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A Palavra do Papa: a liturgia para todos, a lepra da alma, o amor concreto, as brasas da fé e o palco do fingimento

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“A vida não é um teatro”, enfatizou o Papa na Quarta-feira de Cinzas, “e a Quaresma convida-nos a descer do palco do fingimento e regressar ao coração, à verdade daquilo que somos”.

O Papa: a liturgia não é apenas para especialistas, é preciso formar bem os leigos

No seu discurso à Assembleia Plenária do Dicastério para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, cujos participantes foram recebidos pelo Papa na manhã de 8 de fevereiro, na Sala Clementina, no Vaticano, Francisco usou palavras contundentes para enfatizar que “sem reforma litúrgica não há reforma da Igreja”.

Uma Igreja que não sente a paixão pelo crescimento espiritual, que não tenta falar de uma forma que seja compreensível para os homens e mulheres do seu tempo, que não se entristece com a divisão entre os cristãos, que não treme com o anseio de proclamar Cristo aos povos, é uma Igreja doente. Esses são os sintomas de uma Igreja doente.”

O Pontífice recordou o 60º aniversário da Sacrosanctum Concilium, a Constituição sobre a Sagrada Liturgia, elaborada durante o Concílio Vaticano II com o objetivo de “fazer com que a vida cristã dos fiéis cresça cada vez mais a cada dia”, adaptando “as instituições sujeitas a mudanças” às necessidades dos tempos, favorecendo tudo o que pudesse “contribuir para a união de todos os crentes em Cristo”. Na prática, explicou o Papa, “um profundo trabalho de renovação espiritual, pastoral, ecuménica e missionária”.

Para Francisco, é essencial que “os pastores saibam conduzir o povo ao bom pasto da celebração litúrgica, onde o anúncio de Cristo morto e ressuscitado se torna uma experiência concreta de sua presença transformadora da vida”. Mas também é necessário pensar em “novos caminhos de formação” para o povo de Deus, exortou o Santo Padre, e isso a partir das assembleias que se reúnem aos domingos, “o dia do Senhor”, “nas festas do ano litúrgico”, que são “a primeira oportunidade concreta da formação litúrgica”.

Canonização: “lepra da alma”, uma doença que nos torna insensíveis ao amor

O Papa Francisco presidiu à missa de canonização de Maria Antónia de San José de Paz e Figueroa, mais conhecida como Mama Antula, primeira santa argentina, na Basílica de São Pedro, na manhã deste domingo, 11 de fevereiro, Dia Mundial do Doente.

A primeira Leitura e o Evangelho deste domingo “falam da lepra, uma doença que causa a progressiva destruição física da pessoa e que muitas vezes, infelizmente, ainda está hoje associada em certos lugares com atitudes de marginalização”. “Lepra e marginalização são dois males de que Jesus quer libertar o homem que encontra no Evangelho”, disse Francisco na sua homilia.

“Aquele leproso é obrigado a viver fora da cidade. Fragilizado pela doença, em vez de receber ajuda dos seus concidadãos, é abandonado a si mesmo, acabando duplamente ferido pelo afastamento e a rejeição”, sublinhou o Pontífice. As pessoas mantinham distância dele, pois tinham medo de serem contagiadas e ficarem como ele. Mantinham distância também por preconceito, pois pensavam que fosse “um castigo de Deus por alguma falta que ele cometeu, e também por uma falsa religiosidade, porque pensavam que tocar um morto tornava a pessoa impura, e os leprosos eram pessoas cuja carne lhe «morria no corpo». Trata-se de uma religiosidade distorcida, que levanta barreiras e mina a piedade”, disse ainda o Papa.

Também no nosso tempo há tanta marginalização, há barreiras a serem derrubadas, «lepras» a serem curadas. Mas como?”, perguntou Francisco, indicando como resposta dois gestos que faz Jesus: tocar e curar.

O Senhor poderia evitar de tocar naquela pessoa; bastava «curá-la à distância». “Mas Cristo não pensa assim; o seu caminho é o do amor, que o faz aproximar de quem sofre, entrar em contacto, tocar as suas feridas. A proximidade de Deus. Jesus está próximo, Deus está próximo. O nosso Deus, queridos irmãos e irmãs, não se manteve distante no céu, mas em Jesus fez-se homem para tocar a nossa pobreza. E perante a «lepra» mais grave, que é o pecado, não hesitou em morrer na cruz, fora das muralhas da cidade, rejeitado como um pecador, como um leproso, para tocar a fundo a nossa realidade humana”, sublinhou Francisco.

Angelus: o amor precisa de concretude, presença, encontro

O Papa Francisco rezou a oração mariana do Angelus este domingo, Dia Mundial do Doente, com os fiéis e peregrinos reunidos na Praça São Pedro. Na alocução que precedeu a oração, o Pontífice falou sobre o Evangelho deste domingo que nos apresenta a cura de um leproso.

