comprehensive-camels

A Palavra do Papa: a primavera demográfica, a esperança comunitária, os missionários do mundo e os obstáculos à oração

20210519-a-palavra-do-papa-francisco

“Zangar-se com Deus é uma forma de rezar também” referiu o Papa mais do que uma vez esta semana. Por estes dias, incentivou à “natalidade sustentável”, reforçou o trabalho do escutismo para uma Igreja “extrovertida” e apelou a uma evangelização corajosa, guiada pelo Espírito Santo.

“Sem natalidade não há futuro.”

O Papa Francisco abriu os trabalhos dos Estados Gerais da Natalidade, encontro promovido pelo Fórum das Associações Familiares no Auditório da Conciliação.

No encontro, que teve como objetivo refletir sobre a preocupante redução da natalidade em Itália, o Papa referiu que esta tendência tem de ser “revertida”, dirigindo sobretudo o seu pensamento aos jovens, cujos sonhos são desfeitos pelas crises e pandemias.

Por um lado, a “perplexidade devido à incerteza do trabalho”, por outro, o “medo causado pelos custos cada vez menos sustentáveis para a criação dos filhos” e a “tristeza” para as mulheres “que no trabalho são desencorajadas a terem filhos ou têm que esconder a barriga” para não serem despedidas. Tudo isso são “areias movediças que podem afundar uma sociedade” e contribuem para tornar ainda “mais frio e escuro” aquele inverno demográfico que agora é constante na Itália.

“Para que o futuro seja bom, é necessário cuidar das famílias, particularmente das famílias jovens, atormentadas por preocupações que correm o risco de paralisar os seus projetos de vida” acrescentou o Pontífice.

Se as famílias não estiverem no centro do presente, não haverá futuro; mas se as famílias recomeçam, tudo recomeça.”

O cenário é difícil e o futuro incerto, mas o Papa Francisco vê uma “primavera” no horizonte. Para alcançá-la, o Santo Padre oferece três “pensamentos”: a vida como dom “recebido” e a ser transmitido; a “sustentabilidade geracional” como forma de proteção ao meio ambiente e a solidariedade “estrutural”, ou seja, não ligada à emergência, mas estável para as estruturas de apoio às famílias e de ajuda aos nascimentos.

Em conclusão, uma palavra simples e sincera: “Obrigado”. “Obrigado a cada um de vocês e a todos aqueles que acreditam na vida humana e no futuro.” Às vezes vocês terão a sensação de gritar no deserto, de lutar contra moinhos de vento. Mas vão em frente, não desistam, porque é bonito sonhar o bem e construir o futuro. E sem natalidade não há futuro”.

Escuteiros: “sejam semeadores de esperança e da vida comunitária”

Na manhã de sexta-feira, 14 de maio, o Papa Francisco recebeu em audiência os membros do Movimento Escuteiro Católico Francês (Scouts Unitaires de France), presentes em Roma por ocasião do 50° aniversário da sua fundação.

Francisco iniciou o seu discurso parabenizando-os por serem considerados pelas entidades pastoriais juvenis da Conferência Episcopal Francesa como protagonistas na evangelização e na construção da sociedade. Recordando em seguida que o movimento escuteiro “convida a sonhar e a agir, a ter a coragem de olhar para o futuro com esperança”, acompanhando os mais jovens, na descoberta dos seus talentos e na construção de “relações humanas reais e não apenas virtuais, especialmente na idade em que o caráter e a personalidade são formados”.

O escuteiro, com sua disponibilidade ao serviço do próximo, também é chamado a trabalhar por uma Igreja mais ‘extrovertida’ e por um mundo mais humano”. Com esta nobre missão de testemunhar – encorajou o Papa – “onde quer que estejam, com a sua fé e o seu compromisso, vocês podem aumentar a riqueza das relações humanas e torná-las um bem comum que ajuda a uma renovação social”.

Francisco concluiu exortando os jovens a um esforço “para fazer do Escutismo Católico um movimento de semeadores de esperança e uma redescoberta da vida comunitária”.

Proteção de menores: proteger do “homicídio psicológico” dos abusos

O Papa Francisco recebeu em audiência os membros da Associação “Meter”, fundada pelo sacerdote italiano padre Fortunato Di Noto, em proteção e defesa das crianças vítimas de abusos e maus-tratos.

No discurso, o Pontífice ressaltou o relevante serviço prestado pela Associação que desde 1989 atua no combate à pedofilia na Itália e em outros países.

Nestes anos, com o seu trabalho generoso, vocês contribuíram para tornar visível o amor da Igreja pelos menores e mais indefesos. Quantas vezes, como o bom samaritano do Evangelho, vocês se fizeram próximos com respeito e compaixão, para acolher, consolar e proteger! Quantas feridas espirituais vocês enfaixaram! Por tudo isso, a comunidade eclesial lhes é reconhecedora”, disse Francisco.

