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A Palavra do Papa: os poetas sociais, a imersão para servir, a terapia da dignidade e a liberdade do amor

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Nos últimos dias, o Santo Padre falou da necessidade de “descer do pedestal para servir” e refletiu sobre a liberdade, que é “expressão de caridade”. Criticou ainda os interesses económicos que impedem o desenvolvimento integral dos povos: “é hora de frear a locomotiva descontrolada da ganância humana”.

Francisco: combater a fome superando a lógica fria do mercado

O Papa Francisco enviou uma mensagem ao diretor-geral do Fundo das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), Qu Dongyu, para o Dia Mundial da Alimentação 2021, celebrado no sábado, 16 de outubro.

O Santo Padre afirma, no texto, que “vencer a fome de uma vez por todas” é “um dos maiores desafios da humanidade”. É “um objetivo ambicioso”. Francisco lembra que a Cimeira das Nações Unidas sobre Sistemas Alimentares, realizada a 23 de setembro, destacou a necessidade urgente de soluções inovadoras para transformar o nosso modo de produzir e consumir. Um compromisso que não pode ser “prorrogado”, escreve o Papa. Citando o tema do Dia Mundial da Alimentação deste ano, “As nossas ações são o nosso futuro. Melhor produção, melhor nutrição, um ambiente melhor e uma vida melhor”, Francisco afirma:

Cada um de nós tem uma função a desempenhar na transformação dos sistemas alimentares em benefício das pessoas e do planeta, e “todos podemos colaborar […] para o cuidado da criação, cada um com a sua cultura e experiência, as suas iniciativas e capacidades”.

Na mensagem, o Papa assegura a proximidade da Santa Sé e da Igreja Católica ao compromisso no setor alimentar da FAO e de outras realidades, para que os direitos fundamentais de cada pessoa sejam garantidos. Invocando sobre todos a bênção de Deus Onipotente, ele conclui: “Que aqueles que espalham sementes de esperança e concórdia sintam o apoio da minha oração para que as suas iniciativas e projetos sejam cada vez mais frutuosos e eficazes”.

Papa: “é hora de frear a locomotiva descontrolada da ganância humana”

Um premente apelo aos “poderosos da Terra” para trabalhar por um mundo mais justo, cancelando o “sistema de morte”: é a mensagem que o Papa enviou em vídeo para o IV Encontro Mundial dos Movimentos Populares.

Ao agradecer por permitirem que faça parte dessa caminhada, o Papa Francisco chama os movimentos populares de “poetas sociais” e explicou: “Chamo-os assim por terem a capacidade e a coragem de suscitar esperança onde reinam rejeição e exclusão”.

O Papa agradeceu aos membros dos Movimentos pela sua dedicação, que é anúncio da esperança; a sua presença lembra que não estamos condenados a construir um futuro baseado na exclusão, na desigualdade ou na indiferença, onde a cultura do privilégio é um poder invisível e irreprimível e a exploração e o abuso são um método habitual de sobrevivência.

Francisco pede o cancelamento da dívida dos países pobres, o fim das armas, das agressões e sanções e a quebra de patente para todos tenham acesso às vacinas. Como propostas concretas: um salário mínimo, a redução da jornada de trabalho e medidas de incentivo à educação das crianças pobres.

A atual situação, causada pela pandemia, precisa de novos encontros, discernimento, escolhas e ação conjunta; os povos foram afetados por tantas desigualdades sociais; o nosso modo de vida mudou drasticamente, acentuando pela ganância de alguns:

Este sistema, com a sua lógica implacável de ganância, está a escapar a todo domínio humano. É hora de frear a locomotiva, uma locomotiva descontrolada que nos está a levar ao abismo. Ainda estamos em tempo.”

“Irmãs e irmãos, estou convencido de que o mundo se vê mais claramente a partir das periferias. Sigam impulsionando a sua agenda de terra, teto e trabalho. Sigam sonhando juntos. E obrigado – obrigado seriamente – por me deixarem sonhar com vocês”, terminou.

Papa: “episcopado é o nome de um serviço, não de uma honra”

O Papa Francisco presidiu à Santa Missa na manhã deste domingo, com o rito de ordenação episcopal de Guido Marini e de Andrés Gabriel Ferrada Moreira.

Destinado à diocese de Tortona, norte da Itália, Dom Guido Marini concluiu o seu período de 14 anos como mestre das celebrações pontifícias com a ordenação episcopal. A missa deste domingo marcou o início do serviço do seu sucessor, Mons. Diego Ravelli. Já o chileno Andrés Gabriel Ferrada Moreira foi nomeado pelo Papa Francisco secretário da Congregação para o Clero.

Na sua homilia, o Pontífice propôs uma reflexão sobre a responsabilidade eclesial do bispo.

O Senhor nosso Jesus, enviado pelo Pai para redimir os homens, por sua vez enviou ao mundo os doze apóstolos para que, repletos da potência do Espírito Santo, anunciassem o Evangelho a todos os povos”, explicou o Papa.

A fim de perpetuar de geração em geração este ministério apostólico, os Doze muniram-se de colaboradores, transmitindo a eles, com a imposição das mãos, o dom do Espírito recebido por Cristo. Assim, através da ininterrupta sucessão dos bispos na tradição viva da Igreja, se manteve este ministério primário e a obra do Salvador continua e desenvolve-se até aos nossos tempos. No bispo, circundando dos seus presbíteros, está presente o próprio Senhor Jesus Cristo, sumo sacerdote em eterno.

’Episcopado’, com efeito, é o nome de um serviço – não é verdadeiro episcopado sem serviço -, não de uma honra – como queriam os apóstolos, um à direita, outro à esquerda -, porque ao bispo compete mais servir do que dominar, segundo o mandamento do Mestre: ‘Quem é o maior entre vós, se torne o menor. E quem governa, como quem serve’. Servir.”

Angelus: “a lógica de Cristo é descer do pedestal para servir”

Depois de celebrar a missa na Basílica Vaticana, o Papa Francisco rezou com os fiéis reunidos na Praça São Pedro a oração do Angelus. No 29º Domingo do Tempo Comum, o Pontífice destacou dois verbos: emergir e imergir.

Marcos narra que dois dos discípulos, Tiago e João, pedem ao Senhor para se sentar ao Seu lado na glória, “como primeiros-ministros”, causando indignação nos demais. Jesus então ensina que a verdadeira glória se obtém vivendo o batismo que estava para receber em Jerusalém, e não elevando-se sobre os outros.

A palavra batismo significa “imersão”. Portanto, a glória de Deus é amor que se faz serviço, não poder que busca o domínio.”

Emergir, explicou o Papa, expressa aquela mentalidade mundana da qual somos sempre tentados: viver todas as coisas, até mesmo as relações, para alimentar a nossa ambição, para subir os degraus do sucesso.

A esta lógica mundana, Jesus propõe a sua: ao invés de elevar-se sobre os demais, descer do pedestal para servir. Ao invés de emergir sobre os outros, imergir-se na vida dos outros. Jesus não ficou lá no céu, a olhar-nos do alto, mas abaixou-se para lavar os nossos pés. E pede que façamos o mesmo com os outros com compaixão.

Mas para passar do emergir ao imergir, só o empenho não é suficiente. Mas cada um tem dentro de si a força do batismo, daquela imersão em Jesus que impulsiona a segui-Lo, é um fogo que o Espírito acendeu e que deve ser alimentado.

Saúde: “apostar na terapia da dignidade humana”

No dia de São Lucas, 18 de outubro, que o Apóstolo Paulo chama de “o médico amado”, o Papa Francisco recebeu em audiência os membros da Fundação Universitária Biomédica de estudos e pesquisas na área médica, assim como no atendimento na Clínica da Universidade de Roma.

Depois da saudação inicial, o Papa recordou aos presentes que “colocar a pessoa doente à frente da doença é essencial em todos os campos da medicina; é fundamental para um tratamento que seja verdadeiramente abrangente, verdadeiramente humano”.  

“O amor pelo homem, especialmente na sua condição de fragilidade, na qual brilha a imagem de Jesus Crucificado, é específico de uma realidade cristã e nunca deve ser perdido” disse o Papa chamando a atenção para os descartados e os que não têm assistência médica.

Toda estrutura hospitalar, particularmente as de inspiração cristã, deve ser um lugar onde se pratica a cura da pessoa e onde se pode dizer: “Aqui não se vê apenas médicos e pacientes, mas pessoas que se acolhem e se ajudam mutuamente: aqui encontra-se a terapia da dignidade humana.”

“Portanto, o foco deve ser a cura da pessoa, sem esquecer a importância da ciência e da pesquisa. Porque a cura sem a ciência é em vão, assim como a ciência sem a cura é estéril. Os dois devem caminhar juntos, e só juntos fazem da medicina uma arte, uma arte que envolve cabeça e coração, que combina conhecimento e compaixão, profissionalismo e piedade, competência e empatia”.

Audiência Geral: “a verdadeira liberdade é plenamente expressa na caridade”

“A liberdade realiza-se na caridade” foi o tema da catequese do Papa Francisco na Audiência Geral de quarta-feira, 20 de outubro. O pontífice deu continuidade ao ciclo de catequeses sobre a Carta de São Paulo aos Gálatas.

Uma criança aproximou-se do Papa e o Pontífice aproveitou a ocasião para recordar o que Jesus diz a propósito da espontaneidade e da liberdade das crianças. O menino italiano de 10 anos que se aproximou do Papa chama-se Paolo. Ele superou as barreiras da segurança, na Sala Paulo VI, e foi tranquilamente em direção ao Santo Padre. Paolo sofre de atraso cognitivo. Veio a Roma com a sua família de San Ferdinando di Puglia e participou na Audiência Geral.

Este menino teve a liberdade de se aproximar e se mover como se estivesse em casa”, disse o Papa, lembrando as palavras de Jesus: “Se vocês não se tornarem como crianças, vocês não entrarão no Reino do Céu.” Ter a “coragem de aproximar-se do Senhor, de estar aberto ao Senhor, de não ter medo do Senhor”.

“Agradeço a este menino pela lição que nos deu a todos. Que o Senhor o ajude na sua limitação, no seu crescimento, porque ele deu este testemunho que veio do seu coração. As crianças não têm um tradutor automático do coração para a vida: o coração continua.”

São Paulo, na sua Carta aos Gálatas, “introduz-nos gradualmente na grande novidade da fé. Renascidos em Cristo, passamos de uma religiosidade feita de preceitos para uma fé viva, que tem o seu centro na comunhão com Deus e com os irmãos, ou seja, na caridade. Passamos da escravidão do medo e do pecado para a liberdade dos filhos de Deus”.

“A liberdade não é uma forma libertina de viver, segundo a carne, ou segundo o instinto, desejos individuais e impulsos egoístas; pelo contrário, a liberdade de Jesus leva-nos a estar – escreve o Apóstolo – «ao serviço uns dos outros». A liberdade em Cristo tem alguma dimensão de escravidão, que nos leva ao serviço, a viver para os outros. Noutras palavras, a verdadeira liberdade é plenamente expressão da caridade.”

Não existe liberdade sem amor. A liberdade egoísta de fazer o que eu quero não é liberdade, porque ela volta para si mesma. Não é fecunda. Foi o amor de Cristo que nos libertou e é ainda o amor que nos liberta da pior escravidão, a do nosso ego; por conseguinte, a liberdade cresce com o amor.”

Na primeira Carta aos Coríntios, o Apóstolo responde àqueles que têm uma ideia errada de liberdade. «Tudo é lícito!», dizem eles. «Sim, mas nem tudo é benéfico», responde Paulo. «Tudo é lícito!» – «Sim, mas nem tudo edifica», objetou o Apóstolo. E acrescenta: «Ninguém procure o próprio interesse, senão os dos outros».

“A pandemia nos ensinou que precisamos uns dos outros, mas não é suficiente sabê-lo, precisamos de o escolher concretamente todos os dias. Decidir sobre aquela estrada. Os outros não são um obstáculo à minha liberdade, mas a possibilidade de a realizar plenamente. A nossa liberdade nasce do amor de Deus e cresce na caridade”.

JM (com recursos do portal Vatican News)

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21 de Outubro de 2021