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A Palavra do Papa: a inaudita ternura, a chama inextinguível, o sacrifício que lança sementes e os custódios do próprio coração

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“De facto hoje nós, seres humanos, com as nossas limitações, abraçamos a certeza duma esperança inaudita: a esperança de termos nascido para o Céu. Sim, Jesus nosso irmão veio fazer do Seu Pai o nosso Pai” disse o Papa após a bênção Urbi et Orbi.

Noite de Natal: a inaudita ternura de Deus que salva o mundo encarnando-se

O Papa Francisco presidiu à missa da noite de Natal na Basílica de São Pedro.

Francisco iniciou a sua homilia, enfatizado as seguintes palavras do Evangelista São Lucas: «O recenseamento de toda a terra». “Este é o contexto em que nasce Jesus e no qual se detém o Evangelho. Podia limitar-se a uma rápida alusão, mas ao contrário fala dele com grande esmero. Assim, faz surgir um grande contraste: enquanto o imperador conta os habitantes do mundo, Deus entra nele quase às escondidas; enquanto quem manda procura colocar-se entre os grandes da história, o Rei da história escolhe o caminho da pequenez. Nenhum dos poderosos se dá conta d’Ele; apenas alguns pastores, colocados à margem da vida social”, disse o Papa.

“Nesta noite, irmãos e irmãs, podemos perguntar-nos: Em que Deus acreditamos? No Deus da encarnação ou no da performance? Sim, porque há o risco de viver o Natal tendo na cabeça uma ideia pagã de Deus, como se fosse um patrão poderoso que está no céu; um deus que se alia com o poder, o sucesso mundano e a idolatria do consumismo”, sublinhou Francisco.

O Pontífice convidou a olhar para o «Deus vivo e verdadeiro». “Ele que está para além de todo o cálculo humano, no entanto, deixa-se recensear pelos nossos registos; Ele que revoluciona a história, habitando nela; Ele que nos respeita até ao ponto de nos permitir rejeitá-Lo; Ele que apaga o pecado assumindo a responsabilidade pelo mesmo, que não tira a dor, mas a transforma, que não nos tira os problemas da vida, mas dá às nossas vidas uma esperança maior do que os problemas. Deseja tanto abraçar as nossas existências que, sendo infinito, por nós se fez finito; grande, se fez pequeno; sendo justo, habita as nossas injustiças”, disse ainda o Papa, acrescentando:

Aqui está a maravilha do Natal: não uma mistura de sentimentos adocicados e confortos mundanos, mas a inaudita ternura de Deus que salva o mundo encarnando-se. Fixemos o Menino, olhemos para a sua manjedoura, para o presépio, que os anjos chamam «o sinal»: realmente constitui o sinal revelador do rosto de Deus, que é compaixão e misericórdia, omnipotente sempre e só no amor.”

“Sim, Cristo não olha para os números, mas para os rostos. Contudo quem é que olha para Ele, por entre as inúmeras coisas e as corridas loucas de um mundo sempre agitado e indiferente? Em Belém, enquanto muitas pessoas, preocupadas com o recenseamento, iam e vinham, enchiam as hospedarias e pousadas falando de tudo e de nada, houve alguns que estiveram junto de Jesus: Maria e José, os pastores e depois os magos. Aprendamos com eles. Ei-los com o olhar fixo em Jesus, com o coração voltado para Ele; não falam, mas adoram.”

Urbi et Orbi: dizer «não» à guerra, viagem sem destino, loucura indesculpável, pede o Papa

No Dia de Natal, o Papa concedeu a habitual Bênção Urbi et Orbi da varanda central da Basílica de São Pedro. Na sua mensagem, deixou importantes apelos à paz.

«Nasceu-vos um Salvador, que é o Messias Senhor» (Lc 2, 11) foi a lembrar as palavras do Anjo aos pastores que o Sumo Pontífice iniciou a sua mensagem em Dia de Natal. “Trata-se das palavras do anjo no céu de Belém, que são dirigidas também a nós. Enche-nos de confiança e esperança saber que o Senhor nasceu para nós; que a Palavra eterna do Pai, o Deus infinito, fixou a sua morada entre nós. Fez-Se carne, veio «habitar connosco» (Jo 1, 14): esta é a notícia que muda o curso da história!”

De facto hoje nós, seres humanos, com as nossas limitações, abraçamos a certeza duma esperança inaudita: a esperança de termos nascido para o Céu. Sim, Jesus nosso irmão veio fazer do Seu Pai o nosso Pai: Menino frágil, revela-nos a ternura de Deus e muito mais… Ele, o Unigénito do Pai, dá aos homens o «poder de se tornarem filhos de Deus» (Jo 1, 12).”

