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A Palavra do Papa: O convite para Lisboa, o apelo para ir ao encontro de quem falta e uma “peregrinação de paz”

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Esta semana, o Papa Francisco publicou a mensagem para a Jornada Mundial da Juventude e convidou os jovens para estarem, em agosto de 2023, “Todos juntos em Lisboa!”. O destaque da semana do Papa vai para a sua viagem ao Cazaquistão, onde participou no VII Congresso de Líderes de Religiões Mundiais e Tradicionais. Uma “peregrinação de paz” onde sublinhou que as religiões respondem à sede de paz no mundo, mas que a paz deve ser construída a cada momento. 

JMJ 2023: «Todos juntos em Lisboa!» é o convite do Papa

O Papa publicou a mensagem para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) que vai decorrer em Lisboa, de 1 a 6 de agosto de 2023, convidando os jovens para um “abraço da reconciliação e da paz” na capital portuguesa.

“Queridos jovens, que na JMJ possais experimentar novamente a alegria do encontro com Deus e com os irmãos e as irmãs. Depois dum prolongado período de distanciamento e separação, em Lisboa – com a ajuda de Deus – reencontraremos juntos a alegria do abraço fraterno entre os povos e entre as gerações, o abraço da reconciliação e da paz, o abraço duma nova fraternidade missionária”, escreve Francisco, num texto divulgado pelo Vaticano.

O texto parte do tema anunciado em 2019, ‘Maria levantou-se e partiu apressadamente’, uma passagem do Evangelho segundo São Lucas (Lc 1,39): “A Mãe do Senhor é modelo dos jovens em movimento, jovens que não ficam imóveis diante do espelho em contemplação da própria imagem, nem ‘alheados’ nas redes. Ela está completamente projetada para o exterior”, pode ler-se.

Francisco apresenta os jovens como esperança duma “nova unidade para a humanidade fragmentada e dividida”: “Queridos jovens, é tempo de voltar a partir apressadamente para encontros concretos, para um real acolhimento de quem é diferente de nós, como acontece entre a jovem Maria e a idosa Isabel. Só assim superaremos as distâncias entre gerações, entre classes sociais, entre etnias, entre grupos e categorias de todo o género, e superaremos também as guerras”.

O Vaticano explica que a XXXVII Jornada Mundial da Juventude será celebrada este ano, nas dioceses católicas, a 20 de novembro (solenidade litúrgica de Cristo-Rei) e, a nível internacional, em Lisboa de 1 a 6 de agosto de 2023 – após ter sido adiada, por um ano, devido à pandemia de Covid-19.

“Espero e creio fortemente que a experiência que muitos de vós ireis viver em Lisboa, no mês de agosto do próximo ano, representará um novo começo para vós jovens e, convosco, para toda a humanidade”, realça o Papa.

«Deus não exclui ninguém»

No passado Domingo, o Papa Francisco disse, antes da recitação do Angelus, que as comunidades católicas devem ir ao encontro de quem “falta”, mostrando a todos o “coração misericordioso de Deus”.

“Deus é precisamente assim, Deus não exclui ninguém, deseja todos no seu banquete, porque ama todos como filhos. Todos, sem excluir ninguém, todos”, referiu, desde a janela do apartamento pontifício.

Perante milhares de pessoas reunidas na Praça de São Pedro, Francisco falou das três “parábolas da misericórdia” no Evangelho de São Lucas (Lc 15, 4-32), que apresentou como resposta a quem se “escandalizava” por ver Jesus junto de pecadores.

“O Senhor não calcula as perdas e os riscos, tem um coração de pai e de mãe, e sofre com a falta dos filhos amados”, indicou.

A reflexão destacou que os protagonistas dessas parábolas – um pastor que procura a ovelha perdida, uma mulher que encontra a moeda perdida e o pai do filho pródigo – sentem uma “inquietação pela falta”.

“Nos seus corações, existe uma inquietação por aquilo que falta: a ovelha, a moeda, o filho que foi embora. Quem ama, preocupa com aqueles que faltam, sente saudades de quem está ausente, procura quem se perdeu, espera por quem se afastou. Porque quer que ninguém se perca”, precisou o Papa.

“Sofre, sofre. Deus sofre com a nossa distância e, quando nos perdemos, espera pelo nosso regresso. Lembremo-nos que Deus sempre espera-nos sempre de braços abertos, qualquer que seja a situação de vida em que nos percamos”.

