padre Abel Varzim, por força das circunstâncias um lugar destacado.

Guardo o abraço que me deu no dia da minha ordenação e o seu beijo de mãos. Guardo as palavras que me disse no dia da defesa da tese de licenciatura que fiz sobre a sua obra. Guardo momentos de profundo amor que vivemos desde que o conheci em Moçambique até ontem. Foram 23 anos de história que continuam na Comunhão dos Santos onde, agora, sei que vive.

A Eucaristia foi o seu alimento, os sacramentos a sua regra de vida, a Sagrada Escritura o seu farol, a família e a Igreja a pedra fundamente e fundamental da sua existência.

Porque Ele vive, o nosso arquiteto também não morreu. A sua assinatura destacava-se por ser sobreposta a um sinal de infinito, a verdadeira razão não cabe aqui dizer, mas é a expressão que ele vive em Deus para sempre com Jesus.

Padre Casimiro Henriques, diretor da Comissão de Arte Sacra da Diocese de Setúbal

 

Nota biográfica de João de Sousa Araújo

João José de Sousa Araújo nasceu no dia 12 de Novembro de 1929, filho do Mestre Gravador Renato Penha e Cantos de Sousa Araújo e de Maria Manuela Gramunha Vasquez de Sousa Araújo.

Estudou na Escola de Arte Aplicada António Arroio, e licenciou-se na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa (E.S.B.A.L.) em Arquitectura, Pintura e Escultura, com a classificação final de 20 valores. Leccionou durante três anos nessa Escola várias matérias das suas especialidades e recebeu o prémio Roque Gameiro. Também se dedicou à Gravura, modalidade pela qual em 1954 recebeu a 1ª medalha da Sociedade Nacional de Belas Artes. Dedicou-se ainda à Cerâmica e ao Vitral.

Ainda estudante de arquitectura, Sousa Araújo foi trabalhar para o Banco de Portugal na qualidade de gravador, modalidade que lhe proporcionou um estágio na Áustria. São da sua autoria as maquetas iniciais de treze notas portuguesas. A descrição pormenorizada destes trabalhos, encontra-se numa obra do Banco de Portugal intitulada O Papel Moeda em Portugal.

Em 1951 realiza uma exposição na Sociedade de Belas Artes.

No ano de 1954 concebeu a Capela de Santa Maria Goretti, na igreja da Encarnação em Lisboa, um projecto onde se integra pintura e escultura.

Expõe em 1965, na cidade de Roma, um retrato de Paulo VI que foi largamente apreciado.

Até 1967 desenvolve vários projectos para a Basílica e Santuário de Nossa Senhora do Rosário de Fátima. Desenha os vitrais da nave central (num total de 140 m2). Realiza várias telas entre as quais o painel do Altar-Mor.

Entre 1968 e 1997, elabora para a Catedral de Nampula, Moçambique, os vitrais, o políptico da Capela do Santíssimo “Pacem in Terris”, e o políptico do Altar-Mor “Aparições de Fátima”, entre outros projectos de arquitectura para aquela Diocese.

Em 1972 foi um dos retratistas seleccionados para a exposição Paul Louis Weiller, organizada pela Academia de Belas Artes, sendo em 1976 escolhido como escultor. Já em 1975 expõe individualmente na Sala Magna do Palácio da Cultura do Rio de Janeiro.

No ano de 1976, inaugura uma exposição na Embaixada de Portugal junto da Santa Sé. Nesta exposição foi seleccionado um quadro, de grandes dimensões, representando Cristo na Cruz para a colecção do Papa.

Em 1977 expõe no Palácio Anchieta e na Igreja da Consolação, em S. Paulo, Brasil. Em 1978 expõe na Propac e em 1979 no Palácio dos Congressos y Exposiciones, em Madrid.

A pedido do Embaixador da Ordem de Malta, pinta o quadro de São João Baptista, que se encontra na igreja da ordem em Lisboa desde 1980.

Em 1985, uma das suas pinturas a óleo intitulada “Cavalo Branco” foi oficialmente integrada na colecção do príncipe herdeiro do Japão.
Tem cerca de 400 retratos pintados a óleo, entre os quais Paulo VI, em 1968 (que se encontra no Pontifício Colégio Português em Roma) e o do Rei Humberto de Itália.

Como arquitecto projetou numerosas obras no continente e ilhas, como moradias, blocos residenciais, igrejas, pavilhões de caça, estabelecimentos hoteleiros. Em muitas destas obras são da sua autoria a arquitectura e a decoração.

Comissão de Arte Sacra da Diocese de Setúbal

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23 de Março de 2023