Ao doente, que lhe implora, Jesus responde: “Eu quero: fica curado!”. Pronuncia uma frase muito simples, que coloca imediatamente em prática. De facto, “no mesmo instante a lepra desapareceu e ele ficou curado.” “Este é o estilo de Jesus com quem sofre: poucas palavras e factos concretos”, sublinhou o Papa.

“Não se detém em discursos ou interrogatórios, muito menos em pietismo e sentimentalismos. Demonstra, pelo contrário, o pudor delicado de quem escuta atentamente e age com solicitude, de preferência sem chamar a atenção”, ressaltou o Pontífice.

É uma maneira maravilhosa de amar, e como nos faz bem imaginá-la e assimilá-la! Esta concretude é ainda mais importante num mundo como o nosso, em que uma virtualidade efémera das relações parece ganhar cada vez mais terreno.”

O amor precisa de concretude. O amor que não é concreto não é forte, precisa de presença, de encontro, precisa de tempo e de espaço dados: não pode limitar-se a belas palavras. São instrumentos úteis, que podem ajudar, mas não bastam para o amor, não podem substituir-se à presença concreta.

Francisco convidou cada um a perguntar-se: “Sei ouvir as pessoas? Estou disponível para os seus bons pedidos? Ou dou desculpas, adio,  escondo-me atrás de palavras abstratas e inúteis? Concretamente, quando foi a última vez que fui visitar uma pessoa solitária ou doente, ou que mudei os meus planos para atender às necessidades de quem me pedia ajuda?”, interrogou o Papa.

Francisco: que a tecnologia não desfigure a essência profunda do ser humano

O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta segunda-feira, na Sala do Consistório, no Vaticano, os membros da Pontifícia Academia para a Vida por ocasião da sua assembleia geral sobre o tema “Humano. Significados e desafios”.

O Pontífice reconheceu a importância do tema abordado pelo organismo vaticano, que procura entender o que qualifica o ser humano. Segundo Francisco, “essa é uma questão antiga e sempre nova que os recursos surpreendentes possíveis, graças às novas tecnologias, repropõem de uma forma ainda mais complexa”.

A contribuição dos estudiosos sempre nos disse que não é possível ser, a priori, “a favor” ou “contra” as máquinas e as tecnologias, porque essa alternativa, referida à experiência humana, não faz sentido. O que se deve fazer é inscrever o conhecimento científico e tecnológico num horizonte de significado mais amplo, evitando assim a hegemonia tecnocrática.”

Francisco observou que existe nos homens e nas mulheres hiper-tecnológicos de hoje, que constroem “máquinas falantes”, a “tentação insidiosa” de “sentirem-se protagonistas de um ato criativo” semelhante ao divino. Portanto, somos “solicitados a discernir como a criatividade humana pode ser exercida com responsabilidade”. Para isso, é necessário, continuou o Papa, “desenvolver uma cultura que, integrando os recursos da ciência e da tecnologia, seja capaz de reconhecer e promover o humano na sua especificidade irrepetível”.

Dois são os caminhos a serem seguidos nessa “tarefa cultural”: o “intercâmbio transdisciplinar” e uma “investigação exigente”. “Nesta linha, o cristianismo sempre ofereceu importantes contribuições, extraindo de cada cultura em que se inseriu as tradições de sentido que ali encontrou inscritas e reinterpretando-as à luz da relação com o Senhor, que se revela no Evangelho, e fazendo uso dos recursos linguísticos e conceituais presentes em contextos individuais”, concluiu o Papa.

Audiência Geral: diante do vício da preguiça, é preciso manter acesas as “brasas da fé”

Nesta Quarta-feira de Cinzas, o Papa realizou a Audiência Geral na Sala Paulo VI, dando continuidade ao ciclo sobre vícios e virtudes. O tema foi a acídia, mais conhecida como “preguiça”.

A preguiça, explicou Francisco, é mais um efeito do que uma causa. A pessoa fica ociosa, indolente, apática. Com efeito, na raiz grega do termo acídia está a “falta de cuidado”.

Trata-se de uma tentação muito perigosa, advertiu o Pontífice. Quem é vítima dela é como que esmagado pelo desejo de morte, se arrepende da passagem do tempo e até mesmo a relação com Deus torna-se enfadonha.”

A acídia também é definida como o “demónio do meio-dia”, pois desponta quando o cansaço está no auge e as horas a seguir parecem monótonas, impossíveis de viver. São características que lembram a depressão, pois para quem é dominado pela acédia a vida perde o sentido, “é um pouco como morrer antes da hora”, afirmou o Papa, e o seu efeito pode ser “contagioso”.

Diante deste vício, os mestres espirituais oferecem vários remédios. Para Francisco, o mais importante é a paciência da fé, ou seja, a coragem de ficar e acolher no meu “aqui e agora” a presença de Deus.