Francisco questionou sobre a relação das comunidades católicas sobre “quem falta”, nelas, perguntando se essas pessoas “realmente” fazem falta e se existe “compaixão por quem está distante”.

“O Pai pede-nos que estejamos atentos aos filhos que mais lhe fazem falta. Pensemos em alguém que conhecemos, que está ao nosso lado e que, talvez, nunca tenham ouvido alguém dizer: ‘Sabes? Tu és importante para Deus’””, acrescentou.

“Peregrinação de paz” – a visita do Papa Francisco ao Cazaquistão

O Papa iniciou, no passado dia 13, a sua primeira visita ao Cazaquistão, que apresentou como “peregrinação de paz”, ao encontro de responsáveis religiosos de todo o mundo, participando no VII Congresso de Líderes de Religiões Mundiais e Tradicionais.

A guerra «louca e trágica» na Ucrânia e o apelo ao compromisso global pela paz

O Papa disse, no início da sua viagem ao Cazaquistão, que a guerra na Ucrânia é um ato de loucura, pedindo um compromisso global pela paz e pelo reforço do multilateralismo, para construir um mundo “mais estável e pacífico”.

“Chego aqui no curso da louca e trágica guerra originada pela invasão da Ucrânia, enquanto outros confrontos e ameaças de conflito colocam em risco os nossos tempos. Venho para amplificar o clamor de tantos que imploram a paz, caminho de desenvolvimento essencial para o nosso mundo globalizado”, referiu Francisco, no primeiro discurso da sua viagem a este país, onde participa no VII Congresso de Líderes de Religiões Mundiais e Tradicionais.

Falando perante membros do Governo e do corpo diplomático, autoridades religiosas e representantes da sociedade civil, o Papa considerou “cada vez mais premente” a necessidade de reforçar o empenho diplomático, em “favor do diálogo e do encontro”.

“O problema de um é hoje problema de todos; quem mais poder detém no mundo, tem maior responsabilidade para com os outros, especialmente dos países colocados em maior crise por lógicas de conflito”, acrescentou.

Francisco declarou que é preciso deixar de lado a lógica das “rivalidades” e o “reforço de blocos opostos”, para que os povos se “entendam e dialoguem”. “Para fazer isto, é preciso compreensão, paciência e diálogo com todos. Repito: com todos”, insistiu.

As religiões nunca podem justificar violência em nome de Deus

Na capital do Cazaquistão, o Papa Francisco afirmou que as religiões “nunca” podem justificar a violência em nome de Deus, apelando à rejeição de “extremismos e fundamentalismos”.

“Nunca justifiquemos a violência. Não permitamos que o sagrado seja instrumentalizado por aquilo que é profano. Que o sagrado não seja suporte do poder e o poder não se valha de suportes de sacralidade”, declarou, no discurso que proferiu na abertura do VII Congresso de Líderes de Religiões Mundiais e Tradicionais.

Francisco falava no Palácio da Independência, em Nur-Sultan, perante dezenas de representantes religiosos, a quem pediu a coragem de assumir a necessidade de uma “purificação do mal”.

Purifiquemo-nos da presunção de nos sentirmos justos e de não termos nada a aprender com os outros; libertemo-nos das conceções redutoras e ruinosas que ofendem o nome de Deus com rigidezes, extremismos e fundamentalismos, e o profanam por meio do ódio, do fanatismo e do terrorismo, desfigurando inclusive a imagem do homem”.

O Papa sustentou que todos os crentes são chamados a assumir o desafio global da paz, num mundo que vive “o flagelo da guerra”, num “clima de confrontos exasperados”.

«Precisamos de religião para responder à sede de paz do mundo»

O Papa voltou a reforçar, na capital do Cazaquistão, que as religiões são “parte da solução” para superar a violência, criticando tanto o fundamentalismo como os discursos de “suspeita e desprezo” contra as comunidades crentes.

“Na realidade, as religiões não são problema, mas parte da solução para uma convivência mais harmoniosa. Com efeito a busca da transcendência e o valor sagrado da fraternidade podem inspirar e iluminar as opções a tomar no contexto das crises geopolíticas, sociais, económicas, ecológicas”, indicou, no discurso que proferiu na abertura do VII Congresso de Líderes de Religiões Mundiais e Tradicionais.

“Precisamos de religião para responder à sede de paz do mundo e à sede de infinito que habita o coração de cada homem”, acrescentou. A intervenção alertou para o fundamentalismo que “corrói toda a crença” e criticou os discursos que “inculcaram suspeitas e desprezo a respeito da religião, como se esta fosse um fator desestabilizador da sociedade moderna”.