Francisco destacou ainda que o trabalho da associação é mais do que nunca necessário porque, infelizmente, os abusos perpetrados contra crianças continuam, especialmente com os aliciamentos através da internet e redes sociais.

Francisco afirmou ainda que o abuso contra menores é uma espécie de “homicídio psicológico” e em muitos casos uma eliminação da infância.

O Papa concluiu exortando a Associação “Meter” a continuar sem hesitação essa obra, dando particular atenção ao aspeto educacional, para formar nas pessoas uma consciência firme e erradicar a cultura do abuso e da exploração.

Regina Caeli: “sejamos testemunhas corajosas do Ressuscitado”

“A Ascensão completa a missão de Jesus entre nós. Na verdade, se foi por nós que Jesus desceu do céu, é sempre por nós que ele sobe para lá. Depois de ter descido à nossa humanidade e tê-la redimido, Ele agora sobe ao céu levando a nossa carne com Ele” disse Francisco no Regina Caeli deste Domingo da Ascensão do Senhor e 55º Dia Mundial das Comunicações Sociais.

A evangelização, por mais empenhada, exigente e superior às capacidades humanas, será tão verdadeira e eficaz quanto cada um de nós – e toda a Igreja – deixar o Senhor agir dentro de si e por meio de si. Isso é o que o Espírito Santo faz: nos torna instrumentos por meio dos quais o Senhor pode operar.”

Francisco observou que normalmente as cenas de despedida são tristes, dão aos que ficam uma sensação de perplexidade, de abandono; em vez disso, não é o que acontece aos discípulos.

“Apesar da separação do Senhor, não se mostram desconsolados, pelo contrário, estão alegres e prontos a partir como missionários ao mundo”, frisou o Papa.

A oração de Jesus está ali, com a nossa carne: é um de nós, Deus homem, e reza por nós. E isto deve dar-nod uma segurança, aliás, uma alegria, uma grande alegria! E o segundo motivo de alegria é a promessa de Jesus. Ele disse-nos: “Eu vos enviarei o Espírito Santo”. E ali, com o Espírito Santo, é feito aquele mandamento que Ele dá precisamente na despedida: ‘Ide pelo mundo, proclamai o Evangelho’.”

Após a oração do Regina Caeli, o Papa falou sobre o sacerdote Francisco Maria da Cruz Jordan, fundador dos religiosos Salvatorianos e das religiosas Salvatorianas, beatificado no dia anterior na Basílica de São João de Latrão, considerando-o “um incansável proclamador do Evangelho.”

Francisco recordou a “Semana Laudato si’”, a celebrar esta semana, que serve para nos educarmos cada vez mais a ouvir o grito da Terra e o grito dos pobres. Reagiu ainda com preocupação à escalada de violência na Terra Santa, alertando especialmente para o “inaceitável” assassinato de crianças e apelando à responsabilidade dos povos, bem como ao cessar-fogo.

É uma ferida grave para a fraternidade e a convivência pacífica entre os cidadãos, que será difícil de curar se não houver uma abertura imediata para o diálogo. Eu pergunto-me: aonde o ódio e a vingança vão levar? Pensamos realmente que podemos construir a paz destruindo o outro?”

“Rezemos incessantemente para que israelitas e palestinianos possam encontrar o caminho do diálogo e do perdão, para serem pacientes construtores de paz e justiça, abrindo-se, passo a passo, a uma esperança comum, a uma coexistência entre irmãos.”

Myanmar: “o Senhor escuta o clamor do seu povo e enxuga as suas lágrimas”

“Hoje quero depor sobre o altar do Senhor os sofrimentos do vosso povo e rezar convosco para que Deus converta os corações de todos à paz” foi o que disse o Papa na missa na manhã de domingo celebrada com os fiéis birmaneses na Basílica de São Pedro, sinal de proximidade do Santo Padre para com o povo deste país do sudeste asiático, que passa por uma fase difícil de violências e opressões.

Francisco ressaltou que ao aproximar-se o momento de carregar no seu coração e na sua carne todo o pecado do mundo, Jesus continua a amar-nos e reza por nós. “A partir desta oração de Jesus aprendamos, também nós, a atravessar os momentos dramáticos e dolorosos da vida”, foi o convite do Santo Padre.

A oração, disse o Papa, “é a única arma que temos para guardar o amor e a esperança no meio de tantas armas que semeiam morte”.

Guardar a fé é manter o olhar voltado para o céu, quando na terra se combate e derrama sangue inocente. É não ceder à lógica do ódio e da vingança, mas ficar com o olhar voltado para o Deus do amor que nos chama a ser irmãos entre nós”, disse Francisco.

“Talvez nos venha vontade de protestar, gritar o nosso sofrimento também a Deus: não devemos ter medo de o fazer; também isso é oração. Em certos momentos, é uma oração que Deus atende mais depressa que outras, porque nasce dum coração ferido, e o Senhor sempre escuta o clamor do seu povo e enxuga as suas lágrimas”, frisou o Papa.