“Hoje em Belém, por entre as trevas da terra, acendeu-se esta chama inextinguível; hoje, sobre as trevas do mundo, prevalece a luz de Deus” explica o Santo Padre, convidando a que nos alegremos com esta graça: “Alegra-te, tu que te vês falho de confiança e de certezas, porque não estás sozinho, não estás sozinha: Cristo nasceu para ti! Alegra-te, tu que perdeste a esperança, porque Deus te estende a mão: não aponta o dedo contra ti, mas oferece-te a sua mãozinha de Menino para te libertar dos medos, aliviar-te das canseiras e mostrar-te que, aos olhos d’Ele, vales mais do que qualquer outra coisa.”

No Natal, nasce o “Príncipe da Paz”. Deste modo dizer «sim» ao Príncipe da paz significa dizer «não» à guerra, a toda a guerra, à própria lógica da guerra, que é viagem sem destino, derrota sem vencedores, loucura indesculpável. Mas, para dizer «não» à guerra, é preciso dizer «não» às armas.”

Deste modo, o Papa denuncia o comércio das armas e a ignorância dos “massacres armados que acontecem num silêncio ensurdecedor”.

Isaías, que profetizara o Príncipe da paz, deixou escrito que virá um dia em que «uma nação não levantará a espada contra outra»; um dia em que os homens «não se adestrarão mais para a guerra», mas «transformarão as suas espadas em relhas de arado, e as suas lanças em foices» (2, 4). Com a ajuda de Deus, esforcemo-nos para que se aproxime esse dia!

Aproxime-se em Israel e na Palestina, onde a guerra abala a vida daquelas populações. A todas abraço, em particular às comunidades cristãs de Gaza e de toda a Terra Santa. Trago no coração a dor pelas vítimas do execrável atentado de 7 de outubro passado, e renovo um premente apelo pela libertação de quantos se encontram ainda reféns. Suplico que cessem as operações militares, com o seu espaventoso rasto de vítimas civis inocentes, que se ponha remédio à desesperada situação humanitária, possibilitando a entrada das ajudas. Não se continue a alimentar violência e ódio, mas avance-se no sentido duma solução para a questão palestiniana, através dum diálogo sincero e perseverante entre as Partes, sustentado por uma forte vontade política e pelo apoio da comunidade internacional.

O Papa deixou ainda outros apelos à paz na Síria, na Ucrânia, na Arménia, no Azerbaijão, na região do Sahel, o Chifre de África, no Sudão, bem como nos Camarões, na República Democrática do Congo, no Sudão do Sul e entre as Coreias.

“Irmãos e irmãs, aproxima-se o tempo de graça e esperança do Jubileu, que vai começar dentro de um ano. Que este período de preparação seja ocasião para converter o coração; dizer «não» à guerra e «sim» à paz; responder com alegria ao convite do Senhor que nos chama, como profetizou Isaías, «para levar a boa-nova aos pobres, para curar os desesperados, para anunciar a libertação aos exilados e a liberdade aos prisioneiros» (61, 1).”

Estas palavras cumpriram-se em Jesus (cf. Lc 4, 18), hoje nascido em Belém. Acolhamo-Lo, abramos o coração a Ele, o Salvador, o Príncipe da paz!”

Angelus: o sacrifício dos perseguidos muda os corações e salva os homens

Na terça-feira (26), um dia após o Natal, celebrámos a Festa de Santo Estêvão, o primeiro mártir. E o Papa Francisco junto com os fiéis reunidos na Praça São Pedro rezou ao meio-dia a Oração mariana do Angelus.

Na sua breve alocução que precedeu à oração, Francisco recordou que encontramos o relato do martírio de Estêvão nos Atos dos Apóstolos, onde é descrito como um homem de boa reputação, que servia em refeitórios e administrava a caridade.

É precisamente por causa dessa generosa integridade – disse Francisco – que ele não pode deixar de testemunhar o que lhe é mais precioso: testemunhar a sua fé em Jesus”.

A sua fé em Jesus – sublinhou o Papa – provoca a ira dos seus adversários, que o matam apedrejando-o sem piedade. O Santo Padre recorda então que tudo ocorre diante de um jovem, Saulo, zeloso perseguidor dos cristãos, que atua como “garante” da execução.