O congresso promovido pelo governo do Cazaquistão debate, durante dois dias, o papel das religiões no período pós-pandémico.

Francisco destacou que a Covid-19 colocou todos “no mesmo plano” e que essa experiência de fragilidade comum deve promover uma nova solidariedade, a começar pelo acesso às vacinas.

“Façamo-nos próximo a todos, mas especialmente aos demasiado esquecidos de hoje, aos marginalizados, às camadas mais vulneráveis e pobres da sociedade, àqueles que sofrem escondidos e em silêncio, longe dos holofotes”, pediu.

«A paz nunca é conquistada duma vez por todas»

O Papa alertou para a necessidade de construir a paz, a cada momento, na primeira celebração com a comunidade católica local, que representa 0,01% da população do país:  “A paz nunca é conquistada duma vez por todas; há de ser conquistada cada dia, como também a convivência entre etnias e tradições religiosas diversas, o desenvolvimento integral, a justiça social”, referiu, na homilia da Missa a que presidiu no recinto da Expo 2017, em Nur-Sultan, perante milhares de pessoas.

Francisco percorreu o local em papamóvel, à sua chegada; a Missa, em latim e russo, assinalou a festa litúrgica da Exaltação da Santa Cruz: “A partir da Cruz de Cristo, aprendemos o amor, não o ódio; aprendemos a compaixão, não a indiferença; aprendemos o perdão, não a vingança. Os braços abertos de Jesus são o abraço de ternura com que Deus nos quer acolher”, acrescentou.

A intervenção apontou à fraternidade, destacando que o caminho dos cristãos não é “o da imposição e constrição, da força e da exuberância”, mas o do “amor humilde, gratuito e universal”. “Irmãos e irmãs, esta é a estrada, a estrada da nossa salvação, do nosso renascimento e ressurreição: olhar para Jesus crucificado. Daquela altura, podemos ver duma maneira nova a nossa vida e a história dos nossos povos”.

Francisco concluiu a sua homilia rezando para que os cristãos sejam, cada vez mais, “testemunhas alegres de vida nova, de amor, de paz”.

No final, o Papa evocou as vítimas da guerra em todo o mundo, com referência à Ucrânia, pedindo o fim da “corrida aos armamentos”.

“Penso em tantos lugares martirizados pela guerra, sobretudo na querida Ucrânia. Não nos habituemos à guerra, não nos resignemos à sua inevitabilidade. Socorramos quem sofre e insistamos para que se tente verdadeiramente alcançar a paz”, disse, no final da Missa a que presidiu no recinto da Expo 2017, perante milhares de pessoas.

“Que terá ainda de acontecer? Quantos mortos teremos ainda de contar antes de as contraposições cederem o passo ao diálogo para bem das pessoas, dos povos e da humanidade? A única saída é a paz, e a única estrada para se chegar lá é o diálogo”, acrescentou, no momento final do segundo dia de visita ao Cazaquistão, que faz fronteira com a Rússia.

Papa Francisco encontrou-se com representante da Igreja Ortodoxa Russa

O Papa encontrou-se, no Cazaquistão, com o responsável pelo Departamento das Relações Externas do Patriarcado de Moscovo (Igreja Ortodoxa), metropolita António. A reunião privada decorreu após a abertura do VII Congresso de Líderes de Religiões Mundiais e Tradicionais, na qual os dois tomaram a palavra, tendo durado cerca de 15 minutos.

No final da reunião, o metropolita António de Volokolamsk disse esperar que o encontro possa vir a concretizar-se: “Teremos de ver quando, onde e, sobretudo, ter uma declaração, um apelo bem preparado para o fim do encontro, tal como aconteceu em Havana [2016], no primeiro encontro que tiveram”, observou, numa intervenção citada pela Rádio Renascença, acrescentando que “o segundo encontro estava a ser preparado para Jerusalém, depois foi adiado”.

O ‘número 2’ Patriarcado de Moscovo considera que “o encontro entre o Papa e o patriarca [Cirilo] é uma coisa muito importante, por isso, terá de ser bem preparado”. “Nós estávamos prontos para este encontro, mas foi cancelado pela Santa Sé. No entanto, no nosso encontro de [5 de] agosto, quando fui a Roma, e agora, o Papa confirmou ser necessário haver outro encontro. Teremos de ver quando e como, mas não discutimos os detalhes”, precisou.

Papa elogia minoria católica no Cazaquistão e pede Igreja sem moralismos

O Papa encontrou-se com representantes da comunidade católica no Cazaquistão, que representa 0,01% da população do país, elogiando o papel desta minoria e pedindo uma Igreja sem “moralismos”.

No último dia da sua viagem a Nur-Sultan, capital cazaque Francisco falou a membros do clero e de institutos religiosos, seminaristas e agentes pastorais, que convidou a construir “uma Igreja mais habitada pela alegria do Ressuscitado, que rejeite medos e lamentos, que não se deixe endurecer por dogmatismos e moralismos”.

O encontro, na Catedral de Nur-Sultan, evocou ainda as várias comunidades da Conferência Episcopal da Ásia Central, exemplo de “uma única família, na qual ninguém é estrangeiro”. “Repito: ninguém é estrangeiro na Igreja, somos um único Povo santo de Deus, rico de tantos povos”, insistiu o Papa.

A intervenção sublinhou a necessidade de dar mais espaço aos leigos, “para que as comunidades não se endureçam e clericalizem”.“Uma Igreja sinodal, a caminho do futuro do Espírito, é uma Igreja participativa e corresponsável. É uma Igreja capaz de sair ao encontro do mundo porque se forma na comunhão”, apontou.

O Papa desafiou os católicos a manter uma “memória viva”, sublinhando que “a fé não é uma bela exposição de coisas do passado, mas um evento sempre atual, o encontro com Cristo que acontece aqui e agora na vida”.

“Há uma graça escondida no facto de constituir uma pequena Igreja, um pequeno rebanho; em vez de exibir as nossas forças, os nossos números, as nossas estruturas e todas as outras formas de relevância humana, deixamo-nos guiar pelo Senhor e colocamo-nos, com humildade, ao lado das pessoas”.

A rejeição de extremismo e do terrorismo e a memória das pessoas «perseguidas e discriminadas» pela sua fé

O Papa reforçou, no Cazaquistão, a rejeição da violência e do fundamentalismo religioso, associando-se à declaração final do VII Congresso de Líderes das Religiões Mundiais e Tradicionais.

“O extremismo, o radicalismo, o terrorismo e qualquer outro incentivo ao ódio, à hostilidade, à violência e à guerra – seja qual for a motivação ou objetivo que se proponham – nada têm a ver com o autêntico espírito religioso e devem ser rejeitados nos termos mais decididos que for possível; condenados, sem ‘se’ nem ‘mas’”, disse Francisco, no Palácio da Independência de Nur-Sultan, após a leitura do documento, com 35 pontos.

“O terrorismo de matriz pseudorreligiosa, o extremismo, o radicalismo, o nacionalismo amantado de sacralidade ainda fomentam medos e preocupações a respeito da religião”, acrescentou.

No discurso final da sua viagem de três dias, o Papa lamentou os “ódios e divisões” que marcam a vida da humanidade, sublinhando que, no mundo globalizado, essa situação “é ainda mais perigosa e escandalosa”.

O Papa evocou, ainda, as pessoas que são vítimas de perseguição, por causa da sua fé, pedindo uma resposta global para assegurar a liberdade religiosa. “Quantas pessoas são perseguidas e discriminadas pela sua fé! Pedimos veementemente aos governos e às competentes organizações internacionais que assistam os grupos religiosos e as comunidades étnicas que sofreram violações dos seus direitos humanos e liberdades fundamentais, e violências da parte de extremistas e terroristas”, referiu, no Palácio da Independência de Nur-Sultan, após a leitura da declaração final do VII Congresso de Líderes das Religiões Mundiais e Tradicionais.

Francisco apelou a uma relação “saudável” entre política e religião, defendendo uma “distinção, não confusão nem separação”: “As grandes sabedorias e religiões são chamadas a testemunhar, a todos os seres humanos, a existência dum património espiritual e moral comum, que assenta sobre dois pilares: a transcendência e a fraternidade”, observou.

O discurso indicou que a transcendência “não deve ceder à tentação de se transformar em poder” e que “as mais altas aspirações humanas não podem ser excluídas da vida pública e relegadas para o âmbito meramente privado”. “É preciso, sobretudo, empenhar-se para que a liberdade religiosa seja, não um conceito abstrato, mas um direito concreto. Defendamos para todos o direito à religião, à esperança, à beleza… ao Céu”.

AS com Agência Ecclesia

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16 de Setembro de 2022