“A fé, atormentada pela prova da acídia, não perde o seu valor. Com efeito, é a verdadeira fé, a fé humaníssima, que apesar de tudo, apesar das trevas que a cegam, ainda crê humildemente. É aquela fé que permanece no coração, como permanecem as brasas sob as cinzas. Ficam sempre ali. E se alguém cair neste vício ou numa tentação de acídia, procure olhar para dentro e proteger as brasas da fé. E assim caminhamos em frente. Que o Senhor os abençoe.”

Quarta-feira de Cinzas: A vida não é um teatro, a Quaresma convida-nos a descer do palco do fingimento

O Papa Francisco presidiu, nesta quarta-feira, na Basílica de Santa Sabina, no bairro Aventino, em Roma, a Santa Missa com o rito da bênção e imposição das cinzas.

Como é tradição, a cerimónia teve início com a procissão penitencial que partiu da Igreja de Santo Anselmo, com a participação de cardeais, bispos, monges beneditinos, padres dominicanos e fiéis. Ao final da procissão, o Papa que aguardava na Basílica de Santa Sabina, deu início à Celebração Eucarística.

Na sua homilia, Francisco recordou que a Quaresma mergulha-nos num banho de purificação e despojamento: ajuda-nos a retirar toda a “maquilhagem”, tudo aquilo de que nos revestimos para brilhar, para aparecer melhores do que somos:

Voltar ao coração significa tornar ao nosso verdadeiro eu e apresentá-lo diante de Deus tal como é, nu e sem disfarces. Significa olhar dentro de nós mesmos e tomar consciência daquilo que somos realmente, tirando as máscaras que muitas vezes utilizamos, diminuindo a corrida do nosso frenesim, abraçando a verdade de nós mesmos.”

“A vida não é um teatro”, enfatizou o Papa, “e a Quaresma convida-nos a descer do palco do fingimento e regressar ao coração, à verdade daquilo que somos”.

O Santo Padre sublinhou que o gesto de receber as cinzas visa reconduzir-nos à realidade essencial de nós mesmos: somos pó, a nossa vida é como um sopro, mas o Senhor – Ele, e só Ele – não deixa que ela desapareça: “As cinzas postas sobre a nossa cabeça convidam-nos a redescobrir o segredo da vida.”

Francisco, ao falar dos elementos principais do tempo quaresmal, “a esmola, a oração e o jejum”, recordou que tais ações não se podem reduzir a práticas exteriores, mas são caminhos que nos levam de volta ao coração, ao essencial da vida cristã. 

“Voltemos para Deus com todo o coração”, foi o convite do Pontífice, “para que nestas semanas de Quaresma possamos dar espaço à oração feita de adoração silenciosa, na qual permanecemos na presença do Senhor à Sua escuta”.

Artistas: precisamos de vocês para sonhar um mundo diferente e belo

Qual é a nossa contribuição para a construção de um mundo em harmonia? A cultura da beleza sempre nos coloca em movimento. O encontro com a beleza de Deus nos permite partir novamente, recomeçar, no caminho rumo a sociedades mais humanas e fraternas.

Foi o que disse o Papa à Delegação do Movimento Diaconie de la beauté, ou seja, “Diaconia da beleza”, recebida na manhã desta quinta-feira, 15 de fevereiro, no Vaticano, cujos membros realizam estes dias em Roma o Simpósio da Associação francesa que celebra o décimo aniversário da iniciativa “Festival”.

“A vida de um artista é frequentemente marcada pela solidão, às vezes pela depressão e por grande sofrimento interior. O vosso desafio é trazer à tona a beleza que está escondida nele ou nela, para que ele ou ela, por sua vez, se torne um apóstolo dessa beleza que gera vida, esperança e sede de felicidade. Uma missão que ajuda a aumentar a dignidade do artista, que não se sente mais rejeitado, incompreendido, marginalizado e excluído. Sigam em frente com isso! – exortou Francisco.

Irmãos e irmãs, eu exorto-os a serem cantores da harmonia entre povos, culturas e religiões. A nossa humanidade é abalada por violências de todos os tipos, por guerras, por crises sociais. Nesse contexto, precisamos de homens e mulheres capazes de nos fazer sonhar com um mundo diferente e belo. Façam as pessoas sonharem, para que elas aspirem a uma vida em plenitude!”

Além disso, concluiu o Pontífice, hoje é urgente recriar a harmonia entre o homem e o meio ambiente. As grandes crises climáticas nos obrigam a rever nossos hábitos e comportamentos. E a arte é um meio muito poderoso para transmitir a mensagem da beleza da natureza. De facto, “cuidar do mundo que nos cerca e nos sustenta significa cuidar de nós mesmos. Mas precisamos constituir-nos em um ‘nós’ que habita a Casa comum”.

JM (com recursos jornalísticos do portal Vatican News)

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15 de Fevereiro de 2024