“Pensemos por um momento nessa cena: Saulo e Estêvão, o perseguidor e o perseguido. Entre eles parece haver um muro impenetrável, duro como o fundamentalismo do jovem fariseu e como as pedras atiradas contra o homem condenado à morte. No entanto, além das aparências, há algo mais forte que os une: por meio do testemunho de Estevão, de facto, o Senhor já está a preparar o coração de Saulo, sem que ele saiba, a conversão que o levará a ser o grande apóstolo Paulo”.

O Papa Francisco destaca em seguida que Estêvão, o seu serviço, a sua oração e a fé que ele proclama, a sua coragem e especialmente o seu perdão na hora da morte, não são em vão. “Dizia-se, em tempos de perseguição – e ainda hoje é correto dizer isso – que “o sangue dos mártires semente de cristãos”. Parecem terminar em nada, mas, na realidade, o seu sacrifício lança uma semente que, correndo em direção oposta das pedras, planta-se, de maneira oculta, no peito de seu pior rival.

Recordou, então, o Pontífice, as perseguições dos nossos dias: “hoje, dois mil anos depois, infelizmente vemos que a perseguição continua: há perseguição dos cristãos… ainda existem – e são muitos – aqueles que sofrem e morrem por dar testemunho de Jesus, assim como existem aqueles que são penalizados, em vários níveis, por se comportarem de maneira coerente com o Evangelho”.

Audiência Geral: nunca se deve dialogar com o diabo, é importante guardar o coração

O Papa Francisco introduziu um novo ciclo de catequeses, sobre o tema “Vícios e virtudes. Guardar o coração”, na Audiência Geral desta quarta-feira, realizada na Sala Paulo VI.

Francisco partiu do “início da Bíblia, onde o livro do Génesis, com a narrativa dos progenitores, apresenta a dinâmica do mal e da tentação”. “No quadro idílico representado pelo Jardim do Éden, aparece um personagem que se torna o símbolo da tentação: a serpente. Este personagem que seduz. A serpente é um animal insidioso: ela move-se lentamente, rastejando pelo chão, e às vezes não se percebe nem mesmo a sua presença, é silencioso, pois consegue se mimetizar bem com o ambiente. Sobretudo por isso é perigosa”, frisou o Papa.

“Ao começar a dialogar com Adão e Eva demonstra também uma dialética refinada. Começa como se faz nas coscuvilhices maldosas, com uma pergunta maliciosa: “É verdade que Deus vos proibiu comer do fruto de toda árvore do jardim?”. A frase é falsa: Deus, na realidade, ofereceu ao homem e à mulher todos os frutos do jardim, exceto os de uma árvore específica: a árvore do conhecimento do bem e do mal”, disse ainda Francisco, acrescentando:

Esta proibição não pretende proibir ao homem o uso da razão, como às vezes é mal interpretada, mas é uma medida de sabedoria. Como se dissesse: reconheça o limite, não se sinta dono de tudo, porque o orgulho é o início de todos os males.”

“Portanto, Deus coloca os progenitores como senhores e custódios da criação, mas quer preservá-los da presunção da omnipotência, de se tornarem senhores do bem e do mal. Que é uma tentação. Uma tentação ruim até mesmo agora. Esta é a armadilha mais perigosa para o coração humano!”

“Como sabemos, Adão e Eva não conseguiram resistir à tentação da serpente. A ideia de um Deus não tão bom, que queria mantê-los submissos, insinuou-se nas suas mentes: daí o colapso de tudo”, sublinhou o Pontífice.

“Com estas narrativas, a Bíblia explica-nos que o mal não começa no homem de uma forma clamorosa, quando um ato já é concreto, mas muito antes, quando se começa a entreter-se com ele, a acalmá-lo na imaginação e nos pensamentos, terminando por ser enredado pelas suas lisonjas. O assassinato de Abel não começou com uma pedra atirada, mas com o rancor que Caim infelizmente guardava, fazendo com que ele se tornasse um monstro dentro de si. Também neste caso, as recomendações de Deus são inúteis”, disse ainda o Papa.

Fiquem atentos! O diabo é um sedutor. Nunca dialogar com ele porque ele é mais esperto do que nós, e nos fará pagar. Quando vem uma tentação, não dialogar nunca, mas fechar a porta, fechar a janela, fechar o coração e assim defendemo-nos dessa sedução, porque o diabo é astuto, é inteligente.”

Francisco disse ainda que “é preciso ser custódios do próprio coração e por isso, não dialogamos com o diabo”. “Que o Senhor nos ajude neste trabalho. Quem guarda o seu coração guarda um tesouro. Irmãos e irmãs, aprendamos a guardar o coração”, concluiu.

JM (com recursos Vatican News)

Foto: Vatican Media

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28 de Dezembro de 2023