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A Palavra do Papa: o tempo de deserto, as lágrimas da Ucrânia, a justiça substancial e as semeadoras de esperança

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Denunciando os “rios de sangue” provocados pela guerra, a crise de refugiados, especialmente mulheres e crianças, e a falta de “substância” no cumprimento dos direitos humanos, o Papa apelou à reflexão, oração e à “transformação para o bem”. “A felicidade e liberdade verdadeiras não estão em possuir, mas em partilhar; não em aproveitar-se dos outros, mas em amá-los; não na obsessão com o poder, mas na alegria de servir” disse, ainda, no Angelus.

Angelus: a felicidade não está em aproveitar-se dos outros, mas na alegria de servir

Na alocução que precedeu a oração mariana do Angelus rezada com os fiéis e peregrinos na Praça São Pedro, ao meio-dia deste I Domingo da Quaresma, o Santo Padre deteve-se na página do Evangelho do dia, que traz as tentações sofridas por Jesus no deserto.

O Evangelho, disse o Santo Padre, “leva-nos ao deserto, onde Jesus é conduzido pelo Espírito Santo, durante quarenta dias para ser tentado pelo diabo (cf. Lc 4,1-13). O deserto simboliza a luta contra as seduções do mal, a fim de aprender a escolher a verdadeira liberdade”.

Jesus, de facto, vive a experiência do deserto pouco antes de começar a sua missão pública. É precisamente através desta luta espiritual que Ele afirma de forma decisiva que tipo de Messias pretende ser, observou o Pontífice. Duas vezes o diabo dirige-se a Ele e diz: “Se és o Filho de Deus…”. Ou seja, propõe-lhe a explorar a sua posição: primeiro para satisfazer as necessidades materiais que sente; depois para aumentar o seu poder; por fim, para obter um sinal prodigioso de Deus.

É como se estivesse a dizer: “Se és o Filho de Deus, aproveita”, ou seja, “pensa em teu proveito”. É uma proposta sedutora, mas leva à escravidão do coração: torna-nos obcecados pelo desejo de ter, reduz tudo à posse de coisas, de poder, de fama. Este é o núcleo das tentações. É “o veneno das paixões” no qual o mal cria raízes.

Mas Jesus opõe-se às atrações do mal de uma maneira vencedora. Como faz isso? Respondendo às tentações com a Palavra de Deus, que diz para não tirar proveito. Porque a felicidade e liberdade verdadeiras não estão em possuir, mas em partilhar; não em aproveitar-se dos outros, mas em amá-los; não na obsessão com o poder, mas na alegria de servir.”

“Irmãos e irmãs, estas tentações também nos acompanham no caminho da vida. Devemos estar vigilantes, porque muitas vezes elas apresentam-se sob uma forma aparente de bem. De facto, o diabo, que é astuto, usa sempre o engano.”

Por favor: com o mal, nada de compactuar com ele! Não se deve dialogar com a tentação, não se deve cair naquele sono de consciência que faz dizer: “afinal, não é grave, todos fazem assim”! Olhemos para Jesus, que não procura acomodamentos, não faz acordos com o mal. Ele opõe-se ao diabo com a Palavra de Deus e assim vence as tentações.

Que este tempo de Quaresma – concluiu o Papa – seja também um tempo de deserto para nós”.

Francisco pediu aos fiéis que o acompanhassem durante esta semana de retiro quaresmal:

“Esta tarde, juntamente com os colaboradores da Cúria Romana, daremos início aos Exercícios Espirituais. Tragamos nas nossas orações todas as necessidades da Igreja e da família humana. E também vocês, por favor, rezem por nós.”

Ucrânia: cessem os ataques e prevaleça a negociação e o bom senso

No Angelus, o Papa dirigiu breves palavras sobre a Ucrânia:

Correm rios de sangue e lágrimas na Ucrânia. Não se trata apenas de uma operação militar, mas de guerra, que semeia morte, destruição e miséria. As vítimas são cada vez mais numerosas, assim como as pessoas que fogem, especialmente mães e crianças. A necessidade de assistência humanitária neste país atormentado está a crescer dramaticamente a cada hora.”