O Papa apelou a cada um para rezar pela unidade, empenhar-se em ser “construtor de fraternidade, um semeador de fraternidade” e “guardar a verdade”, que não significa “tornar-se guardiões dum sistema de doutrinas e dogmas, mas permanecer ligados a Cristo e consagrados ao seu Evangelho.”

Antes de concluir, Francisco fez uma premente exortação: “O Senhor não precisa de gente tíbia: quer-nos consagrados na verdade e na beleza do Evangelho, para podermos testemunhar a alegria do Reino de Deus mesmo na noite escura da tribulação e quando o mal parece mais forte.”

Vida Consagrada: “para não se tornar estéril, manter diálogo com a realidade”

A 50ª Semana Nacional espanhola para Institutos de Vida Consagrada começou na segunda-feira com uma mensagem em vídeo do Papa Francisco.

Para o Santo Padre, o percurso vivido pela Vida Consagrada compreende-se “no diálogo com a realidade” e “consagrando-se todos os dias” para não “se tornar estéril”, como já acontece com alguns institutos. O Pontífice exorta a que se tenha “coragem apostólica” ao manter o carisma fundacional, sem se perder “em formalismos, ideologias, medos e diálogos” que não sejam com o Espírito Santo.

Eu pergunto-me, sobre a esterilidade de alguns institutos de Vida Consagrada, ver a causa: geralmente está na falta de diálogo e envolvimento com a realidade. Não se esqueçam disso, a Vida Consagrada é sempre um diálogo com a realidade.”

“Não tenham medo dos limites! Não tenham medo das fronteiras! Não tenham medo das periferias! Porque ali o Espírito vai falar convosco. Coloquem-se ‘dentro do alcance’ do Espírito Santo”, concluiu.

O Papa: rezar para ter um coração luminoso, não cinzento

“Distrações, aridez e acídia” foi o tema da catequese do Papa Francisco, sobre o tema da oração, na Audiência Geral, de quarta-feira, realizada no Pátio São Dâmaso.

Francisco procurou mostrar algumas dificuldades comuns identificadas e superadas na experiência vivida da oração, ressaltando que “rezar não é fácil” e que “são tantas as dificuldades que surgem na oração”.

A oração convive frequentemente com a distração. De facto, a mente humana tem dificuldade em se concentrar por muito tempo num único pensamento. Todos nós experimentamos este turbilhão contínuo de imagens e ilusões em movimento perpétuo, que nos acompanha até durante o sono.”

“As distrações não são culpáveis, mas devem ser combatidas. No património da nossa fé há uma virtude que é frequentemente esquecida, mas que está muito presente no Evangelho. Chama-se vigilância”, disse o Papa.

O segundo problema é a aridez, que nos faz pensar na Sexta-feira Santa, na noite e no Sábado Santo. “Jesus morreu: estamos sozinhos. Este é um pensamento de aridez.”

“Muitas vezes estamos assim, ou seja, não temos sentimentos, não temos consolação. São aqueles dias cinzentos que existem na vida!”, disse o Pontífice.  Segundo Francisco, “o perigo é ter um coração cinzento, quando o estar pra baixo chega ao coração e o adoece”. “Existem pessoas que vivem com o coração cinzento. Isso é terrível! Não se reza mais, não se sente o consolo com o coração cinzento. O coração deve ser aberto e luminoso para que entre a luz do Senhor. E se ela não entrar”, disse o Papa, “é preciso aguardá-la com esperança”.

O terceiro problema que se apresenta para quem reza é a acídia, “uma verdadeira tentação contra a oração e, mais geralmente, contra a vida cristã. A acídia é «uma forma de depressão devida ao relaxamento da ascese, à diminuição da vigilância, à negligência do coração». É um dos sete “pecados capitais” pois, alimentado pela presunção, pode levar à morte da alma”.

“O que devemos fazer, então, nesta sucessão de entusiasmos e desencorajamentos?”, perguntou o Papa. “Devemos aprender a caminhar sempre”, respondeu ele.

O verdadeiro progresso na vida espiritual não consiste em multiplicar os êxtases, mas em ser capaz de perseverar em tempos difíceis. Caminhar, caminhar e se ficar cansado, pare um pouco, mas volte a caminhar, com perseverança. Todos os santos passaram por este “vale escuro”, e não nos escandalizemos se, lendo os seus diários, ouvirmos o relato de noites de oração sem vontade, vivida sem gosto.”

Segundo o Papa, protestar diante de Deus é uma forma de rezar, “zangar-se com Deus é uma forma de rezar também”. Francisco convidou a não “nos esquecer a oração do porquê, que é a oração das crianças quando começam a não entender as coisas e querem chamar a atenção do pai. Zangar-se com Deus faz bem, pois faz despertar a relação de filho com o Pai, de filha com o Pai, que nós devemos ter com Deus”, concluiu.

JM (com recursos jornalísticos do portal de notícias Vatican News)

Partilhe nas redes sociais!
20 de Maio de 2021