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Generosidade é marca da comunidade

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À beira do Tejo, onde o mar se encontra com o rio, está a vila da Trafaria. É aí que agora chegamos para falar com o prior, Padre Sérgio Quelhas, que nos descreve a Paróquia com a presença de uma comunidade envelhecida, pobre mas generosa, que não tem crescido fisicamente mas onde a estrutura espiritual é forte.

Generosidade é uma das marcas da paróquia da Trafaria. À nossa chegada, prova disso mesmo. Um grupo de crianças, de uma creche do Monte da Caparica, vem até ali com as suas educadoras para entregar bens alimentares a algumas das pessoas mais carenciadas da comunidade.
«Apesar de esta ser uma comunidade pobre e de as pessoas terem poucos recursos, são generosas quer no grupo que trabalha e que são os meus diretos colaboradores, quer nas pessoas que, não colaborando no trabalho propriamente dito, vão ajudando, por exemplo, com rifas e donativos. Cumpre-se aqui, muitas vezes, o Evangelho e aqueles que menos têm são os que mais facilmente conseguem ajudar. Talvez por serem os mais capazes de compreender as necessidades, entendem o significado de solidariedade e da caridade», diz-nos o pároco.
«No entanto – diz ainda o prior – nem sempre é fácil identificar as pessoas que vivem em carência. Às vezes numa pequena conversa é que nos apercebemos das necessidades das pessoas. Queremos manter uma certa discrição nestas coisas e pretendemos que assim se mantenha, para proteger as pessoas que desabafam connosco. Há pessoas que sabemos que precisam de ser ajudadas e nós ajudamo-las, discretamente». 

Comunidade envelhecida a precisar de renovação

Apesar de haver uma consistência espiritual muito forte na comunidade paroquial, a comunidade tem vindo a envelhecer e a renovação revela-se difícil. O Padre Sérgio explica-nos os motivos: «A comunidade tem crescido do ponto de vista espiritual mas não tem crescido fisicamente, muito pelo contrário. As pessoas vão envelhecendo e, do ponto de vista civil, não há casas para habitações. Os jovens que se querem estabelecer têm que ser ricos para comprar uma casa velha e restaurá-la ou então vão para outros sítios onde possam comprar uma casa nova».
Numa vila envelhecida, esta ausência de juventude traduz-se na comunidade paroquial e, sobretudo na continuidade dos diferentes grupos e movimentos. «Quando cheguei, há doze anos, havia um grupo de vicentinos muito forte e ativo mas os mais velhos foram desaparecendo, outros foram ficando com poucas possibilidades de ação e o grupo parou. Agora está a ser difícil arrancar com ele. Havia também a Legião de Maria e outros. Os únicos grupos que se mantêm são a catequese e os Escuteiros. São os pilares da paróquia em termos de juventude mas mesmo assim não há, nem muitos chefes nem muitos catequistas», salienta o sacerdote.
Neste sentido, o prior aponta como um dos objetivos da Paróquia, a evangelização: «Temos aqui identificado o desafio espiritual de uma maior aproximação a Jesus. A população praticante é uma pequena minoria e isto dignifica que há gente que precisa de ser cativada. Dentro dos não praticantes há muita gente amiga da Igreja e reconhecedora do trabalho e do papel da Igreja mas que não passam disso. Que a Igreja se mantenha um centro espiritual. Como centro que é reconhecido como ponto de ajuda espiritual e material para as pessoas», sublinha.

Igreja, voz da população

Face aos problemas da vila da Trafaria, o pároco considera que a Igreja tem que ser a voz da população e um ponto de defesa da própria terra. «Em muitas ocasiões tenho falado da falta de construção. A Igreja tem que defender a vida da Trafaria que já foi, do ponto de vista turístico, muito forte e que tem potencialidades para ser de novo um ponto forte», refere.
«A Trafaria tem associações e coletividades algumas delas centenárias, clubes e associações que tiveram o seu apogeu – diz ainda o Padre Sérgio – Há pessoas que se lembram de haver filas intermináveis para apanhar o barco. Hoje ainda continua mas de uma forma muito mais reduzida e com o espectro da extinção. E agora, mais grave ainda, é o espectro da extinção da Junta de Freguesia que é, de facto, inconcebível para esta zona. A Trafaria precisa da sua junta. Quem não é de cá não percebe as necessidades reais das pessoas. Pode saber ler os números e ser tecnicamente muito competente mas não sabe ler realidade social».
 
Centro Paroquial a avançar

Um dos projetos da Paróquia, e quase a entrar em funcionamento, é o Centro Paroquial de São Pedro. «O Centro Paroquial existe desde que eu cá estou. Havia projetos mas nunca chegaram a ser concretizados por dificuldades económicas. Este ano, apesar da crise, conseguimos avançar. Ainda estamos em obras, umas feitas por parte da Paróquia outras por parte da Junta de Freguesia, mas estou desejoso de ver o Centro inaugurado», afirma o Padre Sérgio.
De uma casa que era muito velha e degradada, que não tinha condições, está a nascer um espaço remodelado onde há-de funcionar o apoio alimentar mas também um apoio para crianças e idosos. «Vamos avançar, por exemplo, com uma sala de estudo e eventualmente ATL. Será um sítio onde as crianças possam fazer os seus trabalhos de escola, possam ter uma explicação de algo que lhes seja mais complicado de perceber e estejam concentrados ali para aquilo. Ao mesmo tempo gostaríamos que também fosse um centro de convívio de pessoas mais idosas como forma de combate ao isolamento», menciona.
Um dos desejos do Padre Sérgio é continuar a trabalhar em parceria com as diferentes instituições porque acredita que essa é a melhor forma de levar a cabo os diferentes objectivos para o bem-comum: «Quando estamos isolados arriscamo-nos a perder o barco. Esta crise, uma das coisas que nos veio ensinar, foi o sentido comunitário. Todos precisamos uns dos outros como uma família e por isso as IPSS precisam de se unir umas às outras. Diria até: bom seria que as IPSS se especializassem, umas numa valência e outras noutra e depois trabalhassem em conjunto. Era mais útil, economizava recursos humanos e materiais e estávamos de facto a funcionar de mãos dadas».

«Pôr os dons a render»

A mesma lógica de é apresentada pelo prior em relação às comunidades cristãs: «Por exemplo, se uma paróquia não tem catequistas suficientes porque não há-de outra que tem mais partilhar? Da mesma forma, os próprios padres poderiam colaborar de tal maneira em que, por exemplo, se há um que tem muito jeito para organizar centros paroquiais, porque não ser el até o gestor de todos os centros daquela área da vigararia. Outro seria o orientador da catequese e por aí fora. Otimizar recursos e pôr os dons a render. Em vez de ser o orgulhosamente só para nós, era o orgulhosamente para todos».

Outro dos projetos que vai avançar é a construção de uma secretaria paroquial onde o prior passará a ter um escritório para receber as pessoas e que melhorará muito as condições de acolhimento. Por tudo isto, o Padre Sérgio mostra-se muito agradecido: «No ano que eu fico cinquentenário é que surgem estas oportunidades todas. Deus Nosso Senhor, desde que nasci me tem ajudado. Durante muitos anos eu não sabia que era Ele que me ajudava. A partir de uma certa altura comecei a perceber. Hoje tenho plena consciência que Ele me tem ajudado mesmo, mesmo muito. Não com a velocidade humana, que nós às vezes quereríamos, mas com a velocidade d’Ele. Curiosamente, neste ano de 2013, ano do meu cinquentenário e ano de crise é que estas coisas acontecem. Projetos existem desde sempre não havia era condições de realização».

Anabela Sousa

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04 de Fevereiro de 2013