O Pontífice agradece a todos os envolvidos no acolhimento de refugiados e aos jornalistas comprometidos em relatar a crueldade da guerra.

A Santa Sé está pronta para fazer tudo, para colocar-se a serviço desta paz. Nestes dias, dois cardeais foram à Ucrânia, para servir o povo, para ajudar. O cardeal Krajewski, esmoleiro, para levar ajuda aos necessitados, e o cardeal Czerny, prefeito (interino) do Dicastério (para o Serviço) do Desenvolvimento Humano Integral.

Francisco: 50% dos pobres têm 50% dos direitos humanos descumpridos

O Papa enviou uma mensagem em vídeo aos participantes da primeira Cimeira de Magistrados sobre Direitos Sociais e Doutrina Franciscana em tempos de pandemia e pós-pandemia, que ocorreu em Misiones, Argentina.

“Há algum tempo, quando penso em justiça, preocupa-me – a palavra é dura, mas vou dizer de qualquer forma – uma certa insubstancialidade com a qual ela é tão frequentemente analisada.”

Francisco expressou surpresa com a constante geração de “normas de todo tipo para garantir os direitos humanos” e com a criação de órgãos especializados para zelar por esses direitos. “Tudo parece muito bom, tudo está muito bem envernizado, mas… o que acontece no nível da realidade, o que acontece no nível real com os direitos humanos, por exemplo?”, refletiu.

O Bispo de Roma considerou que “a abordagem superficial e pequena da justiça não tem entidade diante do drama da injustiça estrutural, e isto é o que muitas vezes acontece hoje em tantas sociedades do mundo”.

Enviou uma forte mensagem: “50% dos pobres tem certamente 50% dos direitos humanos descumpridos”, e acrescentou que “é hora de substituir os discursos por palavras, a natureza hipotecada e a humanidade ameaçada chamam-nos desesperadamente a agir, e nós devemos responder a este chamamento”.

Denunciou “a omissão, o conformismo e o desinteresse” como “formas de corrupção, tão nocivas quanto o próprio suborno”, acrescentou. Para Francisco, o juiz que não vive e sente o sofrimento dos outros, que não compreende a dimensão da demanda social por justiça, “dificilmente pode cumprir a sua missão como juiz”.

“Ser capaz de transformar para o bem é a grande oportunidade da existência humana”, afirmou, e convidou-os a serem corajosos, a não perderem a fé e a permanecerem no caminho:

Vejam em Jesus, em Cristo, o exemplo de alguém que sentiu, agiu e se comprometeu incondicionalmente a lutar pela redenção humana”.

JMJ: jovens, sejam originais!

O Papa Francisco enviou uma mensagem em vídeo, aos jovens em vista da próxima Jornada Mundial da Juventude que será realizada de 1 a 6 de agosto de 2023 em Lisboa.

“No meio de todas estas crises, vocês têm de preparar e ajudar para que o evento de agosto de 2023 seja um evento jovem, um evento fresco, um evento com vida, um evento com força, um evento criativo”, afirmou.

Vocês têm de criar o encontro. Se vocês não forem criativos, se vocês não forem poetas, este encontro não vai resultar, não vai ser original, vai ser uma fotocópia de outros encontros. E como dizia o jovem beato italiano: cada um de nós tem de ser original, não uma fotocópia. E o encontro tem de ser original, com o contributo de todos. Vocês têm de o criar. Animem-se e sigam em frente!”

“Rezo para que este encontro seja um encontro fecundo. Que cada um de nós saia melhor do que chegou. Peço-lhes, por favor, que rezem por mim, porque eu também preciso que me sustentem com a oração”, concluiu.

JMJ Lisboa 2023: «O encontro tem de ser original», afirma o Papa numa mensagem vídeo

Vídeo do Papa: dar uma resposta cristã aos desafios da bioética

Na intenção de oração para o mês de março, que o Santo Padre confia aos católicos por meio da Rede Mundial de Oração do Papa, Francisco convida a rezar “para que possamos dar uma resposta cristã aos desafios da bioética”.

Na mensagem de vídeo divulgada esta terça-feira, o Papa destaca que “evidentemente a ciência progrediu, e hoje a bioética apresenta-nos uma série de problemas aos quais temos que responder, não esconder a cabeça como avestruz”.

Francisco chama a atenção para dois riscos para os cristãos. O primeiro, é ver o progresso tecnológico como um inimigo e opor-se a ele de todas as formas. Tentar “detê-lo”. O segundo risco é sofrer passivamente, fingindo que nada está a acontecer, quando ao invés se põe em dúvida o “respeito pela dignidade humana”.

Segundo o Pontífice, “temos que entender as profundas mudanças que estão a ocorrer com um discernimento ainda mais profundo, ainda mais subtil”.

Não se trata de travar o progresso tecnológico. Não, é preciso acompanhá-lo. Trata-se de proteger quer a dignidade humana, quer o progresso. Ou seja, não podemos pagar o preço da dignidade humana com o progresso, não. Ambos caminham juntos e harmonicamente juntos.”

Os cristãos têm a tarefa de participar do debate público fazendo ouvir a sua voz. “Diante dos novos desafios apresentados pela bioética, rezemos para que os cristãos, por meio da sua oração e da sua ação social, promovam a defesa da vida”, conclui o Papa.

Mulheres: santas doutoras e padroeiras semeadoras de esperança

No Dia Internacional da Mulher, o Papa exortou a olhar para a humanidade das mulheres que pode regenerar o mundo.

“Olhando para Maria com o Filho nos braços, penso nas jovens mães e nos seus filhos que fogem das guerras e da fome ou que esperam nos campos de refugiados. São tantos! Que a Rainha da paz obtenha concórdia para os nossos corações e para o mundo inteiro”, recordou Francisco na sua conta @Pontifex, no Twitter.

Enviou ainda uma mensagem à Conferência Internacional sobre as Mulheres Doutoras da Igreja e Padroeiras da Europa em diálogo com o mundo de hoje, que se realizou em Roma na Pontifícia Universidade Urbaniana nos dias 7 e 8 de março.

“A eminente doutrina destas santas – afirmou o Papa – pela qual foram declaradas Doutoras da Igreja ou Padroeiras, ganha nova relevância nestes tempos por sua permanência, profundidade e atualidade e, nas circunstâncias atuais, oferece luz e esperança ao nosso mundo fragmentado e desarmónico”. E embora pertençam a épocas e lugares diferentes e tenham realizado missões diferentes, “todas elas têm em comum o testemunho de uma vida santa”.

“Dóceis ao Espírito, através da graça do Baptismo, seguiram o seu caminho de fé, movidas não por ideologias mutáveis, mas por uma adesão inabalável à ‘humanidade de Cristo’ que permeava as suas ações”. Então, o Papa observou “de onde tiravam a força para realizá-las, senão do amor de Deus que encheu os seus corações?” e afirmou ainda que este “é um caminho acessível a todos, ou seja, o da santidade comum”.

Encorajando e elogiando a vida e obra das santas Francisco acrescentou:

“O exemplo de vida destas santas coloca em evidência alguns dos elementos que compõem essa feminilidade tão necessária para a Igreja e o mundo: a coragem de enfrentar as dificuldades, a sua capacidade de concretizar, uma disposição natural de ser propositivas para o que é mais belo e humano, de acordo com o plano de Deus, e uma visão clarividente do mundo e da história – profética – que as tornou semeadoras de esperança e construtoras do futuro.”

JM (com recursos jornalísticos do portal Vatican News)

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11 de Março de 2022