comprehensive-camels

Eucaristia/D. José Ornelas: “Na família e na sociedade, a pessoa doente não pode ser abandonada”

No VI Domingo do Tempo Comum, último domingo antes do início da Quaresma, o Bispo de Setúbal presidiu à Eucaristia na Sé Catedral, chamando a atenção para a dimensão social da doença, para a necessidade de “acudir, cuidar, acarinhar” e de não excluir.

“O Evangelho deste domingo VI do tempo comum apresenta-nos um episódio muito adequado ao tempo de pandemia que estamos a viver, especialmente tendo acabado de celebrar o Dia Mundial do Doente (11 de fevereiro)”, começou o bispo diocesano na sua homilia.

Na Eucaristia, transmitida pelos canais digitais, D. José Ornelas começou por comentar o trecho do livro do Levítico, escutado na primeira leitura, que “descreve o que fazer, quando alguém mostrava sinais de poder estar afetado pela lepra, uma doença que aterrorizava as pessoas, pelos efeitos devastadores que podia provocar”.

Refere o prelado que, para evitar o contágio, segregavam-se as pessoas, excluindo-as de todo o contato com os outros: andavam andrajosos, tinham que se encontrar fora da cidade, longe da sociedade, um confinamento bem mais doloroso.

“De certo modo, é algo que conhecemos bem na situação que vivemos desde há hum ano: a necessidade de conter o estender-se da doença condicionou toda a nossa vida. Obrigou-nos a evitar e cortar muitas coisas importantes e mesmo necessárias. E até mesmo evitar o contato com as pessoas que amamos, com relacionamentos e dimensões fundamentais como os amigos, e a celebração conjunta da nossa fé”, continua.

 

O prelado acrescenta que a doença não é simplesmente uma questão pessoal, individual, tem uma dimensão social: “Quando uma pessoa se encontra fragilizada, quando não pode bastar a si própria, não pode ser posta de parte. É quando os que estão à sua volta se devem mobilizar para acudir, cuidar, acarinhar.”

No Evangelho, “o comportamento de Jesus com o leproso é imagem disso. O medo do contágio, levava a sociedade a banir o leproso do contato e convivência com os outros. A única coisa que a sociedade fazia era libertar-se da possibilidade do perigo. Jesus quebra esse tabu. Quebrando as regras e preconceitos, aproxima-se toca o homem na sua doença, na sua tristeza, na sua frustração, na sua busca e cura-o”.

Este não é um convite a passar por cima das normas de cautela para evitar propagar o mal. Jesus mesmo diz ao homem que curou, que deve cumprir as normas prescritas para poder ser reintegrado na sociedade.”

“Na nossa sociedade, estas normas de respeito e cuidado são justamente conjugadas com um enorme esforço de cuidar realmente de quem foi atingido pela doença. Por isso temos hospitais, investigadores, cuidadores. Temos todos de ser solidários. E o esforço de contenção de todos é tremendamente importante para o bom resultado dos que estão diretamente cuidando dos que estão em perigo.”

“Mas, tanto aqueles que estão mais expostos, como aqueles que se encontram necessariamente confinados, a atitude tem de ser a mesma de Jesus: na família, na sociedade, a pessoa doente não pode ser abandonada. Faz parte da família, dos afetos, dos esforços, dos cuidados. Há que “tocar”, isto é, há que partilhar o sofrimento, a dor e a esperança, para que possamos partilhar a alegria da cura, do convívio, do futuro. Nunca ninguém pode ser deixado só”, explica.

 

Segundo o Bispo de Setúbal, esta proximidade é fundamental para que as pessoas saiam da doença com “saúde mental, espiritual e social”.

“Mas há uma outra dimensão que é fundamental e se encontra na base de todas as outras atitudes. Na mente de muitas pessoas, a doença é vista como uma maldição de Deus. No caso dos leprosos, não podiam entrar nos templos nem participar em celebrações religiosas”, alerta ainda o bispo diocesano.

Jesus não chamou logo este homem para o templo: foi ao encontro dele na sua dor e no seu drama, que não era só de lepra mas de abandono, de falta de relação, de dignidade, de esperança. Não pactuou com a segregação, mas criou as condições para acabar com ela.”

“Mas, acima de tido, mostrou, com o seu gesto, que Deus nunca está longe de quem sofre, que é o Senhor da vida e gerador de relações que curam o corpo, a mente e o coração e dão perspetivas de uma vida que ninguém mais pode dar… E depois, mandou-o reintegrar-se na comunidade e dar graças a Deus no templo, abrindo-se à grandeza de Deus que é maior até do que a morte”, afirma.

Para D José Ornelas, o “processo de cura deste homem ilumina a nossas atitudes neste tempo difícil e exigente. Certamente que há medidas profiláticas a respeitar (Jesus não diz uma palavra contra elas). Mas essas não podem ser nunca expressão de abandono ou de exclusão de ninguém, deixado sozinho na sua dor e no sem-sentido que, por vezes, a vida toma”. 

“E, sobretudo, hoje, levantemos os olhos com confiança para Deus que vem ao nosso encontro e nos dá força e luz para ultrapassar as nossas doenças pessoais, partilhando com quem precisa, a força que é ter sentido a mão de Deus que nos faz passar pelas nossas crises”, conclui.

JM

Partilhe nas redes sociais!
18 de Fevereiro